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Roubo: Desvendando a Complexidade para o Advogado

Artigo de Direito
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A Complexidade Dogmática e Prática do Crime de Roubo no Ordenamento Jurídico Brasileiro

O crime de roubo, tipificado no artigo 157 do Código Penal Brasileiro, representa um dos delitos mais recorrentes e debatidos nos tribunais superiores. Para o profissional do Direito, a análise deste tipo penal exige ir muito além da leitura superficial da lei, demandando uma compreensão profunda das teorias sobre a consumação, a valoração da prova e as nuances das majorantes. Trata-se de um crime complexo, pluriofensivo, que tutela simultaneamente dois bens jurídicos distintos: o patrimônio e a integridade física ou liberdade individual. Essa natureza híbrida gera constantes debates doutrinários e jurisprudenciais que impactam diretamente a estratégia de defesa e a atuação da acusação.

A correta identificação dos elementos constitutivos do tipo é o primeiro passo para uma advocacia criminal de excelência. A subtração de coisa móvel alheia, para si ou para outrem, mediante grave ameaça ou violência a pessoa, ou depois de havê-la, por qualquer meio, reduzido à impossibilidade de resistência, compõe a estrutura básica do delito. No entanto, cada um desses termos carrega uma carga interpretativa densa. A “grave ameaça”, ou vis compulsiva, não necessita ser expressa verbalmente, podendo ser extraída de gestos ou da própria dinâmica dos fatos, desde que capaz de incutir temor fundado na vítima.

Já a violência, ou vis corporalis, refere-se ao emprego de força física. É fundamental distinguir a violência própria, que atinge o corpo da vítima, da violência imprópria, que a reduz à incapacidade de defesa, como no caso do “boa noite cinderela”. A jurisprudência tem se debruçado sobre a intensidade dessa violência e sua aptidão para configurar o roubo, diferenciando-o do furto mediante arrebatamento, onde a violência é dirigida à coisa e não à pessoa.

Para o advogado que busca especialização, compreender essas distinções é vital. Cursos específicos, como o de Roubo e Seus Principais Aspectos, oferecem o aprofundamento necessário para manejar essas teses com segurança técnica nos tribunais.

Teorias da Consumação: A Adoção da Teoria da Amotio

Um dos pontos mais nevrálgicos na prática forense envolvendo o crime de roubo diz respeito ao momento consumativo. Durante décadas, debateram-se quatro teorias principais: a contrectatio (basta o toque na coisa), a illatio (exige o transporte da coisa ao local destinado), a ablatio (exige o deslocamento e a posse pacífica) e a amotio (ou apprehensio). O Direito Penal brasileiro, alinhando-se à jurisprudência consolidada do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e do Supremo Tribunal Federal (STF), adotou a teoria da amotio.

Segundo essa orientação, cristalizada na Súmula 582 do STJ, o crime de roubo se consuma com a inversão da posse do bem mediante violência ou grave ameaça, ainda que por breve tempo e em seguida à perseguição imediata ao agente e recuperação da coisa roubada, sendo prescindível a posse mansa e pacífica ou desvigiada. Essa definição tem implicações práticas gigantescas. Significa que, se o agente subtrai o bem e é detido metros à frente pela polícia, o crime é considerado consumado, e não tentado.

A defesa técnica, muitas vezes, busca a desclassificação para a forma tentada visando a redução da pena prevista no artigo 14, inciso II, do Código Penal. Contudo, o operador do Direito deve estar ciente da rigidez dos tribunais superiores quanto à aplicação da Súmula 582. A batalha jurídica, portanto, desloca-se para a análise fática da inversão da posse. Houve, de fato, a cessação da disponibilidade do bem pela vítima? O agente teve, ainda que por segundos, o poder de disposição sobre a coisa? Essas são as perguntas que devem nortear a análise dos autos.

O Valor Probatório da Palavra da Vítima e o Reconhecimento Pessoal

No âmbito processual, a condenação por roubo frequentemente se baseia na palavra da vítima. A jurisprudência pátria confere especial relevo ao depoimento do ofendido em crimes patrimoniais, geralmente cometidos na clandestinidade, longe de testemunhas oculares. Entretanto, esse “especial relevo” não pode ser confundido com prova absoluta ou inquestionável. O depoimento deve ser firme, coerente e harmônico com o restante do conjunto probatório.

Recentemente, houve uma guinada significativa no entendimento do STJ quanto ao reconhecimento pessoal realizado em sede policial e judicial. O artigo 226 do Código de Processo Penal (CPP) estabelece um rito formal para o reconhecimento de pessoas: descrição prévia, alinhamento com indivíduos semelhantes e lavratura de auto pormenorizado. Durante muito tempo, essas formalidades foram tratadas como meras recomendações.

O cenário mudou. Atualmente, a Sexta Turma do STJ tem anulado condenações baseadas exclusivamente em reconhecimentos que não observaram estritamente o artigo 226 do CPP, especialmente o reconhecimento fotográfico isolado ou o “show-up” (apresentação única do suspeito). Isso impõe ao Ministério Público o ônus de reforçar a prova da autoria com outros elementos indiciários e, à defesa, a oportunidade de questionar a validade de procedimentos policiais inquisitoriais que violem o contraditório e a ampla defesa.

As Majorantes e o Pacote Anticrime

A dosimetria da pena no crime de roubo é fortemente influenciada pelas causas de aumento de pena, previstas no § 2º e seguintes do artigo 157. A Lei 13.964/2019, conhecida como Pacote Anticrime, trouxe alterações substanciais que exigem atualização constante do profissional. A utilização de arma de fogo, por exemplo, tornou-se uma circunstância que exaspera a pena de forma mais severa. Se a arma for de uso restrito ou proibido, a pena aplica-se em dobro.

Outra majorante frequente é o concurso de pessoas. A simples presença de dois ou mais agentes, unidos pelo liame subjetivo para a prática do delito, é suficiente para elevar a pena de um terço até a metade. Não é necessário que todos os agentes pratiquem os atos executórios de subtração; basta que colaborem de qualquer modo para o crime, como o “piloto de fuga” ou o “olheiro”. A identificação da coautoria e da participação de menor importância (artigo 29, § 1º, do CP) é um campo fértil para a argumentação jurídica.

Há também a causa de aumento referente à restrição da liberdade da vítima. É crucial diferenciar essa majorante do crime autônomo de sequestro ou cárcere privado, ou ainda da extorsão mediante sequestro. No roubo majorado pela restrição de liberdade, a retenção da vítima ocorre pelo tempo estritamente necessário para a consumação da subtração patrimonial. Se a restrição ultrapassa esse limite temporal razoável, pode-se configurar outro tipo penal ou concurso de crimes. O domínio dessas distinções tipológicas é o que separa o advogado generalista do especialista em Direito Penal e Processo Penal.

A Importância da Perícia e a Materialidade Delitiva

A materialidade no crime de roubo geralmente é comprovada pelo auto de apreensão e avaliação da *res furtiva*, além do exame de corpo de delito nas hipóteses de violência real. A ausência de apreensão do bem ou da arma utilizada não impede, necessariamente, a condenação, nem o reconhecimento das majorantes, caso a prova testemunhal seja robusta o suficiente para suprir a falta do exame pericial direto.

No que tange ao emprego de arma de fogo, a Terceira Seção do STJ pacificou o entendimento de que a apreensão e a perícia da arma são prescindíveis para a incidência da causa de aumento, desde que o seu uso seja comprovado por outros meios de prova, como a palavra da vítima. Contudo, se a arma é apreendida e a perícia constata sua inaptidão absoluta para realizar disparos, ou se trata de arma de brinquedo (simulacro), a majorante deve ser afastada, subsistindo apenas a grave ameaça configuradora do tipo fundamental.

Essa nuance técnica sobre a potencialidade lesiva do instrumento utilizado demonstra como o Direito Penal é um sistema de garantias que não admite presunções absolutas contra o réu. A defesa deve estar atenta aos laudos periciais e requerer, quando pertinente, a comprovação da eficácia do artefato bélico.

Concurso de Crimes e Continuidade Delitiva

Em cenários onde múltiplos patrimônios são atingidos em um mesmo contexto fático, surge a discussão sobre o concurso formal de crimes versus crime único. Se o agente, mediante uma única ação, subtrai bens de vítimas diferentes (exemplo: assalto a um ônibus ou a um grupo de pessoas), configura-se o concurso formal de crimes (artigo 70 do CP), e não crime único. As penas são aumentadas, e não somadas, a menos que haja desígnios autônomos.

Por outro lado, se os roubos ocorrem em sequencia, com as mesmas condições de tempo, lugar e maneira de execução, pode-se pleitear o reconhecimento da continuidade delitiva (artigo 71 do CP), o que é, em regra, mais benéfico ao réu do que o concurso material (soma das penas). A correta identificação dessas figuras no momento da sentença ou em sede de execução penal pode alterar drasticamente o tempo de encarceramento e o regime de cumprimento de pena.

Princípio da Insignificância e o Roubo

Diferentemente do furto, onde o princípio da insignificância (ou bagatela) tem larga aplicação jurisprudencial, no crime de roubo sua incidência é rechaçada pelos tribunais superiores. O fundamento é que o roubo é um crime complexo que atinge não apenas o patrimônio, mas também a integridade física e a tranquilidade de espírito da vítima.

A presença de violência ou grave ameaça é considerada incompatível com o conceito de “mínima ofensividade da conduta” e “ausência de periculosidade social da ação”, requisitos vetores para a aplicação da bagatela. Assim, mesmo que o valor subtraído seja irrisório (ex: um isqueiro ou uma pequena quantia em dinheiro), se houve emprego de ameaça, o crime de roubo se perfaz, não havendo atipicidade material.

Esse posicionamento rígido reforça a necessidade de uma análise técnica apurada sobre a desclassificação para furto ou constrangimento ilegal, quando a prova da violência ou da grave ameaça for frágil. Transformar um roubo em furto abre as portas para benefícios como a suspensão condicional do processo, acordo de não persecução penal (em tese) ou o reconhecimento do furto privilegiado/insignificante.

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Insights sobre o Tema

A evolução jurisprudencial sobre o crime de roubo aponta para um rigor maior na validação das provas dependentes da memória (reconhecimento pessoal), ao mesmo tempo em que mantém firmeza na teoria da consumação (amotio). Isso cria um cenário onde a defesa técnica deve focar intensamente nas nulidades processuais e na quebra da cadeia de custódia da prova, enquanto a acusação deve se preocupar em robustecer o conjunto probatório para além da palavra da vítima. O domínio das majorantes e suas alterações legislativas recentes é o diferencial para o cálculo preciso da pena.

Perguntas e Respostas

1. A recuperação imediata do bem subtraído pela polícia desclassifica o roubo para a forma tentada?
Não. Conforme a Súmula 582 do STJ, o crime de roubo se consuma com a inversão da posse mediante violência ou grave ameaça, sendo prescindível a posse mansa e pacífica. A recuperação logo após a perseguição não afasta a consumação do delito.

2. O uso de arma de brinquedo (simulacro) serve para aumentar a pena do roubo?
Não. O uso de simulacro de arma de fogo serve para configurar a grave ameaça, elemento essencial do tipo penal de roubo (impedindo a desclassificação para furto), mas não serve para incidir a causa de aumento de pena (majorante) pelo emprego de arma, pois não há potencialidade lesiva real.

3. O reconhecimento do suspeito feito apenas por foto na delegacia é suficiente para a condenação?
Atualmente, o entendimento predominante no STJ é que o reconhecimento fotográfico isolado, sem a observância das formalidades do artigo 226 do CPP e sem corroboração por outras provas judiciais, não é suficiente para fundamentar uma condenação criminal, devendo ser anulado se for a única prova da autoria.

4. Qual a diferença entre roubo com restrição de liberdade e extorsão mediante sequestro?
No roubo com restrição de liberdade, a retenção da vítima é momentânea e serve apenas como meio para garantir a subtração dos bens presentes ali ou a fuga. Na extorsão mediante sequestro, a liberdade é tolhida como condição para obter uma vantagem econômica futura (preço do resgate), e a privação costuma ser mais duradoura.

5. É possível aplicar o princípio da insignificância no crime de roubo de pequeno valor?
A jurisprudência do STF e do STJ é pacífica no sentido de que não se aplica o princípio da insignificância (bagatela) aos crimes cometidos com violência ou grave ameaça à pessoa, independentemente do valor do bem subtraído, devido à alta reprovabilidade da conduta e à ofensa à integridade da vítima.

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Este artigo teve a curadoria da equipe da Legale Educacional e foi escrito utilizando inteligência artificial a partir do seu conteúdo original disponível em https://www.conjur.com.br/2025-dez-29/tj-sp-mantem-condenacao-de-homem-por-roubo-de-caminhao-de-carne/.

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