A Rescisão Indireta e a Estabilidade da Gestante: Estratégias e Limites do Jus Variandi
O contrato de trabalho é um negócio jurídico sinalagmático que pressupõe obrigações recíprocas. Tradicionalmente, o foco recai sobre a justa causa operada pelo empregador. No entanto, para o advogado trabalhista de alta performance, é fundamental dominar a figura da rescisão indireta, especialmente quando envolve trabalhadoras detentoras de estabilidade provisória, como as gestantes.
A rescisão indireta, prevista no artigo 483 da CLT, é a “justa causa patronal”. Ela ocorre quando o empregador comete atos faltosos que tornam insustentável a manutenção do vínculo. A complexidade aumenta quando analisamos o jus variandi — o poder de direção da empresa — em confronto com a proteção constitucional à maternidade. Alterações contratuais unilaterais, como mudanças abruptas de jornada, podem não ser apenas “gestão”, mas sim atos ilícitos graves.
Entender a profundidade desse instituto exige ir além da letra fria da lei. É necessário manusear com técnica a Súmula 244 do TST, os riscos processuais da reintegração e a produção probatória qualificada. O objetivo deste artigo é entregar uma visão estratégica sobre a rescisão indireta decorrente de alterações lesivas ao contrato da gestante.
O Artigo 483 da CLT: Para além da Alínea “D”
A base legal clássica para o pedido de rescisão indireta é a alínea “d” do artigo 483 da CLT (não cumprimento das obrigações do contrato). Qualquer alteração que prejudique a trabalhadora viola o artigo 468 da CLT e atrai a incidência desta alínea.
Contudo, o advogado atento deve explorar outras possibilidades legais para fortalecer a tese:
- Alínea “a” (Serviços superiores às forças): Uma mudança de turno (ex: diurno para noturno) ou a extensão de jornada pode ser considerada fisicamente excessiva para uma gestante, saindo do campo contratual e entrando na esfera fisiológica e de saúde.
- Alínea “e” (Ato lesivo da honra e boa fama): Em casos onde a mudança de horário visa forçar um pedido de demissão (o fenômeno do straining ou assédio moral estratégico), pode-se arguir esta alínea, combinada com a tese de discriminação (Lei 9.029/95).
Para o profissional que busca especialização em Advocacia Trabalhista nos Contratos de Trabalho, é vital saber combinar esses dispositivos na petição inicial.
Estratégia Processual: A Tutela de Urgência e o Art. 300 do CPC
Muitos advogados cometem o erro de apenas ajuizar a ação e aguardar a sentença, deixando a gestante em um limbo jurídico e financeiro. A postura combativa exige o manejo da Tutela de Urgência (Art. 300 do CPC).
Ao invés de pedir apenas a rescisão final, o advogado pode pleitear liminarmente:
- O restabelecimento imediato das condições anteriores de trabalho (horário original), sob pena de astreintes (multa diária); ou
- A suspensão da prestação de serviços sem prejuízo do salário, até o julgamento do mérito, dada a condição de risco à saúde da gestante e do nascituro.
Essa estratégia inverte a pressão processual, forçando a empresa a negociar ou corrigir a conduta rapidamente, mitigando o risco de improcedência ao final.
A Armadilha da Reintegração e a Súmula 244 do TST
Um ponto crítico frequentemente ignorado é o risco da oferta de reintegração. A estabilidade provisória visa garantir o emprego, e não apenas a indenização.
Se a empresa, em audiência, oferecer o retorno ao trabalho nas mesmas condições anteriores (corrigindo o erro), e a gestante recusar sem justificativa médica ou psicológica robusta (apenas por animosidade), ela pode perder o direito à indenização do período estabilitário, conforme interpretação da Súmula 244 do TST.
O advogado deve instruir sua cliente de que a rescisão indireta busca a indenização substitutiva quando a continuidade é impossível, não apenas inconveniente. Se a empresa sanar o vício, a recusa deve ser muito bem fundamentada (ex: assédio moral, clima hostil insuportável comprovado).
Provas: Construindo a Impossibilidade Fática
Para ter sucesso, não basta alegar que a mudança de horário é “ruim”. É necessário provar o nexo causal entre a alteração e o prejuízo grave. O prejuízo deve ser qualificado e documental. Sugere-se a produção das seguintes provas:
- Declarações Médicas Específicas: Laudos atestando que o acompanhamento pré-natal ou tratamentos específicos (fisioterapia, controle de glicemia) só podem ocorrer no horário original e são vitais para a saúde do feto.
- Inexistência de Transporte: Se a mudança for para turnos de madrugada ou encerramento tarde da noite, comprovar a falta de transporte público regular ou a insegurança do trajeto (mitigação da Súmula 90).
- O “Rastro de Resistência”: Para evitar a tese de perdão tácito, a gestante não deve aceitar a mudança passivamente. É crucial documentar a inconformidade através de e-mails ao RH, mensagens ou denúncias ao Ministério Público do Trabalho logo após a alteração.
Verbas Devidas e Danos Morais
Reconhecida a rescisão indireta, a condenação engloba: saldo de salário, aviso prévio, férias + 1/3, 13º salário, saque do FGTS com multa de 40% e a indenização substitutiva do período de estabilidade (salários e reflexos até 5 meses após o parto).
Além das verbas rescisórias, a alteração lesiva de jornada imposta à gestante pode configurar Dano Moral. A imposição de rotina extenuante ou incompatível com a gravidez viola a dignidade da pessoa humana e a função social da empresa. A caracterização da conduta como discriminatória pode elevar o quantum indenizatório.
Conclusão
O reconhecimento da rescisão indireta para gestantes exige mais do que a simples narrativa dos fatos; exige estratégia processual e probatória. O poder diretivo do empregador encontra barreira intransponível na saúde da trabalhadora. Contudo, o advogado deve estar atento às armadilhas processuais, como a oferta de reintegração e a necessidade de comprovar a impossibilidade fática da manutenção do vínculo.
A atuação diligente nesses casos não apenas assegura os direitos patrimoniais da cliente, mas cumpre uma função social de combater práticas abusivas.
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Insights sobre o Tema
A chave para vencer ações de rescisão indireta envolvendo gestantes não está apenas na lei, mas na prova do fato impeditivo. O juiz precisa ser convencido de que a alteração do contrato colocou em risco a gestação ou a subsistência da família. A utilização de Tutelas de Urgência demonstra a boa-fé da reclamante em resolver a questão (priorizando a saúde) e retira a discussão da mera “monetização” da estabilidade. Além disso, criar prova documental da resistência à alteração logo no início é vital para afastar a alegação de perdão tácito.
Perguntas e Respostas
1. A gestante que pede rescisão indireta perde o direito à estabilidade?
Não. Se a rescisão indireta for reconhecida, a culpa é do empregador. A gestante terá direito à indenização substitutiva de todo o período (da gravidez até 5 meses após o parto). Porém, atenção: se a empresa oferecer o emprego de volta (reintegração) e a gestante recusar sem motivo grave, ela pode perder essa indenização.
2. Qualquer mudança de horário gera rescisão indireta?
Não. A alteração deve ser lesiva (Art. 468 CLT) e grave o suficiente para tornar a relação insustentável. Pequenos ajustes de minutos geralmente não ensejam a ruptura. É preciso provar prejuízo real à rotina, saúde ou acompanhamento médico.
3. A gestante deve sair do emprego imediatamente ao entrar com a ação?
O artigo 483, § 3º, da CLT permite que ela escolha sair ou ficar. Estrategicamente, se a condição de trabalho coloca em risco a saúde (ex: jornada extenuante), recomenda-se o afastamento imediato, idealmente amparado por um pedido de Tutela de Urgência ou atestado médico, para não caracterizar abandono de emprego caso a ação seja improcedente.
4. O que acontece se a Justiça NÃO reconhecer a rescisão indireta?
Este é o maior risco. Se a ação for julgada improcedente, o juiz pode considerar que o contrato está vigente (determinando o retorno) ou, se a empregada já se afastou, declarar o encerramento como pedido de demissão. Nesse cenário, ela perde o aviso prévio, a multa de 40% do FGTS, o saque do fundo e a indenização da estabilidade.
5. A empresa pode mudar o horário alegando previsão em norma coletiva?
Normas coletivas têm força, mas não podem se sobrepor a direitos indisponíveis relacionados à saúde e segurança do trabalho, especialmente de gestantes. Se a mudança, mesmo prevista em acordo, prejudicar a saúde da gestante, a proteção constitucional à maternidade deve prevalecer.
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Acesse a lei relacionada em Consolidação das Leis do Trabalho – CLT
Este artigo teve a curadoria da equipe da Legale Educacional e foi escrito utilizando inteligência artificial a partir do seu conteúdo original disponível em https://www.conjur.com.br/2025-dez-07/trt-23-reconhece-rescisao-indireta-de-gestante-apos-alteracao-na-jornada-de-trabalho/.