Plantão Legale

Carregando avisos...

Fraude Securitária e Direito Penal: da Tipicidade à Prova

Artigo de Direito
Getting your Trinity Audio player ready...

A relevância do Direito Penal no âmbito das fraudes securitárias transcende a mera violação contratual e adentra a esfera da ordem pública e da proteção patrimonial. A fraude contra seguradoras é um fenômeno complexo que exige do jurista um olhar apurado sobre a tipicidade, a ilicitude e a culpabilidade. Não se trata apenas de uma disputa sobre a cobertura de uma apólice, mas da verificação de condutas dolosas destinadas a obter vantagem ilícita em prejuízo alheio.

Para a advocacia criminal especializada, a linha tênue entre o mero inadimplemento contratual (ou perda de direitos por agravamento de risco) e o ilícito penal é o verdadeiro campo de batalha. Compreender a dogmática por trás do tipo penal específico é essencial para a correta subsunção do fato à norma e para evitar que disputas cíveis se transformem indevidamente em persecução penal.

O Tipo Penal e a Exigência do Dolo Específico

A conduta de fraudar seguros encontra seu enquadramento principal no crime de estelionato, previsto no artigo 171 do Código Penal. Contudo, o legislador previu uma figura equiparada no parágrafo 2º, inciso V, que pune quem destrói, total ou parcialmente, ou oculta coisa própria, ou lesa o próprio corpo ou a saúde, ou agrava as consequências da lesão ou doença, com o intuito de haver indenização ou valor de seguro.

A análise deste dispositivo revela um detalhe técnico crucial: o tipo subjetivo exige o dolo específico (ou elemento subjetivo especial do tipo). A expressão “com o intuito de” afasta, tecnicamente, a compatibilidade com o dolo eventual. Não basta assumir o risco da destruição do bem (como dirigir embriagado e colidir); é necessário que a destruição tenha sido o objetivo direto da conduta para alcançar a vantagem financeira.

Para o profissional que busca teses defensivas robustas, o domínio sobre esses elementos constitutivos é o que diferencia o técnico do generalista. O estudo aprofundado, como o encontrado no curso de estelionato, é ferramenta indispensável para identificar quando a acusação falha em provar essa finalidade especial de agir.

A Batalha da Consumação: Crime Formal ou Material?

Uma discussão doutrinária com imensos reflexos práticos reside no momento consumativo. Parte da doutrina e jurisprudência classifica a fraude do inciso V como crime formal, consumando-se com a prática da conduta (destruir/ocultar) independentemente do recebimento do valor.

No entanto, a defesa técnica deve atuar com cautela e estratégia. Aceitar a tese de crime formal elimina a possibilidade de alegar o arrependimento eficaz (art. 15 do CP) — quando o agente, após forjar o sinistro, desiste de dar entrada no pedido de indenização ou impede o pagamento. Além disso, em uma visão garantista alinhada aos tribunais superiores sobre crimes patrimoniais, deve-se perseguir a tese de crime material (exigência do prejuízo alheio e vantagem ilícita). Se a seguradora descobre a fraude antes do pagamento, a defesa deve brigar pela configuração da tentativa, reduzindo significativamente a pena.

Princípio da Alteridade e Autolesão

A lesão ao próprio corpo ou o agravamento de doença traz à tona a autolesão, que, em regra, é impunível no Direito Penal brasileiro (princípio da alteridade). Contudo, a conduta ganha relevância penal ao atingir o patrimônio de terceiros. A prova pericial médica torna-se, portanto, elemento central na instrução processual para determinar se a lesão foi autoprovocada ou se houve agravamento intencional, superando a presunção de boa-fé.

Súmula 17 do STJ e o Concurso de Crimes

A prática da fraude frequentemente envolve a falsificação de documentos (notas fiscais frias, boletins de ocorrência falsos). O Ministério Público costuma denunciar em concurso material, somando as penas. Cabe à defesa invocar a Súmula 17 do STJ: “Quando o falso se exaure no estelionato, sem mais potencialidade lesiva, é por este absorvido”.

Se a falsificação (crime-meio) serviu única e exclusivamente para ludibriar a seguradora (crime-fim), aplica-se o princípio da consunção. O advogado deve demonstrar que o documento falso não possui vida própria ou capacidade de lesar a fé pública em outros contextos, evitando assim uma condenação desproporcional.

Uma visão sistêmica, aprimorada em uma pos-graduação em direito penal e processo penal 2025, permite ao profissional manejar essas teses de absorção com segurança.

Reflexos do Pacote Anticrime e Retroatividade

A Lei 13.964/2019 (Pacote Anticrime) alterou a natureza da ação penal do estelionato para pública condicionada à representação. Isso gerou uma “janela de oportunidade” processual. O STF, no julgamento do HC 187.341, fixou entendimento sobre a retroatividade da norma: a exigência de representação retroage em benefício do réu nos processos em que ainda não houve o oferecimento da denúncia.

Na prática, em inquéritos antigos de fraude securitária ainda em andamento, a defesa deve provocar a inércia da vítima. Se a seguradora não representar formalmente dentro do prazo decadencial de seis meses (contados da intimação para tal fim), opera-se a extinção da punibilidade. Essa é uma das ferramentas mais poderosas para o trancamento de investigações em curso.

Dolo de Fraudar vs. Exclusão de Risco Contratual

O ponto nevrálgico da defesa muitas vezes não é negar o fato, mas desqualificá-lo penalmente. Existe uma diferença abissal entre o segurado que destrói o carro propositalmente para receber o seguro (fraude penal, art. 171, § 2º, V) e o segurado que, após um acidente real causado por embriaguez, mente sobre quem estava dirigindo para não perder a cobertura.

No segundo caso, embora haja má-fé e a perda da indenização seja legítima no âmbito cível (agravamento de risco/cláusula de exclusão), a defesa pode sustentar a atipicidade da conduta penal em relação à figura específica do inciso V, pois não houve a destruição do bem *com o fim de* fraudar, mas sim uma mentira posterior para evitar um prejuízo contratual. Saber explorar essa “zona cinzenta” é vital.

Penas e Consequências Jurídicas

A pena prevista é de reclusão de um a cinco anos, e multa. A reincidência específica ou a atuação mediante organização criminosa agravam o cenário, impedindo benefícios como o Acordo de Não Persecução Penal (ANPP). Além da sanção penal, a condenação gera título executivo judicial para a reparação do dano cível.

Perguntas e Respostas

1. Qual a diferença prática entre alegar crime formal ou material na fraude de seguro?

Se considerado crime formal, o delito se consuma na destruição do bem, impedindo o arrependimento eficaz se o agente desistir antes de receber. Se defendido como crime material (tese defensiva), a não obtenção da vantagem financeira permite alegar a modalidade tentada (redução de pena) ou, se houver desistência voluntária antes do recebimento, o arrependimento eficaz (isenção de pena pelo estelionato).

2. Mentir sobre as circunstâncias de um acidente real é crime de fraude securitária?

É uma tese defensiva forte alegar que não. O art. 171, § 2º, V pune quem “destrói” ou “oculta” o bem *para* receber o seguro. Se o acidente foi real e involuntário, mas o segurado mente sobre um detalhe (ex: condutor) para evitar uma exclusão contratual, pode-se defender que é um ilícito civil, mas atípico para esta modalidade penal específica, por falta do dolo de destruir o bem com fins fraudulentos.

3. Como a Súmula 17 do STJ ajuda na defesa?

Ela impede que o réu seja punido duas vezes: pela falsificação do documento e pela fraude. Se o documento falso (ex: nota fiscal) foi usado apenas para aquele golpe no seguro, o crime de falso é absorvido, e o réu responde apenas pelo estelionato.

4. O que mudou com o Pacote Anticrime para esses processos?

A exigência de representação da vítima. Se não houver manifestação expressa da seguradora querendo processar o autor, o Ministério Público não pode agir. Em casos antigos sem denúncia oferecida, a defesa pode buscar a extinção do processo pela decadência desse direito de representação.

5. A autolesão é sempre impunível?

No Direito Penal, sim, pelo princípio da alteridade. A exceção é justamente a fraude securitária. Se a autolesão é o meio para lesar o patrimônio da seguradora, o ato torna-se típico e punível.

Quer dominar a defesa em crimes patrimoniais e se destacar na advocacia criminal especializada? Conheça nosso curso Estelionato e transforme sua carreira com conhecimento prático e aprofundado.

Insights Relevantes

A fraude contra seguros situa-se na interseção crítica entre o Direito Civil e o Penal. O advogado não pode se contentar com a letra fria da lei; deve buscar na jurisprudência as nuances sobre o momento consumativo e a exigência do dolo específico. A correta aplicação da Súmula 17 do STJ e a vigilância quanto aos prazos decadenciais de representação (pós-Pacote Anticrime) são diferenciais técnicos que definem o sucesso da defesa. Distinguir a fraude fabricada da mentira sobre excludentes contratuais é a chave para a desclassificação ou absolvição.

Aprofunde seu conhecimento sobre o assunto na Wikipedia.

Acesse a lei relacionada em Código Penal – Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940

Este artigo teve a curadoria da equipe da Legale Educacional e foi escrito utilizando inteligência artificial a partir do seu conteúdo original disponível em https://www.conjur.com.br/2025-dez-13/aspectos-penais-nas-fraudes-contra-as-seguradoras/.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *