O Impacto do Split Payment na Apropriação de Créditos em Operações Parceladas
A Nova Dinâmica da Não-Cumulatividade na Reforma Tributária
A aprovação da Emenda Constitucional nº 132/2023 inaugurou um novo capítulo no Sistema Tributário Nacional, alterando profundamente a lógica de apuração e recolhimento de tributos sobre o consumo. No centro dessa transformação, encontram-se o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS). Estes novos tributos operam sob uma lógica de não-cumulatividade plena, um conceito que, embora não seja inédito, ganha contornos operacionais disruptivos com a introdução do mecanismo de split payment.
Para o profissional do Direito, compreender a mecânica do split payment não é apenas uma questão de atualização legislativa, mas uma necessidade imperativa para a estruturação de planejamentos tributários e contratuais eficientes. A premissa básica é a liquidação financeira do tributo no momento da liquidação financeira da transação comercial. Isso significa que o recolhimento do imposto deixa de ser meramente declaratório e passa a ser, em grande medida, automático e vinculado ao fluxo de pagamento.
O desafio jurídico se intensifica quando analisamos as operações de pagamento parcelado. No modelo tradicional do ICMS e do PIS/COFINS, o fato gerador (geralmente a saída da mercadoria ou a prestação do serviço) permitia a apropriação do crédito pelo adquirente independentemente da forma ou prazo de pagamento, salvo exceções específicas. Com o split payment, a relação entre o fluxo financeiro e o direito ao crédito tributário torna-se umbilical, exigindo uma reavaliação das teses sobre o momento da apropriação do crédito.
O Conceito de Split Payment e sua Natureza Jurídica
O split payment, ou pagamento scindido, é um método de arrecadação onde o pagamento realizado pelo comprador é dividido eletronicamente pela instituição financeira ou de pagamento. Uma parcela é destinada ao fornecedor (valor líquido) e a outra é remetida diretamente aos cofres públicos (valor do tributo). A base legal para tal mecanismo visa combater a sonegação e a inadimplência, fechando o cerco contra as chamadas “notas frias” e as operações carrossel que lesam o erário há décadas.
Sob a ótica jurídica, o split payment altera a responsabilidade tributária. Ele impõe às instituições financeiras e aos intermediadores de pagamento um papel de terceiros colaboradores na arrecadação, embora a sujeição passiva permaneça, em regra, com o contribuinte que realiza a operação mercantil. Essa mudança desloca o foco da fiscalização ex post (após a declaração) para uma conformidade ex ante (no momento da transação), alterando o compliance tributário das empresas.
Para advogados que atuam na área consultiva, é crucial entender que este mecanismo não é apenas uma ferramenta de arrecadação, mas uma condição para a operabilidade do sistema de créditos. O direito ao crédito do IBS e da CBS, segundo as diretrizes da reforma e seus projetos de lei complementar (como o PLP 68/2024), está condicionado ao efetivo recolhimento do tributo incidente na etapa anterior.
A Problemática das Operações Parceladas
A grande controvérsia, e ponto focal deste artigo, reside na aplicação do split payment em vendas a prazo ou parceladas. Se o pagamento é fracionado em dez, doze ou vinte vezes, como fica o recolhimento do tributo? E, consequentemente, como fica o direito de crédito do adquirente? Pela lógica estrita do caixa, o tributo seria retido proporcionalmente em cada parcela paga.
Isso cria um descompasso temporal significativo. O adquirente, que necessita do insumo ou da mercadoria imediatamente, registra a entrada do bem em sua contabilidade. No entanto, se o crédito estiver condicionado ao efetivo recolhimento do tributo pelo fornecedor (via split payment em cada parcela), o adquirente só teria acesso a esse crédito de forma fracionada, ao longo do tempo.
Essa situação gera um impacto direto no capital de giro das empresas. O princípio da não-cumulatividade plena busca desonerar a cadeia produtiva, garantindo que o imposto não incida sobre o imposto. Se o adquirente tiver que esperar meses para se creditar integralmente de um imposto destacado na nota fiscal, mas cujo recolhimento foi diferido pelo parcelamento financeiro, cria-se um custo financeiro oculto na operação.
Neste cenário complexo, o domínio das novas regras é essencial. Para entender a fundo como essas mudanças impactam a prática advocatícia, é recomendável buscar especialização. A Pós-Graduação em O Novo Direito Tributário com a Reforma Tributária da Legale Educacional oferece a base teórica e prática necessária para navegar por essas incertezas legislativas.
Antecipação do Crédito e Garantia de Pagamento
Diante do problema do fluxo de caixa nas operações parceladas, o debate jurídico se volta para as soluções regulatórias. A legislação complementar prevê mecanismos onde, nas operações cursadas por meio de arranjos de pagamento eletrônico (cartão de crédito, débito, PIX, boleto bancário com registro), a instituição financeira atua como garantidora ou operadora do recolhimento.
Há uma distinção fundamental a ser feita entre o “split inteligente” e o “split manual”. No caso de pagamentos eletrônicos monitorados, o sistema pode identificar o montante total do tributo devido. A questão é se a legislação permitirá que o crédito seja apropriado integralmente no momento da emissão da nota fiscal, sob a premissa de que o recolhimento está garantido pelo sistema financeiro, ou se manterá a apropriação pro rata tempore.
Juridicamente, defende-se a tese de que, se há uma garantia de fluxo financeiro via cartão de crédito ou instrumento similar, o Fisco não corre risco de inadimplência (exceto se o próprio comprador não pagar a fatura, o que deslocaria o risco para a operadora, e não para o Fisco, dependendo do arranjo). Portanto, a apropriação imediata do crédito pelo adquirente estaria alinhada ao princípio constitucional da não-cumulatividade, evitando que o Estado se financie às custas do contribuinte.
Responsabilidade Solidária e Dever de Diligência
Outro aspecto crucial nas operações parceladas com split payment é a responsabilidade. Se, por falha no sistema de pagamento ou insuficiência de fundos em uma das parcelas, o tributo não for recolhido, quem responde? O adquirente perde o direito ao crédito daquela parcela? O vendedor é autuado? Ou a instituição financeira assume a responsabilidade?
O novo regramento tende a impor um dever de diligência muito maior aos adquirentes. A verificação da regularidade do recolhimento do imposto na etapa anterior deixa de ser uma “boa prática” para se tornar um requisito de validade do aproveitamento de créditos. Em operações de longo prazo, como fornecimentos contínuos ou parcelamentos extensos, o monitoramento deve ser constante.
Isso abre um vasto campo de atuação para advogados tributaristas na elaboração de cláusulas contratuais de indemnification e garantias cruzadas entre fornecedores e compradores. O contrato particular de compra e venda precisará prever mecanismos de proteção caso o split payment falhe ou caso o crédito seja glosado pelo Fisco devido a inadimplência financeira das parcelas tributárias.
O Papel dos Meios de Pagamento Eletrônicos
A operacionalização do split payment depende intrinsecamente da tecnologia bancária. Nas vendas com cartão de crédito, o adquirente paga à operadora, que repassa ao vendedor. O split ocorre nesse repasse. Nas vendas via boleto, o banco emissor deve realizar a segregação. A complexidade aumenta em operações B2B que envolvem crediário próprio ou pagamentos fora do sistema bancário tradicional.
Para operações que não transitam pelo sistema financeiro automatizado (o que deve ser cada vez mais raro dado o incentivo ao split payment), o recolhimento manual exigirá uma disciplina férrea. O advogado deve orientar seus clientes de que a opção por meios de pagamento não rastreáveis ou manuais pode resultar em um diferimento ainda maior na apropriação de créditos, ou até mesmo na sua vedação temporária até a comprovação do pagamento.
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Conclusão: Adaptação e Estratégia Jurídica
O split payment nas operações parceladas representa uma mudança de paradigma que vai além da simples arrecadação: ele reconfigura as relações comerciais e financeiras entre empresas. O advogado tributarista deixa de ser apenas um consultor de leis para se tornar um estrategista de fluxo de caixa e conformidade.
A apropriação de créditos pelo adquirente, antes uma consequência quase automática da escrituração fiscal, agora é um evento financeiro condicionado. Nas vendas parceladas, a tensão entre a necessidade de liquidez imediata dos créditos e a segurança arrecadatória do Estado exigirá uma interpretação refinada dos princípios constitucionais e das leis complementares.
O sucesso na advocacia tributária moderna dependerá da capacidade de interpretar essas regras não como obstáculos, mas como variáveis em uma equação complexa de eficiência fiscal. Aquele que dominar as regras do split payment e suas exceções garantirá aos seus clientes uma vantagem competitiva inestimável: a segurança jurídica aliada à eficiência financeira.
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Principais Insights sobre o Tema
A análise do split payment em operações parceladas revela pontos críticos para a advocacia tributária:
Condicionalidade do Crédito: O direito de crédito do adquirente (IBS/CBS) deixa de ser absoluto na emissão da nota e passa a depender, operacionalmente, da liquidação financeira do tributo, criando um vínculo direto entre pagamento e crédito.
Impacto no Capital de Giro: O parcelamento do pagamento da mercadoria implica o parcelamento do recolhimento do tributo, o que pode levar ao parcelamento da apropriação do crédito, gerando descasamento de fluxo de caixa para o adquirente.
Responsabilidade e Compliance: A responsabilidade pelo recolhimento é compartilhada com instituições financeiras, mas o risco da glosa de créditos permanece com o adquirente, exigindo maior diligência na escolha de fornecedores e meios de pagamento.
Revisão Contratual: Contratos de fornecimento de longo prazo e parcelados precisarão de novas cláusulas de garantia para proteger o direito ao crédito do comprador diante de eventuais falhas no split payment.
Perguntas e Respostas Frequentes
1. O adquirente pode aproveitar o crédito integralmente no momento da compra parcelada?
A regra geral do novo sistema tende a vincular o crédito ao efetivo pagamento do tributo. No entanto, a regulamentação (Lei Complementar) pode prever hipóteses de apropriação integral imediata caso o meio de pagamento utilizado (como cartão de crédito) garanta o repasse do imposto ao Fisco, independentemente do fluxo de parcelas entre comprador e vendedor. A legislação ainda está em fase de consolidação sobre os detalhes operacionais desse adiantamento.
2. Como o split payment afeta a inadimplência tributária?
O split payment reduz drasticamente a inadimplência declarada, pois o valor do imposto é retido na fonte do pagamento antes de chegar ao caixa do vendedor. Isso impede que o vendedor utilize o valor do imposto para financiar seu capital de giro e posteriormente deixe de recolhê-lo, prática comum no sistema anterior.
3. O que acontece se o adquirente pagar uma parcela em atraso?
Se o pagamento da parcela comercial ocorrer em atraso, a retenção do tributo via split payment também ocorrerá nesse momento posterior. Consequentemente, a liberação do crédito correspondente a essa parcela para o adquirente (ou a confirmação do crédito) também será postergada para o momento da efetiva liquidação financeira.
4. O split payment se aplica a todas as formas de pagamento?
A intenção do legislador é abranger a maior parte das transações eletrônicas (cartões, PIX, boletos, transferências). Pagamentos em espécie ou meios não rastreáveis sofrerão restrições ou exigirão recolhimentos manuais prévios para que gerem crédito, incentivando a bancarização total das operações B2B.
5. Qual a responsabilidade dos bancos e instituições de pagamento?
As instituições financeiras assumem o papel de responsáveis pela retenção e recolhimento do tributo no momento da liquidação financeira. Elas devem adaptar seus sistemas para segregar os valores automaticamente. Embora não sejam os contribuintes de fato, respondem solidariamente caso falhem na obrigação de realizar o split quando os parâmetros da transação estiverem corretamente informados.
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Acesse a lei relacionada em Emenda Constitucional nº 132/2023
Este artigo teve a curadoria da equipe da Legale Educacional e foi escrito utilizando inteligência artificial a partir do seu conteúdo original disponível em https://www.conjur.com.br/2025-dez-17/split-payment-e-operacoes-com-pagamento-parcelado-uma-analise-sobre-a-apropriacao-de-creditos-pelo-adquirente/.