A Natureza da Justa Causa e a Quebra da Fidúcia Contratual
A relação de emprego é, em sua essência, um contrato sinalagmático sustentado pela confiança mútua (fidúcia) entre empregado e empregador. Quando esse elemento subjetivo é rompido de forma grave e irreparável, o ordenamento jurídico brasileiro prevê a possibilidade da extinção do vínculo por justa causa. Trata-se da “pena capital” do contrato de trabalho, cujas consequências transcendem a simples perda do posto de serviço, afetando drasticamente as verbas rescisórias. Dada a severidade da medida, a aplicação desta penalidade exige a comprovação robusta da autoria e da materialidade da falta grave, sob pena de reversão judicial e passivo trabalhista.
O artigo 482 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) elenca, de forma taxativa, as hipóteses que autorizam a rescisão por justo motivo. Contudo, a doutrina e a jurisprudência são uníssonas: a justa causa não pode ser banalizada. A análise exige do operador do Direito um olhar atento sobre a proporcionalidade, a razoabilidade e, sobretudo, a adequação típica da conduta.
Para aprofundar o entendimento sobre as dinâmicas contratuais e blindar as teses jurídicas, o estudo continuado é indispensável. Uma formação sólida, como a encontrada na Pós-Graduação em Direito do Trabalho e Processo, permite ao advogado identificar com precisão os elementos que caracterizam a falta grave e orientar seus clientes com maior assertividade técnica.
Mau Procedimento: A Cláusula Geral e a Importância da Tipificação
Dentre as alíneas do artigo 482 da CLT, o “mau procedimento” figura como um conceito jurídico indeterminado, funcionando como uma cláusula geral ou residual. Ele abrange comportamentos que ferem a moral média e as normas de civilidade, mas que não se enquadram perfeitamente em tipos específicos como a desídia, a embriaguez ou a incontinência de conduta (esta última restrita a excessos de cunho sexual).
No entanto, há uma armadilha técnica frequente: a confusão entre mau procedimento e ato lesivo à honra ou boa fama. Embora o juiz possa reenquadrar os fatos (princípio da mihi factum, dabo tibi jus), a descrição fática na comunicação da dispensa vincula o empregador.
Quando um empregado profere ameaças, a conduta introduz o medo e a insegurança no ambiente laboral. A gravidade da ameaça não depende de sua consumação física; o simples ato de prometer um mal injusto e grave já rompe o dever de colaboração e urbanidade. Nesses casos, a validação judicial da justa causa costuma ser mantida quando a prova demonstra a intenção intimidatória, independentemente se a tipificação foi por mau procedimento ou ato lesivo, desde que os fatos estejam narrados com clareza.
Provas Digitais, LGPD e a Árvore Envenenada
Com a evolução tecnológica, as ameaças migraram para o ambiente virtual. Aqui reside um dos maiores desafios contemporâneos: a produção probatória em conformidade com a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) e o direito à privacidade.
Não basta apenas “rastrear o IP” ou apresentar prints de conversas. O advogado deve questionar a licitude da prova.
- Monitoramento Corporativo: O empregador pode monitorar e-mails e ferramentas corporativas, desde que haja um Regimento Interno claro e ciência prévia do empregado. Sem isso, a prova pode ser considerada ilícita.
- Dispositivos Pessoais: A obtenção de provas em dispositivos particulares (celular pessoal do empregado) sem ordem judicial prévia viola o sigilo telemático e pode contaminar todo o processo (Teoria dos Frutos da Árvore Envenenada).
- Ata Notarial: Para garantir a integridade da prova e evitar alegações de adulteração de prints, a lavratura de uma Ata Notarial é o padrão-ouro na documentação de ilícitos digitais.
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A Sindicância Investigativa e o Contraditório
Diante de uma denúncia de ameaça, especialmente anônima, a inércia é fatal, mas a precipitação também. A instauração de uma Sindicância Investigativa é fundamental. Embora a CLT não exija inquérito formal para empresas privadas (salvo estáveis), a jurisprudência moderna valoriza empresas que, antes de demitir, oferecem ao empregado a oportunidade de se explicar.
Ouvir o suposto infrator demonstra boa-fé objetiva e cautela. Além disso, as ferramentas de Compliance e Canais de Denúncia devem ser ativadas para conduzir investigações imparciais. Se o conteúdo das ameaças revela informações que apenas um funcionário específico detinha, cria-se um nexo causal forte, mas que deve ser corroborado por outras evidências para sustentar a pena máxima.
Imediatidade Relativa e o Risco do Perdão Tácito
A aplicação da justa causa submete-se ao requisito da imediatidade. Contudo, em casos complexos, o prazo conta-se a partir da conclusão da apuração e conhecimento da autoria, não necessariamente da data do fato.
Porém, um alerta é necessário: a investigação não pode ser eterna. Tribunais têm entendido que sindicâncias que se arrastam injustificadamente, sem complexidade que as justifique, geram perdão tácito. A agilidade na instauração e conclusão do procedimento investigatório é pressuposto de validade da dispensa.
Estratégia: Ameaça como Ilícito Penal vs. Falta Trabalhista
A conduta de ameaçar alguém é tipificada no artigo 147 do Código Penal. Todavia, as esferas são independentes. Uma estratégia jurídica prudente para a empresa é focar na descrição fática da conduta (o ato de intimidar, a quebra de harmonia, a agressividade) em vez de imputar taxativamente o “crime de ameaça” na carta de demissão.
Isso protege a empresa em caso de absolvição criminal por falta de provas ou atipicidade penal estrita. Se a empresa acusa o funcionário de “crime” e ele é absolvido criminalmente, abre-se uma porta perigosa para pleitos de danos morais na esfera trabalhista. O foco deve ser a inviabilidade da manutenção do vínculo contratual pela quebra de fidúcia e segurança.
O Dever de Proteção em Condomínios
Em ambientes residenciais e condomínios, a justa causa por ameaça ganha contornos de dever legal. O síndico ou administrador não apenas tem o direito de demitir, mas muitas vezes o dever de agir para proteger a incolumidade física e psicológica dos condôminos.
A omissão do condomínio diante de um porteiro ou zelador que profere ameaças (valendo-se de seu conhecimento privilegiado sobre a rotina dos moradores) pode atrair responsabilidade civil para o ente condominial caso a ameaça se concretize. Nestes cenários, a figura do “mau procedimento” se amolda perfeitamente, legitimando uma resposta enérgica para restabelecer a paz doméstica.
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Perguntas e Respostas
1. O empregador é obrigado a dar advertência antes de demitir por justa causa em casos de ameaça?
Não. O princípio da gradação das penas não é absoluto. Em casos de faltas gravíssimas, como ameaças à integridade física ou moral, a quebra da fidúcia é imediata, tornando insustentável a continuidade do vínculo e autorizando a justa causa direta.
2. Como validar juridicamente provas de ameaças digitais (WhatsApp/E-mail)?
A simples captura de tela (print) pode ser impugnada. O ideal é lavrar uma Ata Notarial em cartório para conferir fé pública ao conteúdo. Além disso, deve-se verificar se a prova foi obtida licitamente, respeitando a privacidade e as políticas internas de monitoramento da empresa.
3. Qual a diferença prática entre demitir por “mau procedimento” ou imputar “crime de ameaça”?
A demissão por “mau procedimento” foca na quebra das regras de conduta e civilidade contratuais. Imputar “crime” atrai o ônus de provar o tipo penal. Estrategicamente, descrever o ato de mau procedimento é mais seguro para a empresa, evitando reflexos de danos morais caso não haja condenação na esfera criminal.
4. Quanto tempo a empresa tem para investigar uma denúncia anônima sem configurar perdão tácito?
Não há um prazo fixo em lei, mas deve ser “razoável”. A investigação deve iniciar assim que a denúncia for recebida e ser conduzida com celeridade. Pausas injustificadas ou investigações que duram meses sem complexidade aparente podem descaracterizar a imediatidade e gerar perdão tácito.
5. O condomínio pode ser responsabilizado se não demitir um funcionário que faz ameaças?
Sim. O síndico tem o dever de zelar pela segurança comum. Se houver ciência de ameaças e omissão na tomada de providências, e o funcionário vier a concretizar a agressão, o condomínio poderá responder civilmente pelos danos causados aos moradores por culpa in vigilando.
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Acesse a lei relacionada em Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) – Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943
Este artigo teve a curadoria da equipe da Legale Educacional e foi escrito utilizando inteligência artificial a partir do seu conteúdo original disponível em https://www.conjur.com.br/2025-dez-13/trt-2-confirma-justa-causa-de-zelador-por-ameacas-via-mensagens/.