Responsabilidade Penal e Uso Indevido de Dados Pessoais em Fraudes Digitais
O uso ilícito de dados pessoais, em especial CPFs, para fins fraudulentos, é uma temática que envolve questões centrais do Direito Penal, da legislação de proteção de dados e do Direito Administrativo. Para profissionais do Direito, entender os fundamentos, nuances e repercussões dessas práticas é essencial em uma realidade de constante avanço tecnológico e disseminação de crimes digitais.
O Enquadramento Penal do Uso Indevido de Dados Pessoais
A utilização fraudulenta de CPFs alheios, especialmente para acessos ilegais ou obtenção de benefício, é tradicionalmente enquadrada nos delitos previstos no Código Penal, notadamente no artigo 313-A (inserção de dados falsos em sistemas de informações), artigo 171 (estelionato) e, em algumas hipóteses, no artigo 299 (falsidade ideológica).
O artigo 313-A do Código Penal prevê:
“Art. 313-A. Inserir ou facilitar, o funcionário autorizado, a inserção de dados falsos, alterar ou excluir indevidamente dados corretos nos sistemas informatizados ou bancos de dados da Administração Pública com o fim de obter vantagem indevida para si ou para outrem ou para causar dano: Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa.”
Já o artigo 171 refere-se ao estelionato:
“Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento.”
Esses dispositivos são frequentemente aplicados em situações em que terceiros acessam benefícios sociais utilizando cadastros alheios, em clara deturpação do sistema estatal e violação direta à fé pública.
O Peculato e a Administração Pública
Nos casos em que o agente envolvido possui vínculo com a Administração Pública, torna-se possível o enquadramento pelo crime de peculato eletrônico (artigo 312 combinado com artigo 313-A do Código Penal). Nessas situações, há uma maior gravidade em virtude do envolvimento funcional, demonstrando um abuso da condição de empregado público e facilitando, assim, a inserção, alteração ou exclusão de dados em bancos de dados governamentais.
Esse cenário exige do operador do Direito profunda compreensão técnica desses tipos penais e das diferenças práticas entre crimes funcionais próprios e impróprios.
Crimes Cibernéticos: Desafios Peculiares e Legislação Específica
O uso indevido de dados cadastrais em plataformas digitais demanda, ainda, o entendimento da Lei nº 12.737/2012 (Lei Carolina Dieckmann), que tipificou os crimes informáticos. Dentre as condutas previstas, destaca-se o artigo 154-A do Código Penal, acrescido pela referida lei:
“Invadir dispositivo informático alheio, conectado ou não à rede de computadores, mediante violação indevida de mecanismo de segurança e com o fim de obter, adulterar ou destruir dados ou informações sem autorização do titular do dispositivo ou instalar vulnerabilidades para obter vantagem ilícita.”
Esses dispositivos legais protegem tanto o indivíduo titular dos dados quanto a coletividade, ante o risco sistêmico que a violação em larga escala pode ocasionar, principalmente quando envolve programas de assistência social ou grandes bancos de dados públicos.
Inter-relação com a Lei Geral de Proteção de Dados
O profissional do Direito contemporâneo não pode ignorar a aplicação da Lei nº 13.709/2018 (Lei Geral de Proteção de Dados – LGPD). A manipulação indevida de informações pessoais não apenas configura infrações administrativas e civis, mas pode ter repercussões penais, sobretudo quando há objetivo ilícito manifesto.
A LGPD traz conceitos-chave como dado pessoal, dado sensível, legítimo interesse e consentimento, estabelecendo que a utilização e compartilhamento não autorizado desses dados pode ensejar, além de sanções administrativas, indenização por danos morais e materiais.
Os debates doutrinários ainda apontam diferentes entendimentos sobre a extensão da proteção penal em relação à simples quebra de sigilo, exigindo análise minuciosa do dolo, consumação e potencialidade lesiva do comportamento.
Dano à Administração Pública e Responsabilidade Civil
Além da esfera criminal, a conduta de fraudar sistemas que concedem benefícios sociais utilizando dados falsos também atinge o erário e configura atos de improbidade administrativa, conforme a Lei nº 8.429/1992. A responsabilização, nesse caso, pode atingir não só o agente público, mas também particulares que se beneficiam ou colaboram para o ilícito.
Os autores dessas fraudes podem ser compelidos a ressarcir integralmente o dano causado aos cofres públicos, independentemente das sanções criminais e administrativas.
Do ponto de vista procedimental, o uso de dados falsos pode quebrar a confiança não apenas do Estado, mas dos próprios destinatários dos programas sociais, exigindo dos advogados atuação multidisciplinar – abarcando tanto a defesa quanto a propositura de demandas de reparação.
Destaca-se que, no contexto de fraude em cadastros de programas sociais, a atuação do Tribunal de Contas e dos órgãos de controle interno é especialmente relevante. Tais órgãos, além de colaborarem para a identificação e cessação dos ilícitos, têm legitimidade para propor ações de ressarcimento e de responsabilização dos envolvidos.
Para quem deseja aprofundar-se neste universo de crimes contra a Administração Pública, o conhecimento técnico adquirido em uma Pós-Graduação em Direito Penal e Processo Penal é fundamental no aprimoramento da atuação e das estratégias de enfrentamento dessas condutas.
Elementos Probatórios e Procedimentos Apuratórios
Em investigações que objetivam apurar fraudes envolvendo CPFs e outros dados pessoais, a produção de prova digital é central. A obtenção de registros eletrônicos, logs de acessos, ICP-Brasil (Infraestrutura de Chaves Públicas) e perícia forense digital são instrumentos indispensáveis para a individualização da conduta e para a demonstração do nexo causal.
A jurisprudência tem salientado que a simples presença do dado pessoal em ambiente virtual não implica, necessariamente, a autoria, exigindo aprofundamento probatório e técnicas especializadas para a coleta, guarda e apresentação no processo.
Além disso, a tramitação desses casos na esfera judicial pode envolver medidas cautelares de bloqueio de valores, busca e apreensão de dispositivos eletrônicos e até mesmo cooperação internacional, caso as plataformas estejam sediadas fora do país.
Perspectiva Prática: A Atuação do Advogado Criminalista
A atuação do advogado na defesa ou acusação em processos criminais referentes ao uso indevido de informações pessoais em fraudes digitais demanda especialização teórica e prática. É comum, ainda, a necessidade de atuação conjunta com peritos em tecnologia da informação, para adequada compreensão dos fluxos de dados, dinâmicas de invasão e métodos de rastreamento de autoria.
Esse cenário impulsiona a busca por qualificação contínua, a exemplo da mencionada Pós-Graduação em Direito Penal e Processo Penal, preconizando o domínio dos novos instrumentos legais e técnicos imprescindíveis na atualidade.
Conclusão
O uso indevido de CPFs e dados pessoais em fraudes digitais é fenômeno transversal, exigindo do profissional do Direito abordagem multidisciplinar e atualização permanente frente às rápidas mudanças tecnológicas e legislativas. Estar familiarizado com os dispositivos penais aplicáveis, o funcionamento da administração pública, o papel dos órgãos de controle e as diretrizes da Lei Geral de Proteção de Dados é imprescindível para uma atuação jurídica efetiva e preventiva.
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Insights
O aperfeiçoamento em Direito Penal voltado para delitos digitais e fraudes contra a Administração é uma das demandas mais presentes na advocacia criminal contemporânea. O domínio sobre os dispositivos legais e processuais correlatos, aliado ao avanço dos mecanismos probatórios digitais, diferencia verdadeiros especialistas no tema.
O tratamento do dado pessoal tanto na perspectiva punitiva quanto garantista é uma tendência crescente na jurisprudência brasileira, exigindo atenção a novidades legislativas, entendimentos dos tribunais superiores e movimentações do Ministério Público e órgãos de controle.
A integração entre Direito Penal, Direito Administrativo Sancionador e a LGPD coloca o profissional em posição de destaque diante de situações envolvendo fraudes massivas, muitas vezes de difícil detecção e apuração.
Perguntas e Respostas
1. Qual a diferença entre estelionato e inserção de dados falsos em sistema de informação?
R: O estelionato (art. 171 do CP) exige o induzimento a erro de vítima para obtenção de vantagem ilícita, enquanto a inserção de dados falsos (art. 313-A do CP) envolve manipulação ilegítima de sistema informatizado, principalmente da Administração Pública, independentemente do erro de um terceiro.
2. A simples exposição indevida de dados pessoais gera responsabilidade penal?
R: Não necessariamente. A responsabilidade penal exige que a exposição seja dolosa e vinculada a um dos tipos penais previstos em lei, como invasão de dispositivo informático, falsidade ideológica ou estelionato.
3. Como a LGPD se relaciona com crimes praticados mediante uso de dados pessoais?
R: A LGPD estabelece diretrizes para o manuseio correto de dados pessoais e, se descumprida em contexto fraudulento, pode fundamentar responsabilização civil, administrativa e, em certos casos, penal, quando houver lesividade significativa e dolo.
4. O que caracteriza o peculato eletrônico?
R: Ocorre quando funcionário público, valendo-se do acesso privilegiado aos sistemas da Administração, insere dados falsos para obter vantagem indevida, configurando crime previsto nos arts. 312 c/c 313-A do CP.
5. Qual a importância do conhecimento técnico em Direito Penal Digital para o advogado?
R: É fundamental para interpretar corretamente os delitos emergentes, preparar defesas eficazes, entender a prova eletrônica e atuar junto a peritos e autoridades, sendo diferencial competitivo na advocacia criminal.
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Acesse a lei relacionada em https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/lcp150.htm
Este artigo teve a curadoria da equipe da Legale Educacional e foi escrito utilizando inteligência artificial a partir do seu conteúdo original disponível em https://www.conjur.com.br/2025-nov-08/tcu-analisa-possivel-uso-ilicito-de-cpfs-do-bolsa-familia-em-bets/.