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Responsabilidade do Empregador no Transporte de Valores e Dano Moral

Artigo de Direito
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A Responsabilidade Civil do Empregador e o Dano Moral no Transporte Irregular de Valores

A dinâmica das relações de trabalho impõe limites claros sobre as atribuições conferidas aos empregados. No entanto, é comum que empresas, na tentativa de otimizar custos operacionais, deleguem tarefas que escapam ao escopo contratual original. Um dos cenários mais críticos e recorrentes nos tribunais trabalhistas envolve o transporte de numerário por empregados que não foram contratados para tal fim, nem receberam o treinamento adequado exigido pela legislação de segurança privada.

Essa prática não constitui apenas um mero desvio de função ou uma alteração contratual lesiva. Ela toca em garantias fundamentais do trabalhador, especificamente o direito à segurança e à integridade física e psíquica. A jurisprudência consolidada, especialmente no âmbito do Tribunal Superior do Trabalho (TST), tem tratado essa matéria com rigor, reconhecendo a existência de dano moral decorrente da exposição indevida ao risco. Para o operador do Direito, compreender as nuances dessa responsabilidade civil é essencial para a correta postulação ou defesa em juízo.

O Arcabouço Legal do Transporte de Valores

A atividade de transporte de valores no Brasil não é desregulada. Ela obedece a critérios estritos estabelecidos pela Lei nº 7.102/1983, que dispõe sobre segurança para estabelecimentos financeiros e normas para constituição e funcionamento das empresas particulares que exploram serviços de vigilância e de transporte de valores. O legislador, ao criar esse diploma, reconheceu que o manuseio e deslocamento de somas em dinheiro atraem a criminalidade e, portanto, exigem aparato específico.

Segundo a referida lei, o transporte de numerário deve ser realizado por empresa especializada ou pelo próprio estabelecimento financeiro, desde que utilize pessoal próprio com formação específica de vigilante e veículo apropriado. A utilização de empregados comuns — como caixas, gerentes, auxiliares administrativos ou motoristas — para levar dinheiro ao banco configura uma violação direta desse dispositivo legal. Ao ignorar a norma cogente, o empregador assume os riscos da sua conduta omissiva e comissiva.

O descumprimento da Lei 7.102/1983 é o ponto de partida para a análise da ilicitude. Não se trata apenas de uma infração administrativa perante a Polícia Federal, mas de um ato ilícito civil que gera o dever de indenizar, conforme preceituam os artigos 186 e 927 do Código Civil, aplicados subsidiariamente ao Direito do Trabalho. A ilicitude reside na exposição do empregado a um perigo para o qual ele não foi preparado, não possui armamento, não possui colete balístico e não possui escolta.

A Natureza do Dano Moral e o Risco Acentuado

Um dos debates mais acalorados sobre o tema refere-se à necessidade de comprovação do abalo psicológico. A corrente majoritária na jurisprudência trabalhista entende que o transporte irregular de valores gera dano moral in re ipsa, ou seja, presumido. Isso significa que não é necessário que o empregado tenha sofrido um assalto efetivo ou violência física para que tenha direito à indenização.

O fundamento para essa presunção é o sofrimento psíquico, a angústia e o temor constante a que o trabalhador é submetido ao carregar valores da empresa pelas vias públicas. O simples fato de portar numerário visível ou sabido por terceiros coloca o indivíduo como alvo em potencial de ações criminosas. Essa tensão permanente viola a dignidade da pessoa humana e o direito a um meio ambiente de trabalho seguro.

Para advogados que desejam se aprofundar nas teses e defesas relacionadas a esse tema, o estudo detalhado sobre Dano Moral no Direito do Trabalho é indispensável para construir argumentos sólidos, seja na reclamatória inicial, seja na contestação empresarial. A compreensão de como os tribunais aferem a gravidade da ofensa é o diferencial entre uma indenização simbólica e uma reparação justa.

A responsabilidade do empregador, neste caso, é objetiva ou subjetiva com culpa presumida, dependendo da corrente doutrinária adotada, mas o resultado prático costuma convergir: aquele que cria o risco deve responder pelos danos dele decorrentes. Ao economizar na contratação de carro-forte ou empresa de segurança, o empregador transfere o risco do empreendimento para o hipossuficiente, o que é vedado pelo ordenamento jurídico pátrio.

Distinção entre Desvio de Função e Dano Moral

É crucial que o profissional do Direito saiba distinguir os pedidos. O empregado que transporta valores pode ter direito a diferenças salariais por acúmulo ou desvio de função, caso essa tarefa exija maior complexidade ou responsabilidade não remunerada. Contudo, a indenização por danos morais possui fato gerador distinto.

Enquanto o desvio de função repara o desequilíbrio sinalagmático do contrato (trabalho x salário), a indenização por danos morais repara a lesão à personalidade decorrente do medo e da insegurança. É perfeitamente possível a cumulação de ambos os pedidos. O Tribunal Superior do Trabalho tem reiteradamente decidido que o pagamento de adicional de risco ou gratificação de função não exclui, por si só, o dever de indenizar o dano extrapatrimonial, pois o dinheiro extra não elimina o risco à vida e a ansiedade gerada.

Critérios para Fixação do Quantum Indenizatório

Uma vez estabelecido o dever de indenizar, a controvérsia desloca-se para o valor da condenação. Não existe uma tabela fixa, mas o artigo 223-G da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), inserido pela Reforma Trabalhista, trouxe parâmetros para a tarifação do dano extrapatrimonial. O juiz deve considerar a natureza do bem jurídico tutelado, a intensidade do sofrimento, a possibilidade de superação, as condições pessoais e sociais da vítima e o grau de dolo ou culpa do ofensor.

No caso específico do transporte de valores, fatores agravantes costumam elevar o valor da condenação. A frequência com que o transporte era realizado é determinante: era diário, semanal ou esporádico? O valor transportado também é relevante; carregar altas somas gera um risco objetivamente maior do que transportar valores irrisórios para troco. O trajeto percorrido e o meio de transporte utilizado (a pé, ônibus, carro próprio ou da empresa) também influenciam na análise da exposição ao perigo.

A capacidade econômica da empresa ofensora é outro vetor de calibragem. A indenização deve ter caráter pedagógico e punitivo, desestimulando a reincidência da conduta ilícita, sem, contudo, gerar enriquecimento sem causa da vítima. O profissional que domina a Pós-Graduação em Direito do Trabalho e Processo saberá instrumentalizar provas documentais e testemunhais para demonstrar esses vetores ao magistrado, maximizando as chances de êxito na quantificação do dano.

A Defesa Empresarial e a Prevenção de Passivos

Sob a ótica da advocacia corporativa, a orientação preventiva é a única saída segura. Empresas devem ser alertadas de que a economia com serviços de segurança é ilusória frente ao passivo trabalhista potencial. Contudo, uma vez instaurado o litígio, a defesa deve focar na descaracterização do risco acentuado.

Argumentos comuns de defesa incluem a demonstração de que os valores eram ínfimos, incapazes de atrair a atenção de criminosos, ou que o transporte ocorria inteiramente dentro de shoppings centers ou locais com segurança privada própria, minimizando a exposição. Outra linha defensiva é a eventualidade da tarefa, buscando afastar a habitualidade que configuraria uma rotina de risco. Embora a jurisprudência seja protetiva, casos de transporte de valores irrelevantes tendem a não gerar dano moral, sendo considerados meros dissabores do cotidiano laboral.

A Importância da Prova no Processo do Trabalho

Para a configuração do dano moral por transporte de valores, o ônus da prova recai, primariamente, sobre o reclamante quanto ao fato constitutivo do seu direito. É necessário provar que o transporte ocorria. Uma vez provada a realização da tarefa, o dano moral, como dito, é presumido pela maioria das Turmas do TST.

A prova testemunhal é a rainha neste tipo de demanda. Testemunhas que confirmem a rotina de ida ao banco, a ausência de escolta e o volume de dinheiro transportado são essenciais. Documentos como guias de depósito assinadas pelo empregado, e-mails ordenando o transporte ou imagens de câmeras de segurança também robustecem o conjunto probatório.

Por outro lado, a empresa deve produzir contraprova robusta se desejar afastar a condenação. Registros de contratação de empresa de transporte de valores (carro-forte) cobrindo todo o período do contrato de trabalho são a melhor prova documental para demonstrar que o empregado não realizava tal função, ou o fazia em caráter excepcionalíssimo e emergencial, o que poderia mitigar a responsabilidade.

Reflexos na Saúde Ocupacional

Além da questão indenizatória imediata, a submissão constante ao estresse do transporte de valores pode desencadear patologias psíquicas, como a Síndrome de Burnout, Transtorno de Ansiedade Generalizada ou Síndrome do Pânico. Nesses casos, a discussão jurídica se aprofunda, podendo caracterizar doença ocupacional equiparada a acidente de trabalho.

Se comprovado o nexo causal entre a doença desenvolvida e a atividade de risco imposta irregularmente, as consequências para o empregador são severas, incluindo estabilidade provisória no emprego (12 meses após a alta previdenciária), dever de custear tratamento médico, além das indenizações por danos morais e, eventualmente, materiais (lucros cessantes e pensão, se houver incapacidade).

O advogado deve estar atento para não limitar a petição inicial apenas ao dano moral pelo risco, mas investigar se o cliente desenvolveu patologias que exijam uma reparação mais ampla. A anamnese detalhada durante o atendimento ao cliente é fundamental para identificar esses danos ocultos que muitas vezes o próprio trabalhador não associa imediatamente à sua rotina de trabalho insegura.

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Insights sobre o Tema

A análise aprofundada do transporte irregular de valores revela que a proteção jurídica ultrapassa a mera letra da lei, focando na realidade fática do contrato de trabalho. O princípio da primazia da realidade impera. Não importa o cargo anotado na Carteira de Trabalho; se a realidade impõe um risco não contratado e vedado por lei específica, nasce o dever de indenizar.

A tendência dos tribunais é de endurecimento contra a precarização das normas de segurança. A tese do “dano in re ipsa” solidificou-se para evitar que empresas paguem para ver o risco, transformando a integridade do trabalhador em uma variável de ajuste contábil. Para o advogado, o desafio é demonstrar a gravidade da conduta e a extensão do risco, fugindo de modelos genéricos e detalhando a realidade vivida pelo obreiro.

Perguntas e Respostas

1. O transporte de pequenas quantias gera dano moral?
A jurisprudência do TST tende a diferenciar valores. O transporte de quantias irrisórias, que não atraem a atenção de criminosos nem geram risco acentuado, geralmente não enseja indenização por danos morais. No entanto, o conceito de “irrisório” é subjetivo e depende da análise do caso concreto pelo juiz.

2. É necessário que o empregado tenha sido assaltado para pedir indenização?
Não. O entendimento majoritário é de que o dano moral, neste caso, é in re ipsa (presumido). O fundamento da indenização é a exposição indevida ao risco e o sofrimento psicológico (medo, ansiedade) decorrente dessa exposição, independentemente da concretização do assalto.

3. O pagamento de gratificação de função elimina o direito à indenização?
Não necessariamente. A gratificação remunera a maior responsabilidade do cargo, mas não compensa a violação do dever de segurança e a exposição a risco proibido por lei (Lei 7.102/83). É possível cumular o pedido de diferenças salariais com a indenização por danos morais.

4. Quem pode realizar o transporte de valores legalmente?
Segundo a Lei 7.102/1983, o transporte de valores deve ser feito por empresas especializadas (carros-fortes) ou pelo próprio estabelecimento financeiro, desde que utilize pessoal próprio treinado, aprovado em curso de formação de vigilante, e com veículo especial.

5. A empresa pode alegar que o empregado aceitou a tarefa tacitamente?
No Direito do Trabalho, a vontade do empregado é mitigada pela sua condição de hipossuficiência. O fato de o empregado não ter recusado a ordem não torna a conduta da empresa lícita. O dever de cumprir a lei de segurança privada é do empregador e é irrenunciável pelo trabalhador.

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Este artigo teve a curadoria da equipe da Legale Educacional e foi escrito utilizando inteligência artificial a partir do seu conteúdo original disponível em https://www.conjur.com.br/2025-dez-18/transporte-de-valores-sem-treinamento-gera-dano-moral-decide-trt-18/.

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