A Eficiência da Jurisdição Constitucional e o Impacto do Sistema de Precedentes na Gestão do Acervo Processual
A gestão do acervo processual nos tribunais superiores brasileiros deixou de ser apenas uma questão administrativa para se tornar um tema central de Direito Constitucional e Processual Civil. A eficiência jurisdicional não é mais uma meta abstrata, mas um imperativo categórico imposto pela própria Constituição Federal e regulamentado com rigor pelo Código de Processo Civil de 2015. Para o advogado contemporâneo, compreender a dinâmica de redução de estoques e a celeridade processual exige um mergulho profundo na sistemática dos precedentes vinculantes e nos filtros de admissibilidade recursal.
O cenário jurídico atual reflete uma transição paradigmática. O modelo tradicional, focado no litígio individualizado e na análise caso a caso sem vinculação estrita, cedeu espaço a uma lógica de padronização decisória. Essa mudança visa, primordialmente, garantir a isonomia e a segurança jurídica. Quando um tribunal de cúpula consegue reduzir drasticamente seu acervo, isso não ocorre por acaso, mas sim pela aplicação severa de institutos como a Repercussão Geral e a Súmula Vinculante.
Entender esse fenômeno exige que o profissional do Direito domine não apenas a técnica recursal, mas também a política judiciária que orienta a atuação das Cortes Superiores. A advocacia nos tribunais de vértice transformou-se. Não basta mais ter razão no mérito; é preciso ultrapassar barreiras de conhecimento cada vez mais altas, desenhadas para racionalizar a prestação jurisdicional.
O Princípio da Razoável Duração do Processo e a Tutela Jurisdicional
A base normativa para a busca incessante pela redução de estoques processuais encontra-se no artigo 5º, inciso LXXVIII, da Constituição Federal de 1988. Este dispositivo, inserido pela Emenda Constitucional nº 45/2004, elevou a celeridade processual ao status de direito fundamental. No entanto, a interpretação desse princípio não deve ser simplista. A “razoável duração” não significa apenas rapidez, mas sim um tempo que equilibre a celeridade com as garantias do devido processo legal.
O Código de Processo Civil de 2015 (CPC/15) incorporou essa diretriz em seus artigos 4º e 6º. O legislador estabeleceu que as partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito, incluída a atividade satisfativa. Mais do que isso, o dever de cooperação entre todos os sujeitos do processo visa justamente impedir comportamentos protelatórios que inflem o sistema judiciário.
A gestão de acervo, portanto, é a materialização administrativa desse mandamento constitucional. Quando o Supremo Tribunal Federal ou o Superior Tribunal de Justiça aplicam teses fixadas em sede de repercussão geral ou recursos repetitivos para julgar milhares de processos em bloco, eles estão operacionalizando o direito fundamental à razoável duração do processo. Para o advogado, isso significa que a estratégia de “ganhar tempo” com recursos infundados tornou-se não apenas ineficaz, mas perigosa, dada a possibilidade de imposição de multas por litigância de má-fé.
Para compreender a fundo como a Constituição molda essas diretrizes processuais e a própria estrutura do Poder Judiciário, o estudo aprofundado é essencial. Uma especialização sólida, como a Pós-Graduação em Direito e Processo Constitucional, oferece o arcabouço teórico necessário para que o profissional entenda não apenas a regra, mas o princípio que a sustenta.
O Sistema de Precedentes como Motor de Eficiência
O grande artífice da redução do volume processual no Brasil é o fortalecimento do sistema de precedentes. Embora o Brasil seja um país de tradição Civil Law, o CPC/15 aproximou nosso sistema do Common Law ao instituir um regime de precedentes obrigatórios, especialmente previsto no artigo 927. A lógica é simples: casos idênticos devem ter soluções idênticas. Isso permite que os tribunais decidam uma única vez a questão jurídica e apliquem a tese a todos os processos pendentes.
A Repercussão Geral no Recurso Extraordinário
No âmbito constitucional, o instituto da Repercussão Geral, regulamentado pelo artigo 1.035 do CPC e pelo § 3º do artigo 102 da Constituição, atua como o principal filtro de contenção. Para que um Recurso Extraordinário seja conhecido, o recorrente precisa demonstrar que a questão constitucional possui relevância econômica, política, social ou jurídica que ultrapasse os interesses subjetivos da causa.
Uma vez reconhecida a repercussão geral e julgado o mérito, a tese fixada vincula todo o Poder Judiciário. Isso permite que os tribunais de origem (Tribunais de Justiça e Tribunais Regionais Federais) neguem seguimento a recursos que contrariem o entendimento da Corte Suprema, sem que esses processos precisem subir a Brasília. É esse mecanismo de “represamento legítimo” na origem que causa a queda drástica no número de processos distribuídos aos ministros.
A Importância da Ratio Decidendi
Para o advogado, a atuação nesse cenário exige precisão cirúrgica na identificação da ratio decidendi (a razão de decidir) do precedente. Não basta ler a ementa do acórdão. É necessário analisar os fundamentos determinantes que levaram àquela conclusão. Muitas vezes, um recurso é inadmitido por aplicação equivocada de um precedente.
Nesse ponto, surgem as técnicas de distinguishing (distinção) e overruling (superação). O advogado deve ser capaz de demonstrar que o caso concreto do seu cliente possui particularidades fáticas ou jurídicas que o afastam da tese vinculante (distinguishing). Sem essa habilidade argumentativa, o recurso cairá na vala comum dos processos repetitivos e será sumariamente rejeitado ou terá seu seguimento negado.
O Papel do Plenário Virtual e a Tecnologia
Outro fator determinante para a celeridade e a redução do estoque é a utilização intensiva do Plenário Virtual. Esta ferramenta tecnológica permitiu que os tribunais superiores julgassem um volume de processos humanamente impossível de ser analisado em sessões presenciais. O Plenário Virtual expandiu a capacidade de processamento das Cortes, permitindo que questões de admissibilidade e mérito em processos padronizados fossem resolvidas de forma assíncrona.
A tecnologia, aliada à inteligência artificial, tem sido utilizada para agrupar processos por temas. Robôs e algoritmos identificam a similaridade entre as petições e as vinculam aos Temas de Repercussão Geral ou aos Recursos Repetitivos correspondentes. Isso impõe ao advogado uma nova responsabilidade: a de redigir petições estruturadas, claras e objetivas, facilitando a correta indexação do seu processo pelos sistemas de triagem.
A advocacia “artesanal”, no sentido de petições prolixas e despadronizadas, encontra dificuldades nesse ambiente digital e automatizado. O profissional precisa adaptar sua escrita para ser compreendido tanto pelos ministros quanto pelos algoritmos que fazem a triagem inicial. A gestão processual moderna é uma simbiose entre inteligência humana e capacidade computacional.
A Racionalização do Acesso à Justiça
Há uma discussão doutrinária profunda sobre se a filtragem excessiva de recursos não feriria o princípio do amplo acesso à Justiça (art. 5º, XXXV, CF). Contudo, a doutrina majoritária e a jurisprudência consolidada entendem que o acesso à Justiça não se confunde com acesso às instâncias superiores. O STF e o STJ não são cortes de terceira ou quarta instância para revisão de fatos e provas (Súmula 279 do STF e Súmula 7 do STJ).
A função dessas cortes é a guarda da Constituição e a uniformização da interpretação da lei federal, respectivamente. Portanto, a redução do acervo processual através do não conhecimento de recursos que não preencham requisitos estritos ou que tentem rediscutir matéria fática é uma medida de fortalecimento da própria instituição. Um tribunal afogado em processos repetitivos não consegue deliberar com a profundidade necessária sobre as grandes questões nacionais.
A eficiência na gestão do acervo permite que a Corte se debruce sobre temas fundamentais, como direitos de minorias, questões bioéticas complexas, conflitos federativos e a estruturação de políticas públicas. Quando o “lixo processual” é removido, sobra espaço para a verdadeira jurisdição constitucional.
Estratégias para a Advocacia nos Tribunais Superiores
Diante de um tribunal que bate recordes de baixa processual, o advogado precisa recalibrar sua atuação. O recurso meramente protelatório tornou-se financeiramente arriscado e processualmente inútil. A estratégia agora se volta para a construção de teses desde a primeira instância, visando o prequestionamento explícito da matéria constitucional ou federal.
Prequestionamento Ficto e Explícito: O CPC/15 trouxe a figura do prequestionamento ficto (art. 1.025), mas a jurisprudência dos tribunais superiores ainda é rigorosa quanto à necessidade de que o tribunal a quo tenha efetivamente enfrentado a matéria. O advogado deve manejar Embargos de Declaração de forma técnica, não para reformar a decisão, mas para obrigar o tribunal a se manifestar sobre o dispositivo legal violado, pavimentando a estrada para o Recurso Especial ou Extraordinário.
A Técnica da Repercussão Geral: Ao redigir um Recurso Extraordinário, a preliminar de Repercussão Geral não pode ser um texto genérico. Ela deve ser o coração da peça. O advogado deve demonstrar, com dados concretos, por que aquele caso transcende o interesse das partes. Deve-se argumentar sobre o impacto econômico da decisão para o setor, ou sobre a relevância social da tese para um grupo vulnerável.
Dominar essa técnica é o que separa os advogados que têm seus recursos admitidos daqueles que apenas engrossam as estatísticas de baixa processual. A advocacia de ponta exige um conhecimento profundo sobre como a Corte pensa e opera seus filtros. Para aqueles que desejam atuar especificamente nessa fase crítica do processo, o curso de Advocacia Cível – Recurso Especial e Extraordinário é uma ferramenta indispensável para compreender as nuances que garantem a admissibilidade recursal.
Conclusão
A redução histórica de estoques processuais é o sintoma de um sistema que amadureceu em sua gestão e na aplicação de precedentes vinculantes. Para o Direito Brasileiro, isso representa um avanço em direção à segurança jurídica e à estabilidade das relações sociais. Para os profissionais do Direito, representa um desafio de adaptação. A era da litigância de massa sem critérios deu lugar à era da litigância estratégica, onde o conhecimento profundo dos filtros processuais e da jurisprudência defensiva das cortes é a chave para o sucesso. O advogado que ignora essa nova realidade corre o risco de se tornar obsoleto, enquanto aquele que domina a técnica dos precedentes encontra um vasto campo de atuação na construção do Direito.
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Insights Jurídicos
* A Força Vinculante como Redutor de Demandas: A aplicação correta do art. 927 do CPC é o principal fator de desobstrução das pautas. Ao fixar uma tese, o tribunal resolve virtualmente milhares de conflitos futuros.
* Plenário Virtual e Celeridade: A tecnologia não é apenas acessória, mas constitutiva da nova eficiência jurisdicional. O julgamento assíncrono permite uma vazão que o modelo presencial jamais comportaria.
* Filtros de Admissibilidade Rigorosos: A redução do acervo está diretamente ligada ao rigor na análise dos pressupostos recursais, especialmente a Repercussão Geral (STF) e a Relevância da Questão Federal (nova exigência para o STJ).
* Fim da Aposta na Morosidade: A eficiência na gestão de acervo elimina a vantagem econômica de recorrer apenas para adiar o cumprimento da obrigação, alterando a análise econômica do processo feita pelas empresas e litigantes habituais.
Perguntas e Respostas
1. O que diferencia a Repercussão Geral dos Recursos Repetitivos?
A Repercussão Geral é um requisito específico do Recurso Extraordinário (STF) que exige a demonstração de relevância social, política, econômica ou jurídica da questão constitucional. Já os Recursos Repetitivos são uma técnica de julgamento (aplicável tanto no STF quanto no STJ) onde se selecionam paradigmas para fixar uma tese jurídica que será aplicada a todos os processos idênticos que estavam suspensos.
2. A redução do estoque processual prejudica o direito de defesa?
Não necessariamente. A redução do estoque, quando feita através da aplicação de precedentes vinculantes, visa garantir a isonomia. O direito de defesa é respeitado, mas dentro dos limites da lei e da jurisprudência consolidada. O sistema visa impedir o abuso do direito de recorrer e a rediscussão eterna de matérias já pacificadas.
3. Como o advogado pode superar um precedente desfavorável?
Através da técnica de distinguishing. O advogado deve demonstrar na petição que o caso concreto possui particularidades fáticas ou jurídicas que o distinguem do precedente paradigma, justificando, assim, a não aplicação da tese vinculante ou a necessidade de uma nova análise.
4. Qual a importância do prequestionamento na atual sistemática?
O prequestionamento continua sendo um requisito inafastável. Sem que a matéria constitucional ou federal tenha sido debatida e decidida na instância inferior, os tribunais superiores não podem inaugurar a competência recursal. A Súmula 282 do STF e a Súmula 211 do STJ permanecem aplicáveis e rigorosas.
5. O Plenário Virtual julga todos os tipos de processos?
O Plenário Virtual tem tido sua competência ampliada progressivamente. Inicialmente focado em Repercussão Geral e Agravos Internos, hoje permite o julgamento de mérito de diversas ações, inclusive com a possibilidade de sustentação oral por meio de envio de arquivos de áudio ou vídeo, garantindo a ampla defesa no ambiente digital.
Aprofunde seu conhecimento sobre o assunto na Wikipedia.
Acesse a lei relacionada em Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/2015)
Este artigo teve a curadoria da equipe da Legale Educacional e foi escrito utilizando inteligência artificial a partir do seu conteúdo original disponível em https://www.conjur.com.br/2025-dez-19/stf-encerra-2025-com-o-menor-estoque-processual-dos-ultimos-31-anos/.