Impenhorabilidade, Boa-fé e Pública-Fé Registral: A Proteção do Adquirente de Imóvel no Direito Brasileiro
O universo dos direitos reais, especialmente no campo imobiliário, apresenta questões complexas quando se trata da proteção do adquirente de boa-fé diante de execuções e penhoras judiciais. O ponto central deste artigo é analisar os fundamentos jurídicos acerca da impenhorabilidade do imóvel adquirido sem o devido registro na matrícula, destacando o papel da boa-fé e os reflexos do princípio da publicidade registral.
O Sistema Registral Imobiliário e a Função da Matrícula
O sistema de registro imobiliário brasileiro é regido, sobretudo, pelos princípios da especialidade, continuidade e publicidade, conforme estabelecido pela Lei n. 6.015/1973 (Lei dos Registros Públicos) e reforçado pelo art. 1.245 do Código Civil. A matrícula é a certidão de nascimento do imóvel; todos os atos de transmissão de propriedade, ônus e restrições apenas se tornam eficazes perante terceiros quando registrados.
Isso significa que, do ponto de vista formal, a propriedade e demais direitos reais sobre imóveis só são plenamente oponíveis erga omnes após o devido registro. No entanto, a realidade prática mostra situações em que a tradição ocorre extrajudicialmente, e o registro acaba sendo postergado pelas partes, abrindo espaço para discussões jurídicas sobre a proteção do adquirente e a oponibilidade de seu direito perante terceiros, especialmente credores do alienante.
Publicidade e oponibilidade frente à boa-fé objetiva
A boa-fé objetiva é um dos princípios centrais que permeia todo o direito privado contemporâneo, encontrando eco expresso nos arts. 113 e 422 do Código Civil. No contexto registral, sua função é, tradicionalmente, relativizada frente ao princípio da publicidade. Afinal, é pelo acesso público à matrícula que terceiros podem exercer a cautela necessária diante de possíveis vícios ou limitações do direito sobre o imóvel.
Porém, a boa-fé do adquirente ganha relevo em hipóteses excepcionais, tornando-se relevante para salvaguardar situações em que o comprador confia na eficácia do negócio jurídico, mesmo sem o registro, e já detém a posse com animus domini.
Impenhorabilidade do Imóvel Adquirido de Boa-fé e Sem Registro: Fundamentos Jurídicos
A transmissão da propriedade imobiliária no Código Civil
Segundo o art. 1.245 do Código Civil, a transferência da propriedade imobiliária só se aperfeiçoa mediante o registro do título translativo no Cartório de Registro de Imóveis. Antes disso, o adquirente não pode ser considerado proprietário para todos os efeitos legais – trata-se de promessa de direito real, não de direito real efetivo.
Contudo, a mesma norma, em seu §1º, dispõe que “enquanto não se registrar o título translativo, o alienante continua a ser havido como dono do imóvel”. A interpretação desse dispositivo é central quando se examina a possibilidade de penhora: credores podem confiscar bens que, perante a publicidade registral, ainda pertencem ao devedor. Mas haveria espaço para blindagem do adquirente de boa-fé?
Poder de disposição, tradição, usucapião e proteção possessória
Da perspectiva do direito material, a entrega da posse (tradição) ao adquirente consuma, em muitos aspectos, o cumprimento do negócio jurídico. Há hipóteses – como usucapião extraordinária e ordinária – em que a longa posse de boa-fé supre a ausência de registro. O STJ (Superior Tribunal de Justiça) já decidiu, em diversos precedentes, que adquirente que exerce posse mansa, pacífica e onerosa, ainda sem registro, pode obter proteção possessória e, até mesmo, embargos de terceiro contra penhora em nome do alienante, desde que seja comprovada a inexistência de fraude.
Nesses casos, o fundamento está tanto na proteção da confiança legítima quanto no princípio da função social da propriedade e da tutela da boa-fé. A jurisprudência tende a exigir provas robustas de que o adquirente não contribuiu para fraude contra credores, note-se.
Para aprofundar todos os ângulos e desafios que envolvem a regularização de imóveis e a atuação estratégica em situações envolvendo transmissões sem registro, o domínio teórico e prático é indispensável. O caminho ideal para se tornar referência é percorrer estudos avançados, como a Pós-Graduação em Regularização Imobiliária, que aborda desde os fundamentos registrais até os conflitos judiciais comuns na advocacia imobiliária.
Embargos de Terceiro e a Oposição do Direito de Adquirente
Os embargos de terceiro, previstos nos arts. 674 e seguintes do Código de Processo Civil, constituem o principal instrumento processual para o adquirente que, não sendo parte em execução, tem seu direito real ou possessório atingido por ordem judicial. O entendimento majoritário dos tribunais é que, havendo posse e comprovação da boa-fé (ausência de conluio e negócio anterior ao início do processo do credor), é possível o levantamento da penhora.
A Súmula 84 do STJ dispõe que “é admissível a oposição de embargos de terceiro fundada em alegação de posse advinda de compromisso de compra e venda de imóvel ainda que ausente o registro”. Reforça-se assim o entendimento de que a posse de boa-fé pode ser suficiente para proteção contra constrições indevidas, desde que não comprovada fraude à execução (art. 792, IV, do CPC/2015).
Fraude à Execução x Fraude Contra Credores: Diferenciação Essencial
A análise das situações em que o imóvel pode, ou não, ser objeto de penhora quando adquirido sem registro exige discernir entre fraude à execução (art. 792 do CPC) e fraude contra credores (arts. 158 e 159 do CC).
Na fraude à execução, é fundamental o grau de conhecimento dos terceiros sobre a existência de demandas judiciais em trâmite contra o vendedor, especialmente se a ação já tramita e existe penhora ou restrição anotada na matrícula. A averbação da constrição é imprescindível para proteção de boa-fé de terceiros compradores. Com a vigência do art. 54 da Lei 13.097/2015, a ausência de averbação de ação ou restrição legal na matrícula protege o adquirente oneroso de boa-fé.
Já na fraude contra credores, há necessidade de demonstração do consilium fraudis (conluio) no momento da alienação. O adquirente pode eximir-se da responsabilidade se comprovar ignorância de eventual lesão a terceiros.
O aperfeiçoamento conceitual desses institutos é indispensável para quem atua em questões de regularização, defesa em execuções ou estruturação de negócios imobiliários, pautando uma estratégia de atuação preventiva ou contenciosa. Formações atualizadas, como a Pós-Graduação em Direito Imobiliário, fornecem base sólida para navegar nessas nuances.
Transparência e Segurança Jurídica nas Transações Imobiliárias
O Brasil tem dado passos importantes para fortalecer a segurança jurídica dos negócios imobiliários e valorizar a publicidade dos registros. Contudo, ainda persiste um elevado número de alienações informais ou pendentes de regularização registral, seja por fatores culturais, econômicos ou burocráticos.
A atuação do operador do direito deve privilegiar a busca pela regularidade formal e a orientação preventiva das partes. A constituição do registro, sempre que possível, é o caminho mais seguro para evitar litígios. Mas quando a situação foge ao ideal, o domínio dos fundamentos expostos neste artigo é que fará diferença na atuação técnica para proteger direitos e reduzir riscos de constrição indevida de patrimônio.
Considerações Finais
A proteção do adquirente de imóvel de boa-fé, mesmo sem registro, representa uma das mais relevantes evoluções do direito imobiliário brasileiro. A jurisprudência tem se pautado pela ponderação entre princípios da segurança jurídica, publicidade registral e proteção da confiança e da função social da propriedade. A compreensão dessas diretrizes permite que advogadas e advogados atuem de forma eficaz seja na defesa de adquirentes seja na constituição de garantias para credores.
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Insights Avançados para a Prática Imobiliária
O aprofundamento em direitos reais, publicidade registral e embargos de terceiro é requisito para advocacia de excelência. Essa base teórica e o acompanhamento das inovações legislativas viabilizam tratos preventivos mais seguros e defesas robustas diante de constrições judiciais. O debate entre boa-fé objetiva, função do registro e segurança jurídica seguirá provocando teses e evoluções jurisprudenciais; manter-se atualizado é diferencial competitivo no mercado jurídico.
Perguntas e Respostas
1. O adquirente de imóvel sem registro tem direito ao exercício de embargos de terceiro?
Sim, desde que comprove posse de boa-fé e ausência de fraude, especialmente se o compromisso de compra e venda anteceder a ação de execução ou constrição judicial, conforme entendimento consolidado pelo STJ e a Súmula 84.
2. A ausência de registro impede o exercício pleno da propriedade?
Sim, a propriedade do imóvel somente é transferida com o registro. Entretanto, direitos possessórios e proteção contra penhora podem ser reconhecidos, a depender de análise casuística.
3. A constrição recairá sempre sobre o imóvel em nome do devedor?
Não. Se comprovada a alienação anterior à constrição ou averbação e for ausente fraude, além de constatada a posse de boa-fé do terceiro, a penhora pode ser afastada.
4. Como o art. 54 da Lei 13.097/2015 impactou a proteção do adquirente?
Esse artigo elevou a matrícula como referência central para proteção de terceiros de boa-fé, exigindo a averbação de restrições e tornando ineficaz, perante terceiros, penhora não registrada.
5. Qual a medida preventiva mais importante para evitar litígios em aquisição de imóvel?
A orientação é dar entrada imediata no registro do título translativo no Cartório de Registro de Imóveis, transferindo a propriedade de forma definitiva e garantindo segurança jurídica ao negócio.
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Acesse a lei relacionada em https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l6015compilada.htm
Este artigo teve a curadoria da equipe da Legale Educacional e foi escrito utilizando inteligência artificial a partir do seu conteúdo original disponível em https://www.conjur.com.br/2025-ago-30/trt-3-afasta-penhora-de-imovel-adquirido-de-boa-fe-e-sem-registro-na-matricula/.