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Fraude Cota de Gênero: Análise Jurídica e Cassação

Artigo de Direito
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Fraude à Cota de Gênero e a Nulidade da Votação: Análise Jurídica e Reflexos no Mandato Eletivo

O Princípio da Igualdade e a Ação Afirmativa na Legislação Eleitoral

O ordenamento jurídico brasileiro, em consonância com os vetores constitucionais de pluralismo político e igualdade material, estabeleceu mecanismos de ação afirmativa para garantir a representatividade feminina na política. O artigo 10, parágrafo 3º, da Lei nº 9.504/1997, conhecida como Lei das Eleições, estipula que cada partido ou coligação deve preencher o mínimo de 30% e o máximo de 70% para candidaturas de cada sexo. Esta norma não constitui mera recomendação programática, mas um imperativo legal de observância obrigatória para a regularidade do Demonstrativo de Regularidade de Atos Partidários, o DRAP.

A violação deste preceito, contudo, evoluiu de uma simples análise aritmética no momento do registro de candidatura para uma complexa verificação de fraude superveniente ou concomitante ao pleito. A fraude à cota de gênero ocorre quando agremiações partidárias lançam candidaturas femininas fictícias, apenas para preencher formalmente a reserva legal, sem a intenção real de disputa. Tais candidatas, vulgarmente conhecidas como “laranjas”, não realizam atos de campanha, não movimentam recursos financeiros de forma legítima e, muitas vezes, possuem votação zerada ou ínfima.

A compreensão profunda deste fenômeno exige do jurista um olhar atento não apenas à letra da lei, mas à jurisprudência consolidada que define os elementos probatórios da fraude. Não se trata apenas de provar a ausência de votos, mas de demonstrar um conjunto de indícios que, somados, revelam o dolo em burlar a ação afirmativa. A higidez do processo eleitoral depende da repressão a tais condutas, sob pena de esvaziar o propósito legislativo de fomento à participação feminina.

Elementos Caracterizadores da Candidatura Fictícia na Jurisprudência

A identificação da fraude à cota de gênero não é tarefa simples, pois envolve a análise subjetiva da intenção de candidatar-se. Os tribunais superiores têm refinado os critérios para a configuração do ilícito, estabelecendo standards probatórios que devem ser observados pelos advogados que atuam tanto na acusação quanto na defesa em ações eleitorais. A votação zerada ou pífia é o primeiro indício, mas isoladamente pode não ser suficiente para a condenação, uma vez que a desistência tácita é uma possibilidade na dinâmica política.

Todavia, a jurisprudência fixou que a combinação de votação inexistente com a ausência de movimentação financeira e a falta de atos efetivos de campanha constitui prova robusta da fraude. A ausência de gastos eleitorais ou a prestação de contas padronizada, sem despesas típicas de uma campanha real, como material gráfico ou impulsionamento de conteúdo, reforça a tese de simulacro. Outro elemento frequentemente observado é o parentesco entre a candidata fictícia e outros candidatos da mesma chapa, sugerindo que a candidatura feminina serviu apenas de degrau para viabilizar a candidatura masculina.

A advocacia especializada deve estar atenta à Súmula 73 do Tribunal Superior Eleitoral, que cristalizou o entendimento sobre a fraude à cota de gênero. O verbete sumular elenca circunstâncias fáticas que, analisadas em conjunto, permitem a cassação dos mandatos. Para o profissional que deseja se aprofundar na complexidade destes processos e nas teses de defesa e acusação, o estudo continuado é indispensável. Uma excelente oportunidade para dominar essa matéria é a Pós-Graduação em Direito Eleitoral, que aborda as minúcias processuais e materiais dessas demandas.

Além da ausência de campanha, verifica-se em muitos casos que a própria candidata faz campanha explícita para terceiros, muitas vezes para o concorrente que se beneficiou da fraude para compor a chapa. Essa conduta, quando documentada, torna-se uma prova cabal do desvio de finalidade do registro de candidatura. O operador do Direito deve saber manusear provas digitais, registros de redes sociais e prestações de contas para construir ou desconstruir a tese de fraude.

Consequências Jurídicas: A Cassação do DRAP e a Nulidade dos Votos

A consequência jurídica do reconhecimento da fraude à cota de gênero é severa e atinge a totalidade da chapa proporcional. O entendimento predominante é que a fraude contamina a própria formação da lista de candidatos, viciando o Demonstrativo de Regularidade de Atos Partidários (DRAP). Uma vez que o DRAP é o ato que habilita o partido a participar do pleito, a sua nulidade implica a queda de todos os candidatos a ele vinculados, sejam eles titulares eleitos ou suplentes.

Este efeito expansivo decorre da natureza incindível da chapa nas eleições proporcionais. Se o partido não cumpriu os requisitos legais para participar da eleição, nenhum dos votos obtidos por aquela agremiação pode ser considerado válido. Diferentemente de outras infrações eleitorais que podem atingir apenas o candidato infrator, a fraude à cota de gênero ataca a raiz da legitimidade da participação partidária. Portanto, a sanção não se limita às candidatas fictícias, mas reverbera sobre os candidatos eleitos que, em tese, teriam agido de boa-fé.

A anulação dos votos recebidos por toda a chapa partidária gera a necessidade de retotalização dos quocientes eleitoral e partidário. Os votos anulados são descartados do cálculo de distribuição de cadeiras, o que pode alterar significativamente a composição da casa legislativa. Esta redistribuição das vagas, conhecida como “dança das cadeiras”, é um dos momentos de maior tensão jurídica e política, exigindo do advogado precisão matemática e processual para assegurar que a retotalização obedeça aos critérios legais.

Responsabilidade Subjetiva versus Responsabilidade Objetiva na Perda do Mandato

Um ponto nevrálgico nas discussões sobre fraude à cota de gênero reside na necessidade de prova da participação ou anuência dos candidatos eleitos no ilícito. A tese da responsabilidade subjetiva argumenta que o candidato eleito que não participou da fraude não deveria perder seu mandato. No entanto, a jurisprudência consolidou a aplicação da teoria da responsabilidade objetiva no que tange à perda do mandato.

Para a cassação do diploma e do mandato, basta a comprovação de que a fraude beneficiou a chapa, independentemente da ciência ou participação direta dos eleitos. O fundamento é que o mandato foi obtido através de uma chapa constituída ilegalmente. Se o partido não preencheu validamente a cota de gênero, ele não deveria ter concorrido; logo, os mandatos decorrentes dessa concorrência são frutos de uma árvore envenenada. A boa-fé do candidato eleito, neste cenário, não é suficiente para convalidar o vício de origem do DRAP.

Contudo, há uma distinção fundamental no que tange à sanção de inelegibilidade. Enquanto a cassação do mandato atinge todos os integrantes da chapa por arrastamento, a declaração de inelegibilidade, que impede a candidatura por oito anos, exige a comprovação da responsabilidade pessoal ou participação direta na fraude. A inelegibilidade tem caráter personalíssimo e sancionatório, não podendo ser aplicada objetivamente a quem não contribuiu para o ilícito.

O Impacto das Ações Eleitorais: AIJE e AIME

Os instrumentos processuais adequados para arguir a fraude à cota de gênero são a Ação de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE) e a Ação de Impugnação de Mandato Eletivo (AIME). A AIJE tem como foco o abuso de poder e pode ser ajuizada até a data da diplomação, visando a cassação do registro ou diploma e a declaração de inelegibilidade. Já a AIME, prevista na Constituição Federal, ataca o mandato obtido mediante fraude, corrupção ou abuso de poder econômico, devendo ser proposta em até 15 dias após a diplomação.

O manejo correto dessas ações exige domínio sobre os prazos decadenciais e a legitimidade ativa e passiva. No caso de fraude à cota, forma-se um litisconsórcio passivo necessário entre todos os candidatos da chapa, sob pena de nulidade do processo. A ausência de citação de um dos integrantes da chapa, inclusive dos suplentes não diplomados em certos contextos, pode levar à extinção do processo sem resolução de mérito, frustrando a pretensão punitiva.

O profissional do Direito deve estar preparado para atuar em um cenário de provas indiciárias e presunções legais. A instrução probatória nestas ações é o coração da demanda. Testemunhas que confirmem a ausência de atos de campanha, perícias em materiais gráficos e análise de metadados de publicações em redes sociais são ferramentas essenciais. A complexidade probatória reforça a necessidade de uma formação sólida, como a oferecida na Pós-Graduação em Direito Eleitoral, que capacita o advogado para enfrentar os desafios probatórios específicos da Justiça Eleitoral.

Reflexos na Segurança Jurídica e na Estabilidade dos Mandatos

A anulação de votos e a cassação de chapas inteiras geram debates sobre a segurança jurídica e a soberania popular. Críticos argumentam que a anulação massiva de votos desrespeita a vontade do eleitor que escolheu um candidato específico daquela chapa. Entretanto, a posição prevalecente é a de que não há soberania popular válida quando exercida em um contexto de ilegalidade e fraude à lei. A vontade do eleitor deve ser manifestada dentro das regras do jogo democrático, que incluem o respeito à diversidade e às ações afirmativas.

A estabilidade dos mandatos cede espaço, portanto, à lisura do pleito. A Justiça Eleitoral tem adotado uma postura rígida para desestimular a prática de burlar a cota de gênero. A mensagem institucional é clara: partidos que não levarem a sério a inclusão feminina e tentarem simular o cumprimento da lei sofrerão a perda total de seus mandatos, prejudicando toda a sua construção política naquela legislatura.

Essa postura rigorosa visa também um efeito pedagógico. Ao impor um custo político altíssimo para a fraude – a perda de todos os mandatos da legenda –, o Judiciário incentiva os partidos a fiscalizarem internamente suas candidaturas e a promoverem, de fato, a participação das mulheres na política, investindo recursos e tempo de rádio e TV de maneira equitativa e real.

Considerações Finais sobre a Atuação Profissional

O tema da fraude à cota de gênero representa um dos tópicos mais vibrantes e técnicos do Direito Eleitoral contemporâneo. Ele congrega aspectos constitucionais, administrativos e processuais, exigindo do advogado uma visão holística do sistema. A defesa de mandatos ou a acusação de fraudes neste campo não permite amadorismo, dado o impacto direto na composição dos poderes legislativos municipais, estaduais e federal.

Dominar as nuances da nulidade dos votos e da retotalização é um diferencial competitivo no mercado jurídico. Saber diferenciar a responsabilidade do partido da responsabilidade do candidato, e manejar as provas para configurar ou afastar a fraude, é competência essencial. O Direito Eleitoral, com seus ritos céleres e consequências graves, demanda atualização constante frente às mutações da jurisprudência dos tribunais superiores.

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Insights do Artigo

A fraude à cota de gênero não exige apenas prova de votação zerada, mas um conjunto probatório que inclua ausência de gastos e atos de campanha.
A consequência da fraude é a nulidade de todos os votos da chapa (DRAP), resultando na cassação de titulares e suplentes, independentemente de culpa individual.
A responsabilidade para perda do mandato é objetiva, enquanto a inelegibilidade exige responsabilidade subjetiva e prova de participação no ilícito.
A anulação dos votos da chapa fraudulenta obriga a realização de um novo cálculo do quociente eleitoral e partidário, redistribuindo as vagas.
A Súmula 73 do TSE é o guia fundamental para a identificação dos requisitos caracterizadores da fraude à cota de gênero.

Perguntas e Respostas

1. A votação zerada de uma candidata é suficiente para comprovar a fraude à cota de gênero e anular a eleição?

Não isoladamente. Embora seja um forte indício, a jurisprudência exige a comprovação de outros elementos concomitantes, como ausência de movimentação financeira, falta de atos de campanha e, muitas vezes, o parentesco com outros candidatos ou campanha para terceiros.

2. Se ficar comprovada a fraude, todos os candidatos eleitos pelo partido perdem o mandato, mesmo os homens que não sabiam da fraude?

Sim. A fraude contamina o Demonstrativo de Regularidade de Atos Partidários (DRAP), tornando nula a participação de todo o partido ou coligação. A cassação do mandato ocorre por arrastamento, independentemente da boa-fé ou desconhecimento dos demais candidatos eleitos.

3. Os candidatos cassados por fraude à cota de gênero tornam-se automaticamente inelegíveis?

Não todos. Apenas aqueles que comprovadamente participaram, anuíram ou contribuíram diretamente para a fraude são declarados inelegíveis. Os demais perdem o mandato devido à nulidade da chapa, mas mantêm seus direitos políticos para pleitos futuros.

4. O que acontece com os votos dados à legenda que cometeu a fraude?

Os votos são anulados. Eles são subtraídos do total de votos válidos da eleição. Isso exige uma retotalização dos quocientes eleitoral e partidário, o que pode alterar a distribuição das cadeiras restantes para outros partidos que participaram do pleito regularmente.

5. Qual a diferença entre a AIJE e a AIME no combate à fraude de cota de gênero?

A Ação de Investigação Judicial Eleitoral (AIJE) foca no abuso de poder e pode ser proposta até a diplomação, visando a cassação e a inelegibilidade. A Ação de Impugnação de Mandato Eletivo (AIME) é proposta após a diplomação (prazo de 15 dias) e tem fundamento constitucional para atacar a fraude ou corrupção, visando desconstituir o mandato.

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Acesse a lei relacionada em Lei nº 9.504/1997

Este artigo teve a curadoria da equipe da Legale Educacional e foi escrito utilizando inteligência artificial a partir do seu conteúdo original disponível em https://www.conjur.com.br/2025-dez-19/tse-volta-a-debater-se-fraude-a-cota-de-genero-deve-anular-a-votacao-de-candidatas-eleitas/.

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