A Obrigatoriedade de Fornecimento de Medicamentos pelo SUS: Aspectos Jurídicos Fundamentais
Introdução ao Direito à Saúde e a Assistência Farmacêutica
O direito à saúde no Brasil é um dos pilares do Estado Democrático de Direito, estando consagrado no artigo 196 da Constituição Federal. Esse dispositivo determina que a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem a redução do risco de doença e outros agravos, bem como o acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.
Entre os serviços ofertados pelo Estado, o fornecimento de medicamentos de forma gratuita pelo Sistema Único de Saúde (SUS) se destaca como um dos mais demandados, principalmente diante de casos em que fármacos não pertencentes às listas do Ministério da Saúde são pleiteados por pacientes que não têm condições de arcar com seus custos.
Neste contexto, analisar a obrigação estatal de fornecer medicamentos implica adentrar nos campos do Direito Constitucional, do Direito Administrativo, do Direito Sanitário e do Processo Judicial Coletivo e Individual.
Fundamentos Constitucionais do Direito à Saúde e ao Medicamento
Conforme citado, o artigo 196 da Constituição estabelece a saúde como direito fundamental. O artigo 198 detalha as diretrizes do SUS, e o artigo 197 caracteriza as ações e serviços de saúde como de relevância pública.
A assistência farmacêutica é reconhecida como uma das componentes essenciais do cuidado em saúde, integrando o rol de serviços inclusos na política pública do SUS (Lei nº 8.080/1990, artigos 6º e 7º). A jurisprudência consolidada do Supremo Tribunal Federal (STF) e dos Tribunais Superiores interpreta a prestação estatal como obrigação de fazer, podendo ser exigida judicialmente.
A responsabilidade do Estado pelo fornecimento de medicamentos é solidária entre União, Estados, Distrito Federal e Municípios, cabendo, assim, ao cidadão a escolha contra quem mover a demanda, sem que haja necessidade de litisconsórcio passivo necessário entre as entidades federativas.
A Assistência Farmacêutica Brasileira: Lei 8.080/90 e Normativa Específica
A Lei 8.080/90, conhecida como Lei Orgânica da Saúde, disciplina a organização do SUS e reforça o acesso à assistência terapêutica integral. Por sua vez, portarias ministeriais periodicamente atualizam o elenco de medicamentos oferecidos, o chamado “Rol Nacional de Medicamentos Essenciais” ou RENAME.
Ainda, a Lei 9.313/96, específica para medicamentos destinados a portadores do HIV/AIDS, ilustra a tendência de judicialização para além dos medicamentos incorporados formalmente ao SUS, abrindo espaço para discussões sobre tratamentos experimentais, de alto custo ou ainda não registrados na Anvisa.
Judicialização da Saúde e o Dever de Fornecimento pelo Poder Público
Em virtude da inércia estatal em prover de forma eficiente o atendimento à saúde, o Poder Judiciário vem sendo acionado frequentemente para garantir esse direito fundamental, especialmente nos casos de medicamentos de elevado valor ou não disponíveis no RENAME. O fenômeno da judicialização da saúde fez despontar diversas discussões jurídicas centrais:
Requisitos para Concessão Judicial de Medicamentos
O STF, no julgamento do RE 566.471/RN (Tema 6 da Repercussão Geral), estabeleceu parâmetros importantes para que o fornecimento de medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS possa ser determinado judicialmente:
1. Comprovação, por laudo médico fundamentado, da necessidade do fármaco e da ineficácia dos integrantes das listas oficiais;
2. Incapacidade financeira do paciente para arcar com o tratamento;
3. Existência de registro do medicamento na Anvisa, salvo em hipóteses excepcionais.
A exigência de laudo médico detalhado e a demonstração da impossibilidade de custeio são requisitos mínimos para evitar a banalização do direito e o comprometimento do orçamento público.
Limites e Riscos ao Administrador Público
O deferimento indiscriminado de medidas judiciais para fornecimento de medicamentos pode gerar graves impactos ao orçamento da saúde, comprometendo políticas públicas baseadas em critérios de eficiência, equidade e efetividade. Por isso, o STF reafirma que a atuação judicial deve ser pautada pela razoabilidade, ponderando o caso concreto sem desorganizar as finanças públicas.
Ademais, compete ao gestor público apresentar eventuais impossibilidades técnicas ou financeiras de cumprimento no processo judicial, ensejando, por exemplo, pedidos de modulação de efeitos.
Ações Mais Comuns: Procedimentos e Competência
O paciente que busca o acesso a medicamentos pelo SUS geralmente ingressa com ações de natureza condenatória (obrigação de fazer), que podem tramitar nos Juizados Especiais da Fazenda Pública (para causas de menor valor) ou nas Varas da Fazenda Pública.
Com a responsabilidade solidária do Estado, o polo passivo admite a presença de Município, Estado e União, conjunta ou isoladamente. A concessão de tutelas provisórias (artigo 300 do CPC) é fundamental diante do risco iminente à vida e à saúde dos autores, autorizando a antecipação dos efeitos da sentença.
Cabe destacar que a concessão de medicamentos não previstos nos protocolos do SUS costuma ser tema de intensa discussão pericial e de produção probatória, destacando a necessidade de atuação técnica especializada.
Embate entre Direito Individual e Políticas Públicas Coletivas
O fornecimento judicializado de medicamentos envolve o embate entre o direito fundamental individual do paciente e a realização de políticas públicas organizadas e racionalizadas. A jurisprudência majoritária, ainda assim, tem adotado posição favorável à concessão em caso de demonstração de necessidade crítica, mitigando a discricionariedade administrativa em nome do princípio da dignidade da pessoa humana.
No entanto, existe uma tendência crescente da jurisprudência de exigir que o demandante tente, primeiramente, esgotar as vias administrativas de fornecimento (“princípio da subsidiariedade”), reduzindo a judicialização para casos comprovadamente excepcionais.
Responsabilidades e Riscos Profissionais na Atuação Advocática
A atuação nessa seara exige rigor técnico e profundo conhecimento das teses jurídicas, bem como da legislação e dos precedentes dos tribunais. Advogados que militam nessa área precisam dominar os aspectos técnicos do SUS, bem como compreender os impactos orçamentários e éticos do tema. O aprofundamento teórico-prático é fundamental para evitar prejuízo ao cliente, à coletividade e para minimizar riscos de responsabilização funcional.
Para quem deseja se aprofundar nesse campo tão dinâmico, é altamente recomendável considerar uma formação específica, como a Pós-Graduação em Direito Médico e da Saúde, que capacita o profissional para lidar com todas as nuances do Direito Sanitário, médico e das políticas públicas de saúde.
Conclusão
O fornecimento de medicamentos pelo SUS representa um dos pontos nevrálgicos na relação entre as necessidades individuais do cidadão e a gestão das políticas públicas. Advogados, juízes e gestores enfrentam diariamente os desafios jurídicos, éticos e econômicos inerentes ao tema.
A correta aplicação dos dispositivos constitucionais, infraconstitucionais e dos precedentes jurisprudenciais é indispensável não apenas para garantir o direito à saúde, mas também para salvaguardar a integridade do sistema público de saúde.
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Insights Finais
O avanço do Direito à Saúde tem transformado a atuação jurídica e impôs ao operador do direito o compromisso de constante atualização e aprofundamento. Se por um lado o ordenamento jurídico brasileiro faculta ao cidadão o acesso judicial a prestações de saúde, por outro, desafia profissionais a equilibrarem rigor jurídico, conhecimento técnico e responsabilidade social.
Perguntas e Respostas Frequentes
1. Quais são os requisitos para a obtenção judicial de um medicamento pelo SUS?
É necessário apresentar laudo médico detalhado comprovando a necessidade do medicamento, a ineficácia dos disponíveis no SUS, a incapacidade financeira do paciente e o registro do medicamento na Anvisa.
2. O paciente pode escolher contra qual ente federativo ajuizar a ação?
Sim, a responsabilidade é solidária, podendo o autor demandar União, Estado ou Município, juntos ou separados.
3. Medicamentos não registrados na Anvisa podem ser concedidos judicialmente?
Regra geral, não. Contudo, em situações excepcionais e devidamente fundamentadas, o Judiciário pode flexibilizar essa exigência.
4. Tutelas de urgência são comuns nesse tipo de processo?
Sim, devido ao risco de dano irreparável à saúde, é frequente o deferimento de tutelas de urgência para garantir o acesso imediato ao tratamento.
5. Qual o impacto dessa judicialização para a administração pública?
O fornecimento judicializado pode impactar significativamente o orçamento público e desorganizar as políticas de saúde, razão pela qual o Judiciário busca ponderar o direito individual frente ao coletivo.
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Acesse a lei relacionada em Lei nº 8.080/1990
Este artigo teve a curadoria da equipe da Legale Educacional e foi escrito utilizando inteligência artificial a partir do seu conteúdo original disponível em https://www.conjur.com.br/2025-nov-03/obrigatoriedade-de-fornecimento-de-farmacos-a-pacientes-do-sus/.