Discriminação nas Relações de Trabalho e a Vedação à Consulta de Antecedentes Criminais
A Constituição Federal de 1988 consagra em seu artigo 5º o princípio da igualdade, vedando qualquer forma de discriminação, seja direta ou indireta, em razão de raça, cor, sexo, origem ou outros critérios que atentem contra a dignidade da pessoa humana. No contexto trabalhista, essa vedação é reforçada pelo artigo 7º, inciso XXX, que proíbe diferenças salariais ou de critérios de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil, ampliando a proteção contra práticas discriminatórias.
Quando se fala em exigência ou consulta de antecedentes criminais de candidatos a vagas de emprego, a questão se cruza com um ponto central do Direito do Trabalho e dos Direitos Humanos: a proteção do trabalhador contra atos discriminatórios que não guardem relação direta com as funções a serem desempenhadas. Tal prática, em regra, não é legítima, salvo em hipóteses específicas autorizadas por lei, dada a presunção de inocência prevista no artigo 5º, inciso LVII, da Constituição.
Base Legal: Limites da Exigência de Antecedentes
No âmbito infraconstitucional, a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) não impõe aos trabalhadores a obrigação de apresentar antecedentes criminais, exceto quando a natureza do cargo exige idoneidade moral específica prevista em lei. É o caso, por exemplo, de funções em segurança privada (Lei 7.102/1983), transporte de valores ou situações envolvendo o cuidado direto com crianças, idosos ou pessoas com deficiência.
O Tribunal Superior do Trabalho e demais tribunais têm reiterado que a exigência indiscriminada da certidão de antecedentes, sem fundamentação na função contratada, afronta não apenas a dignidade humana, mas também o direito ao trabalho e à não discriminação — jurisprudência que se alinha a tratados internacionais ratificados pelo Brasil, como a Convenção nº 111 da Organização Internacional do Trabalho (OIT).
Princípio da Presunção de Inocência e Direito ao Esquecimento
Uma dimensão relevante dessa discussão é o conflito aparente entre o interesse do empregador em mitigar riscos e a tutela do direito fundamental à presunção de inocência, segundo a qual ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória.
Além disso, adquire relevância o chamado direito ao esquecimento, que, embora não pacificado na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, encontra respaldo em princípios constitucionais de reintegração social do apenado e na Lei de Execução Penal (Lei 7.210/1984), que visa facilitar o retorno ao convívio social e ao mercado de trabalho.
Situações de Exceção: Quando a Exigência Pode Ser Legítima
Há funções para as quais a exigência de antecedentes criminais é legítima e proporcional, por exemplo, profissionais que manipulem substâncias controladas, exerçam cargos de vigilância patrimonial armada, transporte de cargas de alto valor ou ocupações na administração pública quando assim o cargo público em concurso aberto exigir.
Nesses casos, a exigência decorre de norma legal específica, que estabelece a idoneidade moral como requisito objetivo para o desempenho da função. Mesmo assim, a solicitação deve estar restrita ao período pertinente e de forma não abusiva, sob pena de nulidade e possível indenização por danos morais.
Danos Morais e Repercussões Jurídicas
O empregador que insiste na prática discriminatória de exigir antecedentes sem justificativa legal pode ser compelido a indenizar o trabalhador pelos danos morais sofridos. O cálculo dessa indenização leva em conta a gravidade da ofensa, o grau de culpa, a repercussão social do ato e a condição econômica do ofensor.
Além disso, a discriminação na contratação pode gerar não só condenações individuais, mas também ações civis públicas ajuizadas pelo Ministério Público do Trabalho, com pedidos de indenização por dano moral coletivo e imposição de obrigações de não fazer.
Proteção de Dados Pessoais e Antecedentes Criminais
Com a entrada em vigor da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (Lei 13.709/2018 — LGPD), a coleta e o tratamento de dados sobre antecedentes criminais ganharam nova limitação. A legislação dispõe que o tratamento desses dados sensíveis somente poderá ocorrer nos casos autorizados por lei ou com consentimento específico e destacado do titular, desde que para finalidades legítimas e determinadas.
A LGPD, no artigo 11, estabelece regras rígidas para o tratamento de dados pessoais sensíveis, categorizando informações sobre antecedentes como de altíssima proteção. Isso cria uma sobreposição de normas protetivas que reforça a vedação à exigência indiscriminada de certidões criminais.
Um aprofundamento seguro nesse tema exige a compreensão articulada entre Direito do Trabalho, Direito Constitucional, Direito Penal e a proteção de dados, áreas intimamente relacionadas e abordadas de forma avançada em programas como a Pós-Graduação em Direito Penal e Processo Penal.
O Papel da Jurisprudência na Conformação do Tema
O entendimento consolidado dos tribunais superiores brasileiros indica uma tendência de proteger integralmente o direito ao trabalho e à não discriminação, afastando práticas baseadas em antecedentes sem vínculo com as atividades desempenhadas. Decisões recentes têm considerado ilícito o ato de investigar a vida pregressa de forma irrestrita, mesmo por meio de empresas terceirizadas.
Julgados destacam ainda que a consulta a bancos de dados criminais sem autorização do candidato viola direitos de personalidade e pode ensejar reparação. Essa jurisprudência cumpre papel de uniformizar interpretações e orientar empregadores e advogados sobre a conduta adequada.
A Prática Recomendada para Empresas e Advogados
Para evitar litígios e respeitar os direitos fundamentais, empresas devem reavaliar seus processos seletivos e eliminar exigências genéricas de certidões criminais. Advogados trabalhistas precisam orientar empregadores sobre os limites da lei, aplicando testes de proporcionalidade e adequação para cada caso.
A prudência na elaboração de políticas de recrutamento e a capacitação constante para compreender as nuances da legislação e da jurisprudência evitam responsabilidades e fortalecem a imagem institucional da empresa como empregadora responsável.
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Insights Práticos
A vedação à consulta irrestrita de antecedentes protege direitos fundamentais e garante que o acesso ao trabalho não seja obstruído por barreiras desproporcionais.
O tema exige análise integrada entre normas constitucionais, legislação trabalhista, penal e de proteção de dados.
Empresas e advogados devem estabelecer processos seletivos compatíveis com a lei, evitando práticas que possam ser interpretadas como discriminatórias.
Formação contínua e atualização legislativa são essenciais para manejar adequadamente as situações excepcionais previstas em lei.
A jurisprudência exerce papel fundamental na delimitação de práticas permitidas e na atribuição de responsabilidades.
Perguntas e Respostas
1. Em quais situações a exigência de antecedentes criminais é permitida?
Quando prevista em lei ou quando a natureza da função exija idoneidade moral comprovada, como na segurança privada, no transporte de valores ou no cuidado direto de vulneráveis.
2. A ausência de previsão legal torna sempre ilícita a exigência?
Em regra sim, pois fere o princípio da igualdade e da presunção de inocência, podendo ser considerada prática discriminatória.
3. A LGPD impacta essa exigência?
Sim, pois antecedentes criminais são dados sensíveis e o tratamento dessas informações só pode ocorrer por previsão legal ou consentimento específico para finalidade legítima.
4. O que pode ocorrer se o empregador exigir indevidamente a certidão de antecedentes?
O trabalhador pode buscar indenização por danos morais, e o Ministério Público do Trabalho pode ajuizar ação civil pública por dano moral coletivo.
5. É possível verificar antecedentes por meio de terceiros com consentimento do candidato?
Apenas se houver base legal e finalidade legítima proporcional à função; caso contrário, a prática continua sendo passível de responsabilização.
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Acesse a lei relacionada em Lei nº 13.709/2018
Este artigo teve a curadoria da equipe da Legale Educacional e foi escrito utilizando inteligência artificial a partir do seu conteúdo original disponível em https://www.conjur.com.br/2025-ago-14/consulta-a-antecedentes-de-candidato-e-discriminacao-reafirma-tst/.