A Dosimetria da Pena sob o Olhar da Defesa Técnica: Estratégia, Crítica e Prática
O Alicerce Constitucional: A Individualização como Escudo contra o Arbítrio
A aplicação da sanção penal não pode ser reduzida a uma mera operação aritmética ou burocrática. Ela representa o momento em que o Estado exerce seu ius puniendi sobre a liberdade, o bem jurídico mais precioso após a vida. Para a advocacia criminal de alta performance, a dosimetria deve ser encarada não apenas como uma etapa de cálculo, mas como um campo de batalha onde o princípio da individualização da pena (artigo 5º, XLVI, da CF) atua como um freio ao poder punitivo.
Não basta conhecer as fases; é preciso fiscalizar se a fundamentação é, de fato, axiológica ou apenas um “copia e cola” de modelos pré-fabricados. A proporcionalidade deve ser manejada pela defesa sob a ótica da proibição do excesso (Übermassverbot). A pena deve ser necessária e suficiente, e qualquer centímetro além disso configura abuso estatal que deve ser combatido via recurso.
A Primeira Fase: O Campo Minado do Artigo 59
O artigo 68 do Código Penal adota o sistema trifásico de Nelson Hungria. A primeira fase, focada na pena-base, é onde residem as maiores oportunidades para a defesa técnica reverter injustiças, mas também onde ocorrem os erros mais sutis.
O juiz analisa as oito circunstâncias judiciais do artigo 59. Aqui, o advogado deve ter um olhar cirúrgico:
- Culpabilidade vs. Dolo do Tipo: É crucial não confundir a culpabilidade do artigo 59 com o dolo integrante do tipo penal. A culpabilidade aqui refere-se ao grau de censura social (reprovabilidade) da conduta. Se o magistrado utiliza elementos inerentes ao próprio tipo penal (ex: “agiu com dolo intenso” em um crime que já exige dolo) para elevar a pena-base, ocorre o vedado bis in idem.
- Personalidade e Conduta Social: A defesa deve impugnar veementemente o que chamamos de “psicologia de boteco”. Magistrados frequentemente valoram negativamente a personalidade do réu com frases como “voltada para o crime”, sem qualquer laudo técnico interdisciplinar. Juiz não é psiquiatra. Sem base técnica, essa valoração é nula por falta de fundamentação idônea (Art. 93, IX, CF).
Aprofundamento Estratégico em Direito Penal
Identificar essas nuances exige mais do que a leitura da lei seca; exige o domínio da dogmática penal e da jurisprudência defensiva. O advogado que se limita ao básico aceita condenações evitáveis. Para elevar o nível de sua atuação, recomenda-se uma formação sólida e prática, como a Pós-Graduação em Direito Penal e Processo Penal. É nesse ambiente que se aprende a transformar teoria em liberdade.
A Segunda Fase: Enfrentando a Súmula 231 e a Reincidência
Na segunda fase, incidem as agravantes e atenuantes. O ponto nevrálgico é a Súmula 231 do STJ, que veda a redução da pena abaixo do mínimo legal, mesmo com atenuantes presentes. Embora aplicada massivamente, a defesa técnica não deve aceitá-la passivamente. O artigo 65 do CP diz que as atenuantes “sempre” atenuam a pena. A súmula fere a legalidade estrita. O advogado combativo deve prequestionar a matéria constitucional para, eventualmente, levar a discussão aos tribunais superiores, marcando posição contra essa violação da individualização da pena.
Outro ponto de atenção é o concurso entre a confissão espontânea e a reincidência:
- Regra Geral: O STJ entende que a confissão e a reincidência se compensam integralmente.
- Multireincidência: Se o réu for multireincidente, a compensação automática costuma ser afastada pelos tribunais. Cabe à defesa brigar pela preponderância da confissão (que reflete a personalidade e a postura colaborativa atual) sobre a reincidência (dado objetivo do passado), buscando minimizar o aumento.
A Terceira Fase: Caçando o Bis in Idem
Na fase final, aplicam-se as causas de aumento e diminuição (frações). Aqui, o advogado deve atuar como um “caçador de bis in idem“. É comum que magistrados utilizem um fato na primeira fase (ex: morte da vítima como “consequência do crime”) e o reutilizem na terceira fase ou como qualificadora. O mesmo fato não pode punir o réu duas vezes.
Além disso, a Súmula 443 do STJ é uma ferramenta poderosa: no roubo circunstanciado (e por analogia a outros crimes), o aumento da pena acima da fração mínima exige fundamentação concreta baseada na gravidade do delito, e não mera indicação matemática do número de majorantes.
Retroatividade da Lei Penal Benéfica e a “Lex Tertia”
A retroatividade da lei penal benéfica (novatio legis in melius) é garantia constitucional. Se uma lei nova favorece o réu, ela deve retroagir, inclusive sobre fatos já transitados em julgado (competência do Juízo da Execução, conforme Súmula 611 do STF).
A controvérsia surge na combinação de leis (lex tertia). A Súmula 501 do STJ veda a combinação de leis no tráfico de drogas, proibindo que o juiz crie uma “terceira norma” pegando apenas as partes boas de duas leis. Contudo, a visão crítica da defesa deve sustentar que, se os preceitos são autônomos, a vedação à combinação restringe indevidamente a retroatividade benéfica. Mesmo diante da súmula, é papel da defesa manter a tese viva, buscando distinguir o caso concreto (distinguishing) sempre que possível.
O Papel da Defesa na Revisão da Pena
A revisão da dosimetria é, estatisticamente, uma das maiores fontes de êxito em recursos aos Tribunais Superiores. O advogado não está lá apenas para pedir absolvição, mas para garantir que, em caso de condenação, a pena seja justa e estritamente legal.
Identificar falhas na fundamentação da pena-base, exigir laudos para análise de personalidade, lutar contra a aplicação automática de súmulas desfavoráveis e fiscalizar a dupla punição pelo mesmo fato são deveres do defensor. A advocacia criminal moderna não admite amadorismo.
Especialização como Diferencial Estratégico
O abismo entre o que a lei diz e como os tribunais decidem é onde o advogado especialista atua. Para navegar com segurança nesse terreno acidentado e entregar resultados de excelência, o investimento em conhecimento aprofundado é inegociável. A Pós-Graduação em Direito Penal e Processo Penal oferece o ferramental técnico e a visão estratégica necessários para enfrentar esses desafios e se destacar no mercado forense.
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Insights para a Prática Forense
A dosimetria da pena não é estática; ela respira conforme a evolução jurisprudencial. A tendência de “automatizar” condenações deve ser combatida com técnica refinada. O advogado deve lembrar: o juiz busca a segurança do precedente; a defesa busca a justiça do caso concreto. Argumentos genéricos não derrubam penas; argumentos técnicos, baseados em princípios constitucionais e na correta dogmática (como a distinção entre dolo e culpabilidade), sim.
Perguntas e Respostas
1. O que fazer se o juiz valorar negativamente a “personalidade” sem laudo técnico?
A defesa deve recorrer alegando nulidade da fundamentação (violação ao art. 93, IX, da CF). Juízes não possuem competência técnica para diagnósticos psicológicos. A jurisprudência defensiva aponta que afirmações genéricas como “personalidade voltada ao crime” são inidôneas para exasperar a pena-base.
2. Como atuar diante da Súmula 231 do STJ na prática?
Embora a súmula impeça a redução da pena abaixo do mínimo na segunda fase, o advogado deve arguir a atenuante e pedir expressamente que a pena seja reduzida, prequestionando a violação ao princípio da legalidade e da individualização da pena. Isso mantém a porta aberta para recursos extraordinários, não aceitando passivamente a jurisprudência restritiva.
3. É possível compensar reincidência com confissão em caso de multireincidência?
É mais difícil, mas possível. O STJ tende a negar a compensação integral em casos de multireincidência. A estratégia da defesa é demonstrar que a confissão foi crucial para o deslinde do feito ou que a reincidência não é específica, buscando uma compensação proporcional, ainda que não total.
4. O que é o *bis in idem* na dosimetria e como identificá-lo?
Ocorre quando o Estado pune o réu duas vezes pelo mesmo fato ou circunstância. O exemplo clássico é usar o “dolo intenso” (inerente ao tipo) para aumentar a pena-base na culpabilidade, ou usar uma qualificadora (que já mudou os limites da pena) como circunstância judicial desfavorável sem a devida técnica de deslocamento.
5. Quem aplica a lei mais benéfica se o processo já acabou?
Se a sentença já transitou em julgado, a competência é do Juízo da Execução Penal (Súmula 611 do STF). O advogado deve peticionar diretamente na execução demonstrando o cálculo mais benéfico trazido pela nova lei.
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Acesse a lei relacionada em Código Penal (Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940)
Este artigo teve a curadoria da equipe da Legale Educacional e foi escrito utilizando inteligência artificial a partir do seu conteúdo original disponível em https://www.conjur.com.br/2025-dez-12/pl-da-dosimetria-analise-da-proporcionalidade-e-retroatividade-benefica/.