Discricionariedade administrativa é um conceito fundamental do direito administrativo que se refere à margem de liberdade conferida à administração pública para adotar decisões dentro dos limites estabelecidos pela lei. Trata-se da possibilidade de escolha entre diferentes soluções legalmente permitidas, com base na conveniência e na oportunidade, tendo em vista o interesse público e os princípios que regem a atividade administrativa.
Em um Estado de Direito, a administração pública deve atuar sempre conforme a legalidade, ou seja, suas ações devem estar fundamentadas em norma jurídica que as autorize ou determine. No entanto, nem toda norma estabelece comandos rígidos e previamente definidos para que o agente público os execute de forma vinculada, isto é, sem possibilidade de escolha. Existem situações em que a própria lei confere ao administrador certa liberdade para decidir a melhor forma de alcançar o interesse público, dentro dos parâmetros legais. Isso significa que a discricionariedade administrativa não implica arbitrariedade, pois a decisão discricionária deve respeitar o ordenamento jurídico e estar fundada em critérios razoáveis.
A discricionariedade está presente em diversos atos administrativos, como a nomeação para cargos em comissão, a concessão de licenças em determinados casos e a aplicação de sanções administrativas quando a norma concede ao agente público certa margem de escolha em relação à gravidade da pena. Na prática, a atuação discricionária exige que o administrador avalie fatores diversos, incluindo circunstâncias concretas, critérios técnicos, políticas públicas e impactos sociais.
A distinção entre ato discricionário e ato vinculado é essencial para a compreensão da discricionariedade administrativa. No ato vinculado, a administração deve agir de acordo com critérios inteiramente definidos pela norma jurídica, sem margem de escolha. Já no ato discricionário, a lei estabelece determinados parâmetros, mas permite que o administrador decida a melhor maneira de agir dentro desses limites. Isso ocorre porque algumas situações exigem flexibilidade e adaptação à realidade concreta, especialmente em matérias envolvendo políticas públicas e gestão de recursos.
No exercício da discricionariedade, a administração deve observar princípios fundamentais do direito administrativo, como o princípio da razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, eficiência e supremacia do interesse público. Isso significa que, ainda que possua poder discricionário, o agente público não pode tomar decisões de maneira abusiva ou sem fundamentação adequada. O controle da discricionariedade administrativa pode ser realizado pelo Poder Judiciário e pelos órgãos de controle interno e externo, garantindo que as escolhas feitas pelos administradores respeitem os princípios legais e constitucionais.
Apesar da liberdade de decisão conferida ao administrador, há limites objetivos para o exercício da discricionariedade. A Teoria dos Motivos Determinantes estabelece que a motivação apresentada para o ato discricionário vincula a administração, impedindo que a decisão seja tomada com base em justificativas arbitrárias ou ilegais. Além disso, quando a discricionariedade é utilizada de forma abusiva ou desproporcional, pode haver a invalidação do ato pela via judicial.
A modernização da administração pública e a intensificação da atuação dos órgãos de controle têm reduzido significativamente os espaços de discricionariedade absoluta. A evolução da jurisprudência e das interpretações doutrinárias tem apontado para uma leitura mais restritiva do poder discricionário, privilegiando a transparência e o dever de prestação de contas na gestão pública.
Dessa forma, a discricionariedade administrativa é um instrumento necessário para que a administração pública possa atuar com flexibilidade e eficiência na atenção às necessidades da sociedade. Contudo, essa liberdade de escolha não pode ser confundida com ausência de controle, pois a legalidade, os princípios administrativos e o interesse público devem sempre orientar a tomada de decisões dentro da esfera discricionária.