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Cancelamento Abusivo de Planos de Saúde: O que o Advogado deve Saber

Artigo de Direito
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A Abusividade da Rescisão Unilateral de Planos de Saúde em Cursos de Tratamento de Emergência

A intersecção entre a autonomia contratual e a dignidade da pessoa humana

O ordenamento jurídico brasileiro, especialmente sob a ótica do Direito Civil Constitucional, impõe limites claros à autonomia da vontade quando esta colide com direitos fundamentais. No âmbito dos contratos de assistência à saúde, essa tensão se torna evidente quando operadoras optam pela rescisão unilateral do vínculo contratual. Embora a legislação preveja hipóteses para o cancelamento, a aplicação fria da norma não pode se sobrepor ao direito à vida e à integridade física do beneficiário.

A discussão central reside na interpretação sistêmica da Lei nº 9.656/98 em conjunto com o Código de Defesa do Consumidor (CDC) e a Constituição Federal. O contrato de plano de saúde possui uma função social intrínseca. Ele não visa apenas a contraprestação pecuniária, mas a garantia de acesso a serviços essenciais de saúde. Portanto, a análise da licitude de um cancelamento deve ultrapassar as cláusulas contratuais escritas e observar o contexto fático do consumidor no momento da rescisão.

Juristas e advogados que atuam na defesa dos consumidores ou na assessoria de operadoras devem atentar para o fato de que o Poder Judiciário tem consolidado um entendimento protetivo. A vulnerabilidade do paciente, especialmente em situações de emergência, urgência ou internação, cria uma blindagem jurídica temporária contra a resilição do contrato, mesmo que, em tese, existissem motivos contratuais para tal.

O arcabouço legal da rescisão unilateral: Regras e Exceções

A Lei dos Planos de Saúde (Lei nº 9.656/98), em seu artigo 13, parágrafo único, inciso II, estabelece que a suspensão ou a rescisão unilateral do contrato individual ou familiar só pode ocorrer por fraude ou não pagamento da mensalidade por período superior a sessenta dias, consecutivos ou não, nos últimos doze meses de vigência do contrato. Além disso, exige-se a comprovação da notificação do consumidor até o quinquagésimo dia de inadimplência.

No entanto, a complexidade aumenta quando tratamos de planos coletivos ou empresariais. Nesses casos, a jurisprudência, por vezes, admite a resilição imotivada, desde que haja notificação prévia e cumprimento de prazos contratuais. Contudo, essa liberdade contratual não é absoluta. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem firmado posição de que, mesmo em planos coletivos, a rescisão não pode ocorrer se o beneficiário estiver em meio a tratamento médico garantidor de sua sobrevivência ou integridade física.

Para o profissional que deseja se aprofundar nas teses defensivas e na estruturação de argumentos robustos sobre a regulação da saúde suplementar, o estudo continuado é indispensável. Uma formação especializada, como a Pós-Graduação em Direito Médico e da Saúde, oferece as ferramentas dogmáticas necessárias para enfrentar essas questões complexas nos tribunais.

A teoria do fato consumado e a continuidade do tratamento

A doutrina e a jurisprudência aplicam, por analogia e extensão, o princípio da continuidade do tratamento. Se o paciente se encontra em uma situação de risco, como uma gestação de alto risco, tratamento oncológico ou internação em UTI, a operadora é compelida a manter a assistência. A interrupção abrupta nessas condições configura conduta abusiva, violando a boa-fé objetiva prevista no artigo 4.º, III, e artigo 51, IV, do Código de Defesa do Consumidor.

O entendimento é de que a operadora assume os riscos do negócio. Ao aceitar o segurado e receber os prêmios (mensalidades) durante a normalidade, ela não pode se eximir da cobertura justamente no momento em que o sinistro (doença ou condição grave) se materializa de forma crítica. A rescisão nessas circunstâncias é vista como venire contra factum proprium, ou seja, um comportamento contraditório que frustra a legítima expectativa do consumidor.

Responsabilidade Civil e o Dever de Indenizar

Quando a rescisão unilateral ocorre de forma indevida, gerando desamparo ao paciente em momento crítico, nasce o dever de indenizar. A responsabilidade civil das operadoras de planos de saúde é, via de regra, objetiva, fundamentada no artigo 14 do CDC. Isso significa que não é necessário provar a culpa da operadora, bastando a demonstração do dano (material ou moral) e do nexo causal entre a conduta (cancelamento do contrato) e o prejuízo sofrido.

O dano moral, neste contexto, frequentemente é reconhecido como in re ipsa. A própria situação de angústia, aflição e desamparo psicológico causada pela negativa de cobertura ou cancelamento do plano em um momento de fragilidade física é suficiente para caracterizar o abalo moral. Não se trata de mero inadimplemento contratual ou dissabor cotidiano. A ameaça à saúde e à vida atinge diretamente a esfera dos direitos da personalidade.

Quantum indenizatório e caráter punitivo-pedagógico

A fixação do valor da indenização deve observar o binômio reparação-punição. Além de compensar a vítima pelo sofrimento, a condenação deve servir como desestímulo para que a operadora não reincida na conduta abusiva. O Judiciário avalia a capacidade econômica da empresa, a gravidade da ofensa (o risco de vida imposto ao paciente) e a extensão do dano.

Em casos envolvendo gestantes, idosos ou pessoas com doenças crônicas graves, as indenizações tendem a ser majoradas. Isso ocorre devido à hipervulnerabilidade desses consumidores. O advogado deve instruir o processo com laudos médicos detalhados que comprovem a gravidade do quadro clínico e a urgência do tratamento no momento do cancelamento, evidenciando o dolo ou a negligência grave da operadora ao deixar o beneficiário à própria sorte.

Aspectos processuais: A tutela de urgência

Na prática forense, a resposta para o cancelamento indevido precisa ser imediata. O instrumento processual adequado é a ação de obrigação de fazer com pedido de tutela de urgência, baseada no artigo 300 do Código de Processo Civil. A demonstração da probabilidade do direito (fumus boni iuris) e do perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo (periculum in mora) é essencial.

A probabilidade do direito se sustenta na vasta jurisprudência que veda o cancelamento durante tratamento médico. Já o perigo de dano é evidente pela própria natureza da prestação jurisdicional buscada: a saúde. Frequentemente, os juízes determinam o restabelecimento do plano em poucas horas ou dias, sob pena de multa diária (astreintes) robusta, visando garantir a efetividade da decisão liminar.

É crucial que o profissional do Direito saiba manejar os requisitos da petição inicial para obter essa liminar. A falha na demonstração da urgência pode levar ao indeferimento da tutela, obrigando o paciente a aguardar o trâmite processual regular, o que pode ser fatal. O conhecimento detalhado sobre os procedimentos de saúde e a legislação pertinente é o diferencial entre o sucesso e o fracasso da demanda.

Para advogados que desejam dominar não apenas a teoria, mas também a prática processual neste nicho, cursos focados como a Pós-Graduação em Direito Médico e da Saúde são investimentos estratégicos na carreira.

A postura do STJ e a segurança jurídica

O Superior Tribunal de Justiça tem desempenhado um papel uniformizador fundamental. O Tema Repetitivo e súmulas editadas pela corte, como a Súmula 608 (que aplica o CDC aos planos de saúde, salvo os de autogestão), orientam as decisões das instâncias inferiores. No que tange à rescisão durante tratamento, o entendimento é pacífico no sentido de proteger o usuário.

Entretanto, há nuances que o advogado deve observar. A proteção contra a rescisão não significa anistia para inadimplência. O STJ também entende que o beneficiário deve manter a contraprestação. Em casos de rescisão de planos coletivos onde a operadora denuncia o contrato com a empresa estipulante, a operadora deve oferecer ao beneficiário em tratamento a possibilidade de migração para plano individual ou familiar, sem cumprimento de novas carências.

Essa obrigação de oferta de migração é um ponto crucial. Muitas vezes, as operadoras simplesmente cancelam o contrato coletivo e deixam os beneficiários desassistidos. A ausência dessa oferta de portabilidade ou migração é, por si só, uma conduta ilícita passível de reparação e de reversão judicial.

Documentação probatória essencial

Para o sucesso da ação judicial, a instrução probatória deve ser meticulosa. Além do contrato e dos comprovantes de pagamento, é vital anexar o prontuário médico, relatórios que atestem a necessidade de continuidade do tratamento, a notificação de cancelamento (ou a prova da ausência dela) e eventuais protocolos de atendimento administrativo junto à operadora e à Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS).

A prova da “emergência” ou “urgência” é técnica. Não basta alegar; é preciso comprovar sob a ótica médica. Por isso, a interação entre o Direito e a Medicina é tão forte nesta área. O advogado precisa saber ler um laudo médico para extrair dele os elementos jurídicos que fundamentarão o pedido de manutenção do contrato.

A litigância estratégica nesta área exige proatividade. Identificar se o cancelamento foi motivado por “sinistralidade alta” (o que é vedado se configurar seleção de risco) ou se houve falha no dever de informação é tarefa do especialista.

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Insights sobre o tema

A proteção à saúde não é apenas uma cláusula contratual, mas um imperativo constitucional.
A rescisão unilateral durante tratamento de emergência viola a função social do contrato e a boa-fé objetiva.
O dano moral em casos de cancelamento indevido de plano de saúde em situações de risco é presumido (in re ipsa).
A jurisprudência do STJ impõe a manutenção da assistência ou a oferta de migração de plano sem carência para pacientes em tratamento contínuo.
Tutelas de urgência são os instrumentos processuais vitais para garantir a efetividade do direito à saúde nestes casos.

Perguntas e Respostas

1. A operadora pode cancelar o plano de saúde por inadimplência se o paciente estiver internado?
Não. A jurisprudência majoritária entende que, mesmo havendo inadimplência, a operadora não pode interromper a prestação de serviço se o paciente estiver internado ou em tratamento de emergência/urgência, devendo cobrar a dívida pelos meios ordinários sem cessar a assistência imediata à vida.

2. O que caracteriza a rescisão unilateral abusiva em planos coletivos?
Embora planos coletivos tenham regras mais flexíveis de rescisão, ela se torna abusiva se ocorrer sem a devida notificação prévia, se não houver oferta de migração para plano individual sem carência, ou se atingir beneficiários em meio a tratamento médico grave e continuado.

3. Qual é o prazo para notificação do consumidor antes do cancelamento por falta de pagamento?
Em planos individuais ou familiares, a operadora deve notificar o consumidor até o quinquagésimo dia de inadimplência. O cancelamento só pode ser efetivado após 60 dias de atraso (consecutivos ou não) no período de 12 meses.

4. É necessário provar sofrimento psicológico para obter dano moral neste tipo de caso?
Geralmente não. O STJ entende que o cancelamento indevido de plano de saúde em momento de fragilidade do paciente configura dano moral in re ipsa, ou seja, o dano decorre do próprio fato, dispensando prova específica do abalo psíquico.

5. A proteção contra o cancelamento se aplica a qualquer tipo de tratamento?
A proteção é mais robusta e pacífica em casos de tratamentos garantidores da vida ou da integridade física (emergência, urgência, internação, oncologia, gestação de risco). Tratamentos eletivos simples podem não gozar da mesma blindagem contra a rescisão contratual justificada.

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Acesse a lei relacionada em Lei nº 9.656/98

Este artigo teve a curadoria da equipe da Legale Educacional e foi escrito utilizando inteligência artificial a partir do seu conteúdo original disponível em https://www.conjur.com.br/2025-dez-16/plano-deve-indenizar-por-cancelar-contrato-durante-gestacao-de-risco/.

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