A Medida Cautelar de Indisponibilidade de Bens no Processo Eleitoral: Entre o Lawfare e a Defesa Técnica
A intersecção entre o Direito Processual, o Direito Eleitoral e as prerrogativas da advocacia vive hoje um momento de tensão sem precedentes. Vivemos a era da patrimonialização das sanções e do *lawfare*, onde a asfixia financeira do investigado tornou-se uma estratégia processual tão impactante quanto a própria condenação final. Quando tribunais superiores determinam a constrição patrimonial de entes privados, especialmente sociedades de advogados, o debate ultrapassa a mera cautela e toca na sobrevivência da atividade econômica e na paridade de armas.
Entender a dogmática por trás do bloqueio de bens na justiça especializada não é apenas uma necessidade acadêmica, mas uma exigência de sobrevivência para o operador do Direito. A medida de indisponibilidade não deve possuir caráter punitivo antecipado, mas estritamente assecuratório. Contudo, na prática forense, a linha entre garantir o resultado útil do processo e antecipar a pena pecuniária tem se tornado perigosamente tênue.
O Perigo da Aplicação Acrítica do CPC
No âmbito da Justiça Eleitoral, a aplicação subsidiária do Código de Processo Civil (CPC) é a norma. O artigo 300 do CPC é o fundamento padrão para a tutela de urgência. Entretanto, o advogado de alta performance deve estar atento a uma distinção dogmática frequentemente ignorada pelos tribunais: a diferença entre tutela cautelar (assecuratória) e tutela antecipada (satisfativa).
Muitas decisões de bloqueio operam sob uma lógica de satisfação antecipada do erário, o que é inconstitucional antes do trânsito em julgado. A defesa técnica deve invocar rigorosamente o § 3º do artigo 300 do CPC, que veda a tutela de urgência quando houver perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão. No caso de escritórios de advocacia, o bloqueio de capital de giro é, faticamente, uma medida irreversível que pode levar à quebra da banca.
O Fenômeno do “Fishing Expedition” e a Inviolabilidade dos Escritórios
A Lei 8.906/94 (Estatuto da Advocacia) estabelece a inviolabilidade do escritório, uma garantia não do advogado, mas da cidadania. Contudo, a jurisprudência defensiva tem mitigado essa proteção sob o argumento de que ela não é absoluta. O ponto nevrálgico atual não é apenas a investigação do advogado suspeito, mas a prática do Fishing Expedition (pescaria probatória).
Mandados genéricos de busca e apreensão ou ordens de bloqueio global via SISBAJUD em contas de sociedades de advogados invertem a lógica do devido processo legal. Ao atingir a conta da sociedade para investigar um sócio ou um cliente específico, o Estado acaba por devassar o sigilo e o patrimônio de terceiros inocentes (demais clientes e sócios).
Nesse cenário, a atuação da defesa deve ser imediata e cirúrgica:
- Exigir a presença de representante da OAB não apenas no cumprimento do mandado, mas na análise da segregação de bens e dados;
- Demonstrar que a constrição “no atacado” viola o princípio da menor onerosidade ao devedor;
- Combater a presunção de contaminação de todo o patrimônio da banca.
A “Teimosinha” do SISBAJUD e a Asfixia Financeira
Um aspecto prático devastador é a utilização da funcionalidade de reiteração automática de ordens de bloqueio do SISBAJUD, conhecida no calão forense como “Teimosinha”. Essa ferramenta pode manter as contas bloqueadas por trinta dias seguidos, capturando qualquer entrada de recursos, inviabilizando o pagamento de folha salarial e tributos.
A defesa deve impugnar o uso dessa ferramenta em medidas cautelares, argumentando que ela transforma uma medida de garantia em uma expropriação contínua, ferindo a capacidade de manutenção da atividade empresarial (princípio da preservação da empresa).
Compliance e a Prova da Origem Lícita
O ônus da prova, na teoria, é de quem acusa. Na prática das cautelares patrimoniais, ocorre uma inversão brutal. Uma vez bloqueado o bem, cabe ao investigado provar a licitude. Aqui, a advocacia artesanal não basta. É necessário um trabalho de compliance prévio.
Para reverter um bloqueio em Tribunal Superior, “apresentar contratos” é insuficiente. A defesa robusta exige:
- Documentação com lastro de contemporaneidade (reconhecimento de firma na data, e-mails de negociação);
- Trilha bancária inequívoca (TED/DOC coincidente com a nota fiscal);
- Perícia contábil forense para segregar os ativos lícitos dos valores sob suspeita.
Para aprofundar-se nessas estratégias de defesa técnica e *compliance* eleitoral, o estudo especializado é mandatório. A Pós-Graduação em Direito Eleitoral prepara o advogado para enfrentar esse nível de complexidade processual.
A Nova Lei de Improbidade (14.230/21) e seus Reflexos
A esfera da improbidade administrativa dialoga intimamente com a eleitoral. A Lei 14.230/21 trouxe uma mudança de paradigma vital: a tentativa de eliminar a presunção de periculum in mora que vigorava na jurisprudência do STJ.
Hoje, a batalha jurídica reside na aplicação analógica dessas alterações mais benéficas aos processos eleitorais e na sua retroatividade (princípio da retroatividade da lei sancionadora mais branda). A defesa deve sustentar que não basta o indício de irregularidade; o Ministério Público deve demonstrar o risco concreto de dilapidação patrimonial para justificar a medida extrema do bloqueio.
Honorários Advocatícios: Produto de Crime ou Verba Alimentar?
Em investigações de lavagem de dinheiro com conexões eleitorais, a acusação frequentemente tenta caracterizar os honorários recebidos como “produto do crime”, buscando o sequestro (medida penal) em vez do arresto ou indisponibilidade cível.
É fundamental que o advogado conheça a jurisprudência do STF (no espírito da Súmula Vinculante 47) e precedentes que protegem os honorários recebidos de boa-fé. O advogado não tem o dever de investigar a origem do dinheiro do cliente, salvo em casos de dolo evidente de participação na lavagem. A defesa da natureza alimentar dos honorários é a barreira final contra a criminalização do exercício da advocacia.
Dominar essas distinções entre sequestro, arresto, indisponibilidade e as nuances do SISBAJUD é o que separa o advogado generalista do especialista em tribunais superiores.
Quer estar preparado para a advocacia de alta performance e proteger suas prerrogativas? Conheça nosso curso de Pós-Graduação em Direito Eleitoral.
Perguntas e Respostas Frequentes
1. A “Teimosinha” do SISBAJUD pode ser aplicada em bloqueios cautelares eleitorais?
Embora tecnicamente possível, a defesa deve arguir o excesso de execução e o abuso de autoridade. A reiteração automática em fase cautelar (antes da condenação) pode configurar medida desproporcional que inviabiliza a atividade econômica, devendo ser combatida via Agravo ou Mandado de Segurança.
2. Qual a diferença prática entre Indisponibilidade e Sequestro de Bens?
A indisponibilidade é genérica, visando garantir uma futura indenização ao erário (natureza cível/eleitoral). O sequestro (arts. 125 a 132 do CPP) é específico para bens adquiridos com proventos da infração penal. A liberação de bens sequestrados é processualmente mais complexa e exige prova cabal da origem lícita.
3. O bloqueio pode atingir honorários advocatícios já recebidos?
O artigo 833, IV, do CPC define honorários como impenhoráveis (verba alimentar). Contudo, se a acusação alegar que os honorários são “lavagem de dinheiro”, essa proteção é desafiada. A defesa deve provar a efetiva prestação do serviço e a boa-fé no recebimento para desbloquear os valores.
4. Como proteger o escritório de um “Fishing Expedition”?
A melhor defesa é o *compliance* documental rigoroso e a segregação patrimonial. Processualmente, deve-se impetrar medidas para limitar o objeto do mandado ou do bloqueio estritamente aos bens do investigado, preservando os ativos da sociedade e de terceiros.
5. As mudanças na Lei de Improbidade (LIA) se aplicam automaticamente ao Eleitoral?
Não automaticamente. Existe uma intensa disputa jurisprudencial sobre a aplicação analógica e a retroatividade da Lei 14.230/21 no TSE. Cabe ao advogado suscitar a aplicação dos dispositivos mais benéficos, especialmente o fim da presunção de perigo na demora.
Aprofunde seu conhecimento sobre o assunto na Wikipedia.
Acesse a lei relacionada em Lei nº 4.737, de 15 de julho de 1965 – Código Eleitoral
Este artigo teve a curadoria da equipe da Legale Educacional e foi escrito utilizando inteligência artificial a partir do seu conteúdo original disponível em https://www.conjur.com.br/2025-dez-07/tse-retoma-bloqueio-de-bens-de-escritorios-investigados-pela-operacao-fundo-do-poco/.