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Ação Popular: O rigor da prova para liminares

Artigo de Direito
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Ação Popular e a Concessão de Medidas Liminares: O Rigor na Comprovação da Ilegalidade e Lesividade

A Ação Popular representa um dos instrumentos mais nobres e eficazes de exercício da cidadania dentro do ordenamento jurídico brasileiro. Fundamentada no artigo 5º, inciso LXXIII, da Constituição Federal, ela confere a qualquer cidadão a legitimidade para pleitear a anulação de atos lesivos ao patrimônio público, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural.

No entanto, a prática forense revela uma complexidade que vai muito além da simples legitimidade ativa. O manejo deste remédio constitucional exige do profissional do Direito um conhecimento técnico aprofundado, especialmente quando se busca a concessão de tutela de urgência, popularmente conhecida como liminar.

A concessão de medidas liminares em sede de Ação Popular não é um ato automático e tampouco se baseia em meras alegações de insatisfação política ou administrativa. O Poder Judiciário tem consolidado o entendimento de que a suspensão de atos administrativos requer uma demonstração robusta de ilegalidade.

Para advogados e operadores do direito, compreender a barreira probatória necessária para obter uma liminar é essencial. Não basta alegar; é preciso destruir, ainda que em cognição sumária, a presunção de legitimidade e veracidade que reveste os atos da Administração Pública.

A Natureza Jurídica da Liminar na Lei 4.717/65

A Lei nº 4.717/1965, que regula a Ação Popular, prevê expressamente em seu artigo 5º, § 4º, a possibilidade de concessão de liminar para suspender o ato lesivo. Contudo, essa previsão legal deve ser interpretada em consonância com o Código de Processo Civil (CPC), que estabelece os requisitos gerais para as tutelas de urgência.

O profissional deve atentar-se ao fato de que a liminar em Ação Popular possui natureza cautelar ou antecipatória, dependendo do provimento final buscado. O objetivo primordial é evitar que a continuidade do ato impugnado cause danos irreparáveis ou de difícil reparação ao erário ou aos bens protegidos pela ação.

Entretanto, a aplicação do artigo 300 do CPC neste microsistema processual coletivo exige cautela. O juízo de probabilidade do direito (fumus boni iuris) deve ser qualificado. Em demandas que envolvem políticas públicas ou atos administrativos complexos, a “fumaça do bom direito” não pode ser uma mera neblina; deve ser uma evidência clara de violação à ordem jurídica.

O perigo da demora (periculum in mora) também ganha contornos específicos. O risco não é apenas para o autor da ação, mas para a coletividade. O advogado deve demonstrar que a manutenção do ato administrativo gerará um prejuízo concreto e iminente aos cofres públicos ou à moralidade, justificando a intervenção judicial precoce.

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O Desafio da Presunção de Legitimidade dos Atos Administrativos

Um dos maiores obstáculos para a obtenção de uma liminar em Ação Popular reside na presunção de legitimidade, veracidade e legalidade dos atos administrativos. Este atributo do ato administrativo impõe um ônus probatório diferenciado ao autor da ação popular.

Ao analisar um pedido liminar, o magistrado parte do pressuposto de que a Administração Pública agiu de acordo com a lei. Para afastar essa presunção e determinar a suspensão do ato, não bastam indícios frágeis ou narrativas genéricas sobre má gestão.

É imperativo que a petição inicial venha instruída com prova documental que aponte, de plano, a ilegalidade. Se a questão depender de dilação probatória complexa — como perícias contábeis ou de engenharia — é provável que a liminar seja indeferida, pois a ilegalidade não é evidente à primeira vista.

A jurisprudência dos tribunais superiores tem sido rigorosa neste aspecto. A concessão de liminares que paralisam obras públicas, suspendem licitações ou interrompem serviços essenciais sem a devida comprovação de ilegalidade flagrante pode configurar o chamado periculum in mora inverso.

O perigo inverso ocorre quando a concessão da medida liminar causa mais danos à coletividade do que a manutenção do ato impugnado até o julgamento final. O advogado deve, portanto, antecipar-se a esse argumento na sua fundamentação, demonstrando que o verdadeiro risco reside na continuidade da conduta administrativa ilegal.

A Ilegalidade e a Lesividade: O Binômio Necessário

Durante muito tempo, discutiu-se na doutrina e na jurisprudência se, para a procedência da Ação Popular (e consequentemente para a liminar), bastava a ilegalidade do ato ou se era necessária também a comprovação da lesividade (dano).

A Constituição de 1988 ampliou o escopo da ação, incluindo a moralidade administrativa como bem jurídico tutelado autônomo. Isso levou parte da doutrina a defender que a ofensa à moralidade, por si só, já presume a lesividade. No entanto, para fins de liminar, a visão predominante é mais restritiva.

Para convencer o juízo a suspender um ato administrativo liminarmente, a demonstração de um binômio é frequentemente exigida: a ilegalidade do ato (vícios de competência, forma, finalidade, motivo ou objeto) somada à lesividade concreta ou potencial ao patrimônio público.

A simples desconformidade formal, que não gera prejuízo ao erário nem fere mortalmente os princípios da administração, dificilmente sustentará uma medida drástica de suspensão. O advogado deve ser cirúrgico ao vincular a violação da lei ao dano prático que ela acarreta.

Por exemplo, em uma licitação, não basta apontar que um prazo de publicação foi reduzido em um dia se isso não frustrou a competitividade. Para obter a liminar, seria necessário provar que essa ilegalidade formal restringiu o número de participantes e impediu a administração de obter a proposta mais vantajosa, caracterizando assim a lesividade.

Estratégias Processuais para a Instrução do Pedido Liminar

Considerando o rigor na exigência de comprovação de ilegalidade, a instrução da petição inicial em Ação Popular deve ser exaustiva. O advogado não deve guardar “cartas na manga” para a fase de instrução se o seu objetivo é obter a tutela de urgência.

Documentos públicos, editais, contratos administrativos, notas de empenho e pareceres técnicos devem ser analisados minuciosamente. Muitas vezes, a ilegalidade não está no objeto do contrato, mas no procedimento que o antecedeu. A falta de motivação adequada ou o desvio de finalidade são vícios comuns que, se bem documentados, autorizam a concessão da liminar.

Outro ponto crucial é a narrativa fática. O juiz precisa entender a cronologia dos atos administrativos para identificar onde ocorreu o desvio da legalidade. A clareza na exposição dos fatos, aliada à prova documental, é o que permite ao magistrado formar sua convicção sumária com segurança.

Além disso, é fundamental que o profissional esteja atualizado com as teses firmadas pelos tribunais superiores. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) possui vasta jurisprudência sobre o cabimento e os limites da intervenção judicial em políticas públicas via Ação Popular. Invocar precedentes específicos que tratam de situações análogas reforça a tese de que a ilegalidade apontada é reconhecida pelo ordenamento jurídico.

A Responsabilidade do Autor e do Advogado

É importante também abordar a responsabilidade no manejo da Ação Popular. Embora o cidadão esteja isento de custas judiciais e ônus de sucumbência (salvo comprovada má-fé), a litigância temerária pode ser punida.

Para o advogado, a responsabilidade é técnica e ética. Propor uma ação popular baseada em “aventura jurídica”, sem lastro probatório mínimo de ilegalidade, apenas para criar fato político ou embaraçar a administração, é uma prática que enfraquece o instituto e a credibilidade do profissional.

A exigência judicial de comprovação robusta de ilegalidade para a concessão de liminar atua também como um filtro contra o uso predatório da Ação Popular. O Judiciário busca equilibrar o controle social dos atos administrativos com a necessidade de segurança jurídica e eficiência na gestão pública.

Portanto, a atuação na defesa do patrimônio público exige uma postura técnica impecável. Identificar o ato, qualificar a ilegalidade, demonstrar o nexo causal com a lesividade e comprovar a urgência são etapas inafastáveis para o sucesso da demanda.

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Insights sobre o Tema

A análise aprofundada sobre a exigência de comprovação de ilegalidade em liminares de Ação Popular revela tendências importantes do Direito Público contemporâneo.

Primeiramente, observa-se uma deferência (ainda que relativa) do Judiciário às escolhas administrativas, intervenho apenas quando o vício é manifesto. Isso reflete uma preocupação com a separação dos poderes e com as consequências práticas das decisões judiciais (consequencialismo jurídico), trazidas pela nova Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB).

Em segundo lugar, a moralidade administrativa deixou de ser um conceito vago para exigir contornos de juridicidade. Não se anula ato administrativo apenas porque ele parece “imoral” sob uma ótica subjetiva; a imoralidade deve traduzir-se em violação a princípios jurídicos objetivos, como a impessoalidade ou a probidade.

Por fim, a prova na Ação Popular está se tornando cada vez mais técnica. Em um mundo de administração pública complexa e digital, a “ilegalidade” muitas vezes reside em algoritmos, dados orçamentários complexos e regulações setoriais específicas, exigindo do advogado uma capacitação multidisciplinar.

Perguntas e Respostas

1. A simples suspeita de irregularidade é suficiente para obter uma liminar em Ação Popular?
Não. Devido à presunção de legitimidade dos atos administrativos, a jurisprudência exige prova robusta ou, no mínimo, indícios veementes de ilegalidade e lesividade para conceder a medida liminar e suspender o ato. A mera suspeita não satisfaz o requisito do fumus boni iuris.

2. O que é o “periculum in mora inverso” na análise de liminares contra o Poder Público?
É o risco de que a concessão da liminar cause danos maiores à coletividade do que a manutenção do ato impugnado até o julgamento final. Por exemplo, paralisar uma obra essencial de saúde pública por uma irregularidade formal sanável pode ser considerado um perigo inverso, levando ao indeferimento da liminar.

3. É necessária a comprovação de prejuízo financeiro (lesividade) para a concessão da liminar?
Embora haja debates doutrinários, a tendência majoritária para a concessão de liminares é a exigência do binômio ilegalidade + lesividade. Contudo, a lesividade não precisa ser necessariamente financeira; ela pode ser moral (ofensa à moralidade administrativa) ou ao patrimônio histórico/ambiental, desde que comprovada a gravidade da ofensa.

4. Quem tem o ônus da prova na fase inicial da Ação Popular?
O ônus da prova recai sobre o autor da ação (o cidadão). Cabe a ele juntar aos autos, com a petição inicial, os documentos que comprovem a ilegalidade do ato impugnado. A presunção de veracidade dos atos públicos milita a favor da Administração até que se prove o contrário.

5. A não concessão da liminar impede o prosseguimento da Ação Popular?
Não. O indeferimento da liminar significa apenas que o juiz não viu urgência ou prova inequívoca suficiente para suspender o ato imediatamente. A ação seguirá seu rito normal, com citação dos réus, produção de provas e instrução processual, podendo o ato ser anulado na sentença final se a ilegalidade for comprovada posteriormente.

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Acesse a lei relacionada em Lei nº 4.717/1965

Este artigo teve a curadoria da equipe da Legale Educacional e foi escrito utilizando inteligência artificial a partir do seu conteúdo original disponível em https://www.conjur.com.br/2025-dez-17/liminar-em-acao-popular-exige-comprovacao-de-ilegalidade-diz-juiz/.

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