A Vinculação da Oferta e a Estratégia Processual: Da Teoria à Execução Efetiva nas Relações de Consumo
O Direito do Consumidor brasileiro, embora regido por princípios protetivos como a boa-fé objetiva, enfrenta no “front” do Judiciário uma realidade bem mais complexa do que a simples leitura da lei sugere. Para o advogado de alta performance, não basta saber que a oferta vincula o fornecedor; é preciso compreender como blindar a tese contra a jurisprudência defensiva e garantir que a sentença se transforme em dinheiro no bolso do cliente.
Quando uma empresa realiza uma promessa de resultado específico — como a redução garantida de uma dívida — ela atrai para si uma responsabilidade que vai muito além da culpa. No entanto, a frustração dessa expectativa, se mal fundamentada na petição inicial, corre o risco de ser enquadrada pelos tribunais como “mero aborrecimento”. A defesa técnica exige, portanto, não apenas o domínio dos artigos 30 e 35 do CDC, mas uma estratégia processual que antecipe a execução e a caracterização do dano indenizável.
Obrigação de Meio Travestida de Obrigação de Resultado
O ponto nevrálgico da vinculação da oferta (Art. 30 do CDC) reside na natureza jurídica da obrigação. Muitas empresas de consultoria financeira ou “limpa nome” vendem uma obrigação de meio (tentar negociar com o banco) com a roupagem publicitária de uma obrigação de resultado (garantia de desconto ou exclusão do cadastro de inadimplentes).
Para o advogado, essa distinção é a chave da causa. Ao prometer um percentual específico de redução ou um resultado financeiro determinado na publicidade, o fornecedor transforma a natureza da obrigação. A promessa deixa de ser uma estimativa e passa a ser uma cláusula contratual tácita.
- O Pulo do Gato: Ao transmudar a natureza da obrigação via publicidade, a empresa renuncia ao direito de alegar que “fez o possível” ou que o insucesso se deveu a terceiros. Se prometeu o resultado e não entregou, o inadimplemento é absoluto, atraindo a responsabilidade objetiva.
Para aprofundar-se nessas nuances contratuais, o Curso de Direito do Consumidor oferece a base teórica para identificar quando a oferta publicitária supera as cláusulas limitativas de um contrato de adesão.
Publicidade, “Puffing” e o Consumidor Hipervulnerável
O CDC veda a publicidade enganosa (Art. 37). Contudo, a defesa das empresas costuma alegar o puffing — o exagero publicitário tolerável (ex: “o melhor serviço do mundo”).
Aqui, a atuação do advogado deve ser cirúrgica. Em casos de superendividamento ou serviços financeiros, o conceito de puffing deve ser combatido com veemência. Quando o público-alvo é um consumidor hipervulnerável (idosos, analfabetos funcionais, ou pessoas com o mínimo existencial comprometido), qualquer exagero numérico ou promessa de cura financeira não é retórica; é dolo.
A tese jurídica deve demonstrar que a capacidade cognitiva e a fragilidade emocional do cliente foram exploradas para vender uma certeza que, na verdade, era apenas uma possibilidade remota.
Superando a Barreira do “Mero Aborrecimento”: A Prova do Desvio Produtivo
Talvez o maior desafio prático seja convencer o juiz de que a falha na prestação do serviço gerou dano moral. A jurisprudência, muitas vezes baseada na “indústria do dano moral”, tende a tratar o inadimplemento contratual como mero aborrecimento (vide antigas interpretações da Súmula 75 do TJRJ).
Para vencer essa barreira, não basta alegar frustração ou angústia. É necessário provar a via crucis do consumidor. A aplicação da Teoria do Desvio Produtivo do Consumidor exige materialidade probatória:
- Cronogramas de tempo perdido;
- Protocolos de atendimento e gravações;
- Prints de tentativas de solução extrajudicial falhas.
O advogado deve deixar claro que o dano não é apenas a promessa não cumprida, mas o descaso pós-venda e o tempo vital subtraído do consumidor, que foi forçado a desviar de suas competências (trabalho, lazer) para resolver um problema criado pelo fornecedor.
A Atualização Jurisprudencial: Restituição em Dobro sem Má-Fé
Até pouco tempo, a devolução em dobro prevista no parágrafo único do art. 42 do CDC exigia a comprovação de má-fé (dolo) da empresa, segundo entendimento de parte do Judiciário. O texto legal, contudo, nunca exigiu isso.
Felizmente, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), através da Corte Especial no julgamento do EAREsp 676.608/RS, mudou o paradigma. O entendimento atual é de que não se exige a má-fé subjetiva para a repetição em dobro do indébito. Basta que a conduta do fornecedor seja contrária à boa-fé objetiva.
Estratégia: Se a empresa cobrou por um serviço prometendo um resultado impossível (publicidade enganosa), essa conduta é objetivamente contrária à boa-fé. Logo, a petição inicial moderna não deve se contentar com a restituição simples; deve exigir a dobra com base neste precedente vinculante.
Execução e Insolvência: A Teoria Menor (Art. 28, § 5º do CDC)
De nada adianta uma tese perfeita sobre os artigos 30 e 35 se, ao final, não forem encontrados bens para satisfazer a execução. Empresas que prometem milagres financeiros frequentemente são “empresas de fachada” ou ocultam patrimônio.
Aqui reside uma falha comum na advocacia de massa: esquecer a Teoria Menor da Desconsideração da Personalidade Jurídica. Diferente do Código Civil (que exige prova de abuso ou confusão patrimonial), o CDC, em seu artigo 28, § 5º, estabelece que basta a insolvência da pessoa jurídica para que a execução atinja o patrimônio dos sócios.
O advogado deve estar preparado para, diante do primeiro sinal de inexistência de fundos, invocar a Teoria Menor. O consumidor não busca uma sentença para emoldurar, mas a efetiva reparação do prejuízo.
Para dominar os instrumentos de proteção ao patrimônio do cliente vulnerável, o curso sobre Superendividamento na Prática é fundamental para entender o contexto econômico e jurídico dessas demandas.
Perguntas e Respostas Estratégicas
1. A empresa alega que a promessa era apenas uma “estimativa” e que o contrato assinado dizia que “não há garantia”. Como proceder?
A publicidade prevalece sobre o contrato escrito quando é mais favorável ao consumidor. Se a oferta atraiu o cliente com uma certeza (“garantia de redução”), a cláusula contratual posterior que diz o contrário é nula de pleno direito (abusiva), pois viola o dever de informação e a boa-fé objetiva. O que vale é a promessa que captou a vontade do consumidor.
2. Como garantir a devolução em dobro dos valores pagos?
Utilize o precedente do STJ (EAREsp 676.608/RS). Argumente que a cobrança por um serviço baseado em promessa enganosa viola a boa-fé objetiva. Não perca tempo tentando provar o dolo (má-fé subjetiva) da empresa; foque na conduta objetiva que violou os deveres anexos do contrato.
3. A empresa sumiu ou não tem bens. O processo está perdido?
Não. No Direito do Consumidor, aplica-se a Teoria Menor da Desconsideração da Personalidade Jurídica (Art. 28, § 5º, CDC). Basta demonstrar que a personalidade jurídica é um obstáculo ao ressarcimento (insolvência) para redirecionar a execução aos sócios, sem necessidade de provar fraude ou confusão patrimonial.
4. O que é necessário para transformar o “mero aborrecimento” em Dano Moral indenizável?
É preciso comprovar o Desvio Produtivo. Junte à petição uma “linha do tempo” demonstrando todas as horas gastas pelo consumidor tentando resolver o problema administrativamente. Mostre ao juiz que o fornecedor impôs uma calvário desnecessário ao cliente, usurpando seu tempo vital.
5. Como defender um consumidor idoso que caiu no “conto” da redução de dívida?
Invoque a hipervulnerabilidade. Argumente que, para esse perfil de consumidor, técnicas de marketing agressivas e o uso de gatilhos mentais reduzem a capacidade de discernimento, configurando prática abusiva e vício de consentimento. Nesse caso, o “exagero publicitário” deve ser tratado como indução ao erro intencional.
Quer dominar as estratégias processuais e materiais para defender seus clientes com excelência e garantir resultados efetivos? Conheça nosso curso Como Advogar no Direito do Consumidor e transforme sua carreira.
Aprofunde seu conhecimento sobre o assunto na Wikipedia.
Acesse a lei relacionada em Código de Defesa do Consumidor
Este artigo teve a curadoria da equipe da Legale Educacional e foi escrito utilizando inteligência artificial a partir do seu conteúdo original disponível em https://www.conjur.com.br/2025-dez-13/empresa-que-prometeu-reduzir-dividas-em-ate-90-deve-ressarcir-cliente/.