A Era do Direito Eleitoral Digital: Impulsionamento, Inteligência Artificial e Paridade de Armas
A transição dos showmícios para o “palanque algorítmico” redefiniu a advocacia eleitoral. Se antes a batalha se dava pelo tempo de TV, hoje ela ocorre na disputa pela atenção do eleitor na tela do celular, mediada por estratégias de microdirecionamento. O impulsionamento de conteúdo — o ato de pagar plataformas para ampliar o alcance de uma mensagem — tornou-se a ferramenta central dessa nova arena. Contudo, a legislação brasileira, em especial a Lei das Eleições (Lei nº 9.504/1997) e as recentes resoluções do TSE para o pleito de 2024, impõem limites rígidos que separam o marketing arrojado do abuso de poder econômico.
Para o advogado eleitoralista, compreender a letra da lei já não basta. É necessário dominar a hermenêutica da tecnologia. O impulsionamento é legítimo para a promoção positiva, mas a zona cinzenta da prática forense exige uma análise técnica sobre onde termina a liberdade de expressão e onde começa a desestabilização isonômica do pleito.
O Princípio da Paridade de Armas e a Vedação ao Impulsionamento Negativo
O cerne da discussão jurídica sobre impulsionamento não reside na proteção da honra subjetiva do candidato atacado — para isso, existem as esferas cível e penal. No Direito Eleitoral, a vedação ao impulsionamento de conteúdo negativo, prevista no artigo 57-C da Lei nº 9.504/97, visa proteger a higidez do processo eleitoral e a paridade de armas.
A lógica é econômica: permitir que um candidato utilize recursos financeiros para amplificar artificialmente ataques ao adversário criaria um desnível insuperável. Enquanto a crítica orgânica (aquela que viraliza espontaneamente) é protegida pela liberdade de expressão plena, a crítica paga (impulsionada) sofre restrições severas. O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) consolidou o entendimento de que o dinheiro de campanha serve para apresentar propostas e biografias, não para destruir reputações alheias.
A Zona Cinzenta: Propaganda Comparativa ou Ataque Vedado?
Um dos maiores desafios práticos para a assessoria jurídica é distinguir o ataque vedado da propaganda comparativa. A jurisprudência nem sempre é linear. Questiona-se: um candidato pode impulsionar um post dizendo “Eu votei a favor da Lei X, meu adversário votou contra”?
Para uma defesa técnica robusta, é crucial sustentar que a comparação objetiva de gestões ou de históricos legislativos não configura, per se, propaganda negativa. Contudo, o risco é alto. Se a comparação descambar para a ridicularização ou ofensas pessoais, a infração se materializa. O advogado deve atuar como um gestor de riscos, analisando não apenas o texto, mas a semântica e o contexto visual da peça publicitária antes do investimento financeiro.
Novos Desafios: Influenciadores, IA e as Resoluções de 2024
O cenário tornou-se ainda mais complexo com as atualizações normativas para as eleições de 2024, notadamente as alterações na Resolução TSE nº 23.610/2019 promovidas pela Resolução nº 23.732/2024. Dois pontos merecem atenção redobrada:
- Inteligência Artificial e Deepfakes: O uso de IA para criar conteúdo sintético impõe novas camadas de responsabilidade. O impulsionamento de conteúdo manipulado (mesmo que não seja negativo na essência, mas desinformativo) atrai penalidades severas. A utilização de deepfakes para atacar adversários pode configurar não apenas propaganda irregular, mas crime e abuso de poder aptos a cassar mandatos.
- Terceirização via Influenciadores: Uma tática comum e perigosa é a tentativa de burlar a vedação do impulsionamento oficial contratando influenciadores para atacar rivais. A Justiça Eleitoral tem aplicado a responsabilidade por culpa in vigilando ou in eligendo ao candidato beneficiário, desmantelando a tese de que “foi um ato de terceiro desconhecido”.
O Conflito Normativo: Marco Civil vs. Poder de Polícia do TSE
Há uma tensão evidente entre o artigo 19 do Marco Civil da Internet — que estabelece a responsabilidade das plataformas apenas após o descumprimento de ordem judicial — e a postura proativa do TSE. No combate à desinformação e ao impulsionamento irregular, a Justiça Eleitoral tem exercido um poder de polícia digital, exigindo das plataformas (Big Techs) uma fiscalização ativa e remoção célere de conteúdos flagrantemente ilegais.
Para o advogado, isso significa que a estratégia de “esperar a notificação judicial” pode ser fatal. A atuação deve ser imediata, tanto na esfera administrativa junto às plataformas quanto na judicial, municiada de provas robustas. Prints de tela são frágeis; a utilização de atas notariais ou ferramentas de preservação de provas com registro em blockchain é mandatória para garantir a integridade do material probatório.
Estratégias de Defesa: Da Reemolduração ao Princípio da Proporcionalidade
Diante de uma representação por impulsionamento negativo, a defesa técnica não deve se limitar a tentar reemoldurar a crítica como “liberdade de expressão”. Uma advocacia de excelência deve manejar o Princípio da Proporcionalidade.
Ainda que se reconheça a irregularidade do impulsionamento, é fundamental demonstrar, quando cabível, a ausência de gravidade qualitativa ou a inexpressividade do alcance quantitativo da postagem. O objetivo é afastar a configuração de abuso de poder econômico — que leva à cassação e inelegibilidade — restringindo a punição, no máximo, à esfera pecuniária (multa). Salvar o mandato é a prioridade absoluta.
Conclusão
O impulsionamento de conteúdo é uma realidade irreversível, mas navegar por ele exige mais do que criatividade de marketing; exige compliance jurídico rigoroso. O que separa uma campanha vitoriosa de uma cassação prematura é a capacidade da equipe jurídica de interpretar as zonas cinzentas da propaganda comparativa e as novas vedações impostas pela era da Inteligência Artificial.
A advocacia eleitoral moderna é, acima de tudo, preventiva e estratégica. Profissionais que desejam atuar nesse nível de complexidade precisam buscar formação contínua e aprofundada.
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Insights sobre o Assunto
- Paridade de Armas: A vedação ao impulsionamento negativo não visa proteger sentimentos, mas impedir que o poder econômico desequilibre a disputa democrática.
- Propaganda Comparativa: Existe uma linha tênue entre comparar gestões (permitido) e atacar a honra (vedado no impulsionamento). A análise deve ser casuística.
- Inteligência Artificial: As regras de 2024 tornaram o impulsionamento de conteúdo manipulado por IA uma zona de altíssimo risco jurídico.
- Defesa Técnica: Em casos de impulsionamento irregular, a tese da proporcionalidade é vital para evitar a cassação, focando na inexpressividade do alcance para limitar a punição à multa.
- Provas Digitais: Prints simples são insuficientes. A advocacia de ponta utiliza meios de preservação auditáveis (blockchain/ata notarial) para comprovar a materialidade.
Perguntas e Respostas
1. O que diferencia a crítica orgânica do impulsionamento negativo?
A crítica orgânica é feita espontaneamente e é protegida pela ampla liberdade de expressão. O impulsionamento negativo envolve o pagamento para ampliar o alcance dessa crítica. A lei veda o segundo caso para evitar que o poder econômico seja usado para destruir reputações e desequilibrar o pleito.
2. Um candidato pode impulsionar um post comparando seu histórico com o do adversário?
Esta é uma zona cinzenta. Em tese, a propaganda comparativa objetiva é lícita. Contudo, se a comparação descambar para ofensas, ridicularização ou uso de informações descontextualizadas, configurará impulsionamento negativo vedado. A recomendação é extrema cautela e análise jurídica prévia.
3. Como as novas regras sobre Inteligência Artificial afetam o impulsionamento?
As resoluções do TSE para 2024 exigem transparência total no uso de IA. O impulsionamento de “deepfakes” ou conteúdo manipulado para criar estados mentais falsos no eleitorado é gravemente punido, podendo configurar abuso de poder e uso indevido dos meios de comunicação.
4. O candidato é responsável se um influenciador impulsionar ataques contra seu adversário?
Sim, pode ser responsabilizado. A Justiça Eleitoral pode entender que houve terceirização irregular da propaganda ou aplicar a responsabilidade por culpa in vigilando (falha no dever de vigiar) ou in eligendo (má escolha de seus apoiadores/contratados), especialmente se houver vínculo comprovado ou benefício eleitoral evidente.
5. Qual a melhor estratégia de defesa se o impulsionamento irregular já ocorreu?
Além de discutir o teor da mensagem, a defesa deve focar no Princípio da Proporcionalidade. Deve-se demonstrar que, mesmo que tenha havido erro, o alcance e a gravidade da conduta não foram suficientes para comprometer a legitimidade da eleição, buscando afastar a cassação do mandato e restringir a pena à multa.
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Acesse a lei relacionada em Lei nº 9.504/1997
Este artigo teve a curadoria da equipe da Legale Educacional e foi escrito utilizando inteligência artificial a partir do seu conteúdo original disponível em https://www.conjur.com.br/2025-dez-09/candidatos-sao-multados-por-causa-de-impulsionamento-negativo/.