Plantão Legale

Carregando avisos...

Princípio da Correlação: Limites da Sentença Penal

Artigo de Direito
Getting your Trinity Audio player ready...

O Princípio da Correlação entre a Acusação e a Sentença no Processo Penal: Teoria e Estratégia Defensiva

A estrutura do processo penal brasileiro, alicerçada no sistema acusatório, exige uma rigorosa separação entre as funções de acusar, defender e julgar. Para além da teoria, essa divisão é a garantia de que o magistrado se manterá equidistante e imparcial. Nesse contexto, o princípio da correlação (ou congruência) atua como uma trava de segurança contra o arbítrio: o juiz não pode julgar fatos distintos daqueles imputados na denúncia ou queixa-crime.

A regra de ouro é que a sentença deve manter estrita correspondência com a narrativa fática da peça inicial. O réu defende-se dos fatos, e não da capitulação jurídica. Se o Estado-Juiz condena com base em circunstâncias não descritas na acusação, ocorre uma ruptura do contraditório e da ampla defesa, gerando nulidade. Contudo, para a advocacia criminal de excelência, compreender o básico não basta; é preciso dominar as nuances processuais que separam uma defesa passiva de uma atuação estratégica.

Distinção entre Fatos e Capitulação Jurídica

O operador do Direito deve ter clareza solar sobre a diferença entre a alteração da base fática e a simples mudança na classificação legal. Vigora o brocardo narra mihi factum dabo tibi ius (narra-me o fato e te darei o direito).

Se a denúncia descreve que o agente subtraiu bem alheio mediante violência, mas capitula o crime como furto (art. 155, CP), o juiz pode condenar por roubo (art. 157, CP), pois o fato “violência” estava descrito. O problema reside quando o juiz reconhece um fato não narrado. A defesa eficiente não se preocupa apenas com o artigo de lei citado ao final da denúncia, mas faz uma varredura minuciosa na descrição histórica do crime, pois é ela que limita o poder de julgar.

Emendatio Libelli: Cuidado com a “Ausência de Prejuízo”

O instituto da Emendatio Libelli (art. 383 do CPP) permite que o juiz, sem modificar a descrição do fato, atribua-lhe definição jurídica diversa. A doutrina clássica costuma afirmar que isso não gera prejuízo à defesa, pois os fatos permaneceram inalterados. Essa visão, contudo, pode ser uma armadilha na prática forense.

A reclassificação jurídica, embora mantenha os fatos, pode alterar drasticamente o cenário processual e as garantias do réu. Veja os riscos:

  • Competência: A nova capitulação pode deslocar a competência da Justiça Comum para o Juizado Especial Criminal ou para o Tribunal do Júri;
  • Institutos Despenalizadores: A mudança do tipo penal pode tornar cabível a Suspensão Condicional do Processo (art. 89 da Lei 9.099/95) ou o Acordo de Não Persecução Penal (ANPP), que antes eram vedados pela pena do crime original.

Portanto, ocorrida a Emendatio Libelli, não basta aceitar a condenação pelo “novo crime”. É dever do magistrado abrir prazo para que a defesa requeira os benefícios legais cabíveis à nova capitulação, sob pena de nulidade absoluta.

Mutatio Libelli e o Xadrez Processual

Diferente da simples correção de tipificação, a Mutatio Libelli (art. 384 do CPP) ocorre quando, durante a instrução, surgem provas de uma circunstância elementar não contida na denúncia. Aqui, a correlação é quebrada por um fato novo.

O procedimento exige que o Ministério Público adite a denúncia para incluir esse fato, reabrindo-se o prazo para a defesa e para a produção de provas. O ponto crucial, muitas vezes ignorado, é a inércia ou recusa do Ministério Público.

Se o juiz entende que há um fato novo (mais grave) e remete os autos ao MP para aditamento, mas o Promotor se recusa a aditar (insistindo na acusação original), aplica-se por analogia o mecanismo do art. 28 do CPP (remessa ao Procurador-Geral). Se a chefia do MP insistir que não há fato novo, o juiz está vinculado e não pode condenar pelo fato novo. O juiz não pode atuar como acusador supletivo. Entender esse fluxo é vital para evitar condenações ilegais.

Dominar essas estratégias é o foco da Pós-Graduação em Direito Penal e Processo Penal, que prepara o advogado para agir nesses momentos de tensão processual.

O Limite nos Tribunais: A Súmula 453 do STF

Um erro comum na estratégia recursal é pedir a nulidade da sentença por violação à correlação sem observar o cenário da segunda instância. É fundamental conhecer a Súmula 453 do STF.

Essa súmula estabelece que não se aplica à segunda instância o art. 384 do CPP. O que isso significa na prática?

  • Se o processo chega ao Tribunal e os Desembargadores percebem que há um fato novo (crime mais grave) que não foi descrito na denúncia, eles não podem baixar o processo para que o MP adite a denúncia;
  • Eles também não podem condenar o réu pelo crime mais grave com base nesse fato não descrito.

Nesse cenário, a estratégia da defesa não deve ser pedir a anulação para “consertar” o processo (o que daria chance à acusação de se corrigir), mas sim buscar a absolvição ou a manutenção da condenação pelo crime menos grave, pois o Tribunal está de mãos atadas para agravar a situação fática do réu.

Sentenças Ultra Petita e a Necessidade de Rigor

No processo penal, a sentença extra petita (que julga fato diverso) é nula. Já a sentença ultra petita ocorre quando o juiz condena pelo fato narrado, mas reconhece qualificadoras ou causas de aumento não descritas.

A defesa deve estar atenta não apenas às elementares do tipo, mas também às agravantes genéricas. Embora haja debate jurisprudencial, a defesa técnica deve impugnar o reconhecimento de qualquer circunstância que agrave a pena e que não tenha sido minimamente descrita na peça acusatória. A “surpresa” na dosimetria da pena viola o contraditório tanto quanto a surpresa na tipificação do crime.

Consequências e a Súmula 160 do STF

Por fim, a violação ao princípio da correlação gera nulidade. Contudo, o sistema de nulidades deve ser manejado com inteligência. A Súmula 160 do STF é a guardiã da defesa na fase recursal: o Tribunal não pode reconhecer nulidade em prejuízo do réu se não houver recurso expresso da acusação nesse sentido.

Isso significa que, se o MP não recorreu reclamando que a sentença foi citra petita (julgou menos do que deveria) ou que houve erro na correlação, o Tribunal não pode, de ofício, anular o processo para prejudicar o acusado.

O princípio da correlação não é apenas uma formalidade; é a fronteira entre o devido processo legal e a inquisitoriedade. Identificar quando o juiz cruza essa linha, seja sutilmente na dosimetria ou explicitamente na condenação, exige preparo técnico apurado.

Para transformar esse conhecimento teórico em prática de defesa criminal de alto nível, convidamos você a conhecer a Pós-Graduação em Direito Penal e Processo Penal da Legale, onde dissecamos a jurisprudência e a estratégia por trás dos artigos de lei.

Aprofunde seu conhecimento sobre o assunto na Wikipedia.

Acesse a lei relacionada em Código de Processo Penal (Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941)

Este artigo teve a curadoria da equipe da Legale Educacional e foi escrito utilizando inteligência artificial a partir do seu conteúdo original disponível em https://www.conjur.com.br/2025-dez-09/juiz-condena-alem-do-pedido-feito-pelo-mp-na-denuncia-e-tj-mg-anula-sentenca/.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *