A Dinâmica da Sucessão Empresarial Irregular: Entre a Celeridade e a Segurança Jurídica na Execução
A recuperação de crédito no sistema jurídico brasileiro é um terreno árido, onde a efetividade da execução colide frequentemente com manobras de ocultação patrimonial. Uma das estratégias mais insidiosas é o encerramento informal das atividades de uma pessoa jurídica e a subsequente abertura de uma nova empresa — muitas vezes no mesmo endereço e ramo — para continuar o negócio livre do passivo anterior. Esse fenômeno, a sucessão empresarial irregular, gera debates processuais intensos e exige do advogado uma visão técnica aguçada sobre a forma correta de responsabilizar a nova entidade.
A discussão central reside na necessidade ou dispensa da instauração do Incidente de Desconsideração da Personalidade Jurídica (IDPJ) para incluir a empresa sucessora no polo passivo. Embora o Código de Processo Civil de 2015 tenha trazido o IDPJ como regra para garantir o contraditório prévio (Art. 133), a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem diferenciado a desconsideração da figura da sucessão empresarial. Contudo, essa distinção, apesar de dogmaticamente correta, esconde riscos processuais que não podem ser ignorados na prática forense.
A Zona Cinzenta: Sucessão Irregular versus Desconsideração
A sucessão empresarial, em sua forma regular (Art. 1.146 do Código Civil), pressupõe a transferência formal de ativos e passivos. Já a sucessão irregular ocorre nas sombras: caracteriza-se pela confusão patrimonial e pela continuidade da exploração econômica sob nova roupagem jurídica, visando fraudar credores.
Embora tecnicamente distintas, na prática, a linha que separa a “confusão patrimonial” (requisito para desconsideração via Art. 50 do CC) da “sucessão de fato” é tênue. O advogado deve estar atento:
- Desconsideração da Personalidade Jurídica: Visa suspender a autonomia patrimonial para atingir sócios ou outras empresas do grupo, pressupondo o abuso da personalidade. Exige, via de regra, o IDPJ.
- Sucessão Empresarial: Foca na transferência da titularidade do fundo de comércio. A sucessora não é uma terceira, mas a continuadora da devedora. Por isso, parte da jurisprudência admite o redirecionamento direto.
Entender essas nuances é essencial, e o estudo detalhado sobre o Incidente de Desconsideração da Personalidade Jurídica permite ao advogado distinguir os institutos. No entanto, apostar todas as fichas apenas na tese da sucessão pode ser perigoso.
O Risco Processual e a Estratégia “Ad Cautelam”
O redirecionamento da execução sem IDPJ é sedutor pela celeridade. Contudo, ele flerta com o risco de nulidade. Muitos magistrados e tribunais estaduais, zelosos pelo Artigo 133 do CPC e pelo princípio da vedação à decisão surpresa (Art. 10 do CPC), podem indeferir o pedido direto ou, pior, anular os atos constritivos anos depois por cerceamento de defesa.
Para mitigar esse risco, a estratégia mais segura para o credor não é ignorar o IDPJ, mas utilizá-lo de forma subsidiária. A petição deve ser estruturada pedindo:
- O reconhecimento da sucessão empresarial e o redirecionamento imediato (baseado na instrumentalidade das formas e precedentes do STJ);
- Subsidiariamente, caso o juízo entenda necessário, a instauração do IDPJ, evitando-se o indeferimento liminar e a preclusão.
Dessa forma, combate-se a fraude sem deixar o processo vulnerável a nulidades futuras.
A Prova Diabólica e a Investigação Patrimonial
Para que o magistrado dispense o IDPJ e defira o redirecionamento direto, o acervo probatório deve ser contundente. Alegações genéricas são ineficazes. O advogado enfrenta aqui um ciclo complexo: muitas vezes é difícil provar a sucessão sem quebra de sigilo, e o juiz não defere a quebra sem prova robusta da sucessão.
Indícios superficiais como “coincidência de endereço” podem não bastar, especialmente quando fraudadores utilizam “laranjas” profissionais ou escritórios virtuais (coworkings). A instrução exige uma investigação patrimonial profunda:
- Cruzamento de dados fiscais e bancários (quando acessíveis);
- Relatórios de inteligência que demonstrem a migração de clientela e funcionários;
- Provas de que a nova empresa utiliza o mesmo maquinário ou estoque (“trespasse de fato”).
A atuação estratégica nesse momento requer conhecimento aprofundado, muitas vezes obtido em cursos como uma Pós-Graduação em Direito Civil e Processual Civil.
O Contraditório Diferido e a Responsabilidade do Credor
A tese do redirecionamento direto baseia-se no contraditório diferido: a sucessora é incluída, tem bens constritos e se defende posteriormente via Embargos ou Exceção de Pré-Executividade. Embora acelere a execução, isso transfere um risco enorme para o credor.
Se, ao final, a empresa incluída provar que não houve sucessão (por exemplo, provando ser uma adquirente de boa-fé que apenas comprou ativos isolados), o credor poderá ser responsabilizado civilmente pelos danos causados pela constrição indevida que inviabilizou a operação de um terceiro legítimo. A “economia processual” pode se transformar em prejuízo indenizatório. Portanto, a certeza sobre a fraude deve ser absoluta antes do pedido.
Meios de Defesa e a Boa-Fé
Do ponto de vista da defesa, a empresa alvo deve demonstrar a total autonomia e a ausência de transferência do fundo de comércio. É crucial lembrar do Artigo 1.146 do Código Civil: a responsabilidade por dívidas anteriores depende da contabilização regular no caso de trespasse formal. Na sucessão irregular, a presunção é de má-fé, mas a defesa pode e deve comprovar a origem lícita e independente de seu capital e gestão.
Insights Práticos para a Advocacia
A distinção entre sucessão e desconsideração não é apenas semântica; ela define a velocidade da execução, mas também o nível de segurança jurídica do procedimento.
- Para o Credor: Não confie cegamente na dispensa do IDPJ. Use a tese do redirecionamento direto com robustez probatória, mas mantenha o pedido de IDPJ como “plano B” na mesma peça. Invista em inteligência prévia para não atirar no escuro.
- Para a Defesa: Em operações de compra de ativos ou constituição de novas empresas, a due diligence é vital. Documente a origem dos recursos e a independência da clientela para afastar a presunção de sucessão irregular.
A jurisprudência está evoluindo para um modelo pragmático, onde a realidade dos fatos se sobrepõe às formalidades, mas o respeito ao devido processo legal continua sendo o escudo contra arbitrariedades.
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Perguntas e Respostas
1. O redirecionamento direto da execução por sucessão empresarial é aceito por todos os juízes?
Não. Embora existam precedentes favoráveis no STJ (como no REsp 1.924.470/SP), muitos magistrados de primeira instância e tribunais estaduais exigem o IDPJ para evitar nulidades por cerceamento de defesa, baseando-se no Art. 133 do CPC.
2. Qual o risco de pedir apenas o redirecionamento direto sem mencionar o IDPJ?
O risco é o indeferimento do pedido ou a anulação futura de todos os atos processuais contra a sucessora, fazendo o credor perder tempo precioso e, possivelmente, a oportunidade de encontrar bens, já que a fraude pode ser aprimorada nesse intervalo.
3. O que diferencia a aquisição de ativos da sucessão empresarial?
A sucessão empresarial envolve a transferência do fundo de comércio (o negócio em si, clientela, marca, organização). A mera aquisição de bens isolados (ex: comprar uma máquina usada) não gera sucessão de dívidas, salvo em questões trabalhistas e tributárias específicas ou se comprovada fraude.
4. Como a empresa sucessora exerce o contraditório se não houver IDPJ prévio?
O contraditório é diferido. A empresa é incluída no polo passivo, citada e sofre constrições. Somente então ela apresenta sua defesa (via Embargos à Execução ou Exceção de Pré-Executividade).
5. É possível responsabilizar o credor se a sucessão não for comprovada?
Sim. Se a execução for redirecionada indevidamente e causar danos à empresa (como bloqueio de contas que inviabilize a folha de pagamento), e ficar provado que não houve sucessão, o credor pode responder por perdas e danos.
Aprofunde seu conhecimento sobre o assunto na Wikipedia.
Acesse a lei relacionada em Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/2015)
Este artigo teve a curadoria da equipe da Legale Educacional e foi escrito utilizando inteligência artificial a partir do seu conteúdo original disponível em https://www.conjur.com.br/2025-dez-08/stj-dispensa-idpj-para-redirecionar-execucao-em-caso-de-sucessao-irregular/.