Plantão Legale

Carregando avisos...

Energia Nuclear no Brasil: Lei, Risco e Licenciamento

Artigo de Direito
Getting your Trinity Audio player ready...

A discussão sobre fontes de energia transcende a mera engenharia ou economia política. Para o operador do Direito, o setor energético representa um vasto campo de atuação, repleto de normas constitucionais, administrativas e ambientais que se entrelaçam. A energia nuclear, especificamente, ocupa um lugar singular no ordenamento jurídico brasileiro. Ela não é apenas mais uma modalidade de geração de eletricidade, mas um tema de segurança nacional, monopólio estatal e riscos ambientais severos.

Compreender a estrutura jurídica que sustenta a atividade nuclear no Brasil exige uma análise profunda da Constituição Federal de 1988 e da legislação infraconstitucional atualizada. O texto constitucional foi meticuloso ao tratar do assunto, estabelecendo competências exclusivas e regimes de responsabilidade diferenciados. O advogado que pretende atuar em áreas regulatórias, ambientais ou de infraestrutura precisa dominar essas nuances. A superficialidade aqui pode custar caro, dada a magnitude dos interesses e dos riscos envolvidos.

O Monopólio da União e as Novas Fronteiras de Mercado

O ponto de partida para qualquer análise jurídica sobre o tema é o artigo 21, inciso XXIII, da Constituição Federal. O constituinte originário estabeleceu que compete à União explorar os serviços e instalações nucleares de qualquer natureza. Este dispositivo consagra o monopólio estatal sobre a atividade. Diferentemente de outras fontes de energia, como a eólica ou a solar, que permitem ampla participação da iniciativa privada, o átomo permanece sob a tutela estrita do Estado brasileiro.

Contudo, o operador do direito atento deve olhar além da letra fria da lei. Embora a geração de energia nucleoelétrica permaneça sob controle federal inalienável, o mercado pressiona por inovações. A Emenda Constitucional nº 49/2006 já flexibilizou o monopólio para radioisótopos de meia-vida curta. Atualmente, discute-se no cenário jurídico (lex ferenda) a viabilidade de parcerias privadas para a operação de SMRs (Small Modular Reactors) e a expansão da exploração mineira de urânio através de modelos de consórcio com as Indústrias Nucleares do Brasil (INB). O advogado deve estar preparado para essas futuras modelagens contratuais.

O Regime de Responsabilidade Civil: Constituição vs. Convenções Internacionais

Talvez o aspecto mais sensível e dogmaticamente rico para o estudioso do Direito seja o regime de responsabilidade civil aplicado ao setor. A Constituição, no mesmo artigo 21, inciso XXIII, alínea “d”, estabelece que a responsabilidade civil por danos nucleares independe da existência de culpa, consagrando a teoria do Risco Integral.

Sob essa ótica constitucional, a responsabilidade seria ilimitada e não admitiria excludentes como caso fortuito ou força maior. No entanto, a advocacia de alto nível exige compreender a tensão entre a norma interna e os compromissos internacionais. O Brasil aderiu à Convenção de Viena sobre Responsabilidade Civil por Danos Nucleares.

Aqui reside um ponto crucial: enquanto a teoria do Risco Integral sugere reparação irrestrita, o sistema internacional e a legislação infraconstitucional operam com tetos de responsabilidade financeira para o operador, cabendo ao Estado atuar como garantidor subsidiário apenas quando os danos ultrapassam esses limites. Dominar essa engenharia jurídica de seguros obrigatórios e garantias do Tesouro é o que separa o generalista do especialista. Para quem busca aprofundamento técnico nessas questões de responsabilidade e regulação, a Pós-Graduação em Direito e Processo Ambiental oferece o arcabouço teórico necessário para enfrentar teses complexas nos tribunais superiores.

A Nova Estrutura Regulatória: A Criação da ANSN

A complexidade administrativa da energia nuclear no Brasil sofreu uma mudança tectônica recente que não pode ser ignorada. Historicamente, a Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN) acumulava funções de fomento, pesquisa e fiscalização. Essa concentração gerava conflitos de interesse apontados por organismos internacionais.

Para sanar essa questão e atender à Convenção sobre Segurança Nuclear, foi promulgada a Lei nº 14.222, de 15 de outubro de 2021, que criou a Autoridade Nacional de Segurança Nuclear (ANSN).

Juridicamente, temos hoje uma separação de funções:

  • IBAMA: Mantém a competência para o licenciamento ambiental (EIA/RIMA), focado nos impactos ecológicos e socioambientais.
  • CNEN: Foca no planejamento, pesquisa e fomento da tecnologia nuclear.
  • ANSN: Assume o papel de órgão regulador e fiscalizador da segurança nuclear e proteção radiológica.

O advogado administrativista deve estar atento ao período de transição e à implementação prática desta nova autarquia, pois a transferência de acervo e competências gera um cenário fértil para questionamentos regulatórios e mandados de segurança.

Gestão de Rejeitos: Do Princípio à Omissão Estatal

A Lei nº 10.308/2001 dispõe sobre os depósitos de rejeitos radioativos, baseando-se no princípio da solidariedade intergeracional. O Estado tem o dever de guarda perpétua desses materiais, pois o risco transcende a vida útil das usinas.

Entretanto, a análise jurídica não pode ser apenas teórica. Existe um “gap” de enforcement no Brasil: a ausência de um depósito definitivo para rejeitos de média e alta atividade (o projeto CENTENA). Essa omissão estatal cria um passivo ambiental contínuo e riscos jurídicos para os operadores. A falha na gestão desses passivos ou a demora na definição dos sítios de depósito são temas recorrentes em Ações Civis Públicas, atraindo responsabilidade civil e administrativa, conforme a Lei de Crimes Ambientais (Lei nº 9.605/1998).

Direito Internacional e Tratados de Não Proliferação

A energia nuclear no Brasil não pode ser analisada isoladamente do cenário internacional. O país é signatário do Tratado de Não Proliferação de Armas Nucleares (TNP) e do Tratado de Tlatelolco. A própria Constituição Federal determina que a atividade nuclear em território nacional somente será admitida para fins pacíficos e mediante aprovação do Congresso Nacional.

Isso cria um sistema de salvaguardas. Juridicamente, qualquer expansão do programa nuclear brasileiro deve estar em conformidade com os compromissos assumidos perante a AIEA (Agência Internacional de Energia Atômica). Contratos internacionais de transferência de tecnologia são permeados por cláusulas de direito internacional público que exigem alta especialização.

O Papel do Advogado na Matriz Energética

Diante de um cenário regulatório tão denso e em transformação — com a implementação da ANSN e discussões sobre SMRs —, a atuação do advogado é multidisciplinar. Na fase pré-contratual, atua na análise de riscos legais. Durante a operação, o foco é o compliance regulatório perante a nova autoridade e a gestão de passivos. No contencioso, a defesa em ações complexas que envolvem a aplicação de tratados internacionais versus direito interno.

A expansão da matriz energética é uma necessidade do desenvolvimento nacional, mas o Direito impõe limites intransponíveis. Não há espaço para improviso. O domínio da legislação constitucional, ambiental e das novas leis regulatórias é o pré-requisito básico.

Quer dominar o Direito Ambiental e se destacar na advocacia de alto nível em setores regulados? Conheça nosso curso Pós-Graduação em Direito e Processo Ambiental e transforme sua carreira com conhecimento especializado.

Insights sobre o Marco Jurídico Nuclear

  • Risco Integral vs. Limitação Financeira: Embora a Constituição adote o Risco Integral (sem excludentes), a aplicação prática envolve a Convenção de Viena, que estabelece tetos indenizatórios para o operador, com garantia subsidiária do Estado.
  • Nova Autarquia (ANSN): A Lei nº 14.222/2021 modernizou o setor ao criar a Autoridade Nacional de Segurança Nuclear, separando a fiscalização (ANSN) do fomento (CNEN).
  • Monopólio e Inovação: O monopólio da União persiste, mas o mercado jurídico debate modelos de parcerias para exploração mineral e a futura implementação de SMRs (pequenos reatores modulares).
  • Passivo Ambiental e Omissão: A legislação exige depósito definitivo para rejeitos, mas a demora na implementação do repositório nacional gera riscos jurídicos de omissão estatal e responsabilidade intergeracional.
  • Duplo Licenciamento: O processo exige licenciamento ambiental (IBAMA) e licenciamento nuclear/radiológico (agora a cargo da ANSN), demandando expertise em duas esferas administrativas distintas.

Perguntas e Respostas

1. Qual a teoria de responsabilidade civil adotada pelo Brasil para danos nucleares?
O Brasil adota a teoria do Risco Integral (art. 21, XXIII, ‘d’, CF/88), que dispensa a culpa e não admite excludentes comuns. Contudo, na prática processual e securitária, deve-se observar os limites financeiros de responsabilidade estabelecidos pela Convenção de Viena e normas infraconstitucionais.

2. A iniciativa privada pode explorar usinas nucleares no Brasil?
Atualmente, não para a geração de energia elétrica (monopólio da União). A iniciativa privada atua na produção de radioisótopos (uso médico/industrial). Há debates legislativos e projetos visando permitir a participação privada em novas tecnologias como os SMRs no futuro.

3. Houve mudança recente na estrutura de fiscalização nuclear?
Sim. A Lei nº 14.222/2021 criou a Autoridade Nacional de Segurança Nuclear (ANSN), que absorveu as competências de regulação e fiscalização que antes pertenciam à CNEN, segregando as funções de controle das funções de fomento.

4. O que diz a Constituição sobre a finalidade da atividade nuclear no Brasil?
A Constituição veda o uso bélico, determinando que a atividade nuclear somente será admitida para fins pacíficos e mediante aprovação do Congresso Nacional.

5. Como é tratada a questão dos rejeitos radioativos na legislação?
A gestão de rejeitos é regulada pela Lei nº 10.308/2001. Juridicamente, aplica-se o princípio da responsabilidade intergeracional. O grande desafio jurídico atual é a efetivação dos depósitos definitivos para rejeitos de longa duração, cuja ausência gera insegurança jurídica.

Aprofunde seu conhecimento sobre o assunto na Wikipedia.

Acesse a lei relacionada em Lei nº 10.308/2001

Este artigo teve a curadoria da equipe da Legale Educacional e foi escrito utilizando inteligência artificial a partir do seu conteúdo original disponível em https://www.conjur.com.br/2025-dez-08/energia-nuclear-no-brasil-um-debate-a-ser-travado/.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *