Limites territoriais da eficácia da coisa julgada na Ação Civil Pública: Uma análise à luz do Tema 1075 do STF
O instituto da Ação Civil Pública (ACP) representa um dos pilares mais importantes do Estado Democrático de Direito, permitindo a tutela de interesses difusos e coletivos que transcendem a esfera individual. Durante décadas, o cenário jurídico brasileiro foi palco de um debate acalorado e tecnicamente complexo sobre a abrangência territorial das decisões proferidas nestas ações. A discussão central orbitava em torno da interpretação do artigo 16 da Lei nº 7.347/1985 e suas tentativas de restrição legislativa.
Para os profissionais do Direito que buscam a excelência técnica, compreender a evolução deste tema é mandatório. Não se trata mais apenas de uma discussão doutrinária, mas de aplicar corretamente os precedentes vinculantes das Cortes Superiores. A questão toca em princípios constitucionais como a isonomia, o acesso à justiça e a eficiência da prestação jurisdicional, exigindo do advogado uma atualização constante.
A controvérsia histórica, estabelecida quando a Lei nº 9.494/1997 alterou a redação original da Lei da Ação Civil Pública para restringir a eficácia da sentença aos limites da competência territorial do órgão prolator, encontrou finalmente um desfecho. Entender como o Supremo Tribunal Federal pacificou essa matéria é o divisor de águas entre uma advocacia genérica e uma atuação especializada de alta performance.
A distinção técnica entre competência e eficácia subjetiva
Um erro comum, que persistiu por anos na análise da Ação Civil Pública, é a confusão conceitual entre os limites da competência do juiz e os limites dos efeitos da sua decisão (eficácia subjetiva da coisa julgada).
- Competência: É a medida da jurisdição, ou seja, a delimitação do poder do magistrado para exercer a atividade jurisdicional em determinado caso. Ela é definida por regras de organização judiciária e pelo Código de Processo Civil.
- Eficácia da decisão: Diz respeito a quem será atingido pelo comando judicial.
Quando tratamos de direitos indivisíveis, como o meio ambiente ou direitos de consumidores em escala nacional, fragmentar a eficácia da decisão com base em limites geográficos territoriais gera aberrações jurídicas. O exemplo clássico permanece válido: imagine um produto defeituoso vendido em todo o país sendo proibido apenas em uma comarca específica, mas permitido na cidade vizinha. Isso fere a lógica do sistema.
A doutrina processualista moderna sempre defendeu que a competência deve ser fixada pelas regras legais (local do dano ou regras do CDC), mas, uma vez fixada, a decisão proferida deve ter a abrangência necessária para tutelar o direito material em questão. Se o direito é indivisível, a eficácia da sentença deve ser, logicamente, erga omnes, independentemente das fronteiras da comarca.
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O Tema 1075 do STF e a inconstitucionalidade do Art. 16
A discussão sobre a validade do artigo 16 da LACP deixou de ser uma matéria de opinião para se tornar uma questão de obediência a precedente vinculante. Em abril de 2021, no julgamento do Recurso Extraordinário 1.101.937 (Tema 1075 da Repercussão Geral), o Supremo Tribunal Federal colocou uma pá de cal no assunto.
A Corte declarou a inconstitucionalidade da alteração promovida pela Lei 9.494/1997 no art. 16 da Lei da Ação Civil Pública. O entendimento fixado foi o de que limitar os efeitos da coisa julgada à competência territorial do órgão prolator é inconstitucional, pois esvazia a proteção dos direitos transindividuais e viola o devido processo legal coletivo.
Portanto, a tese vigente é clara: a sentença proferida em ação civil pública fará coisa julgada erga omnes nos limites da abrangência do direito tutelado, e não nos limites geográficos da competência do juiz.
O Microssistema e a Regra do Art. 93 do CDC
Com a queda da barreira do art. 16, surge a preocupação prática: qualquer juiz de comarca pequena pode paralisar o país? Para evitar o caos jurídico e o forum shopping (escolha do juízo mais favorável), o STF reafirmou a aplicação do Artigo 93 do Código de Defesa do Consumidor.
O operador do Direito deve observar a seguinte regra de competência para danos de âmbito nacional ou regional:
- Se o dano é local: Competência do foro do local do dano.
- Se o dano é nacional ou regional: Competência do foro da capital do Estado ou do Distrito Federal.
Essa integração normativa é o coração do Microssistema de Processo Coletivo. A competência (onde ajuizar) segue regras estritas para evitar abusos, mas a eficácia (quem é protegido) é ampla e irrestrita territorialmente.
Executividade e tutela provisória
Superada a questão territorial, outro ponto crucial na estratégia processual diz respeito à executividade da decisão. É fundamental distinguir a eficácia da coisa julgada (que se torna imutável) da exequibilidade imediata das decisões (tutela provisória ou cumprimento provisório de sentença).
Na tutela coletiva, o sistema busca equilibrar a necessidade de proteção urgente (evitando perecimento de direitos ambientais ou saúde pública) com a segurança jurídica. Embora a decisão tenha abrangência nacional, a sua execução pode sofrer suspensões até o trânsito em julgado, dependendo do risco de irreversibilidade da medida.
O advogado especialista deve dominar os instrumentos de tutela de urgência e as peculiaridades dos recursos nos tribunais superiores. Entender as nuances constitucionais que permitem a modulação de efeitos ou a suspensão de segurança é vital. Para isso, o estudo aprofundado na Pós-Graduação em Direito Constitucional oferece a base necessária para construir teses robustas perante as Cortes Superiores.
Conclusão
A definição do Tema 1075 pelo STF representa um avanço significativo na racionalidade do sistema judicial brasileiro. A eficácia territorial na Ação Civil Pública não é mais refém de limites geográficos artificiais, mas sim orientada pela natureza do direito material violado.
Para o profissional do Direito, o desafio agora é técnico-operacional: saber identificar a competência correta (conforme o CDC) e manejar os instrumentos processuais para garantir a efetividade da decisão em escala nacional. A atuação em processos coletivos exige uma visão macroscópica do ordenamento jurídico, onde a Lei da Ação Civil Pública, o CDC e a Constituição Federal dialogam constantemente.
Estar atualizado com os precedentes vinculantes não é um diferencial, é uma obrigação para a sobrevivência no mercado jurídico de alta complexidade.
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Insights sobre o tema
- Competência vs. Coisa Julgada: A competência define qual juiz julga (regra de organização). A coisa julgada define quem é beneficiado pela decisão. O STF definiu que a segunda não pode ser limitada pela primeira em direitos difusos.
- O Fim da Restrição Territorial: Com o Tema 1075, caiu por terra a tese de que a sentença de um juiz vale apenas nos limites de sua comarca em ações coletivas. Se o dano é nacional, a proteção é nacional.
- Regra Anticaos (Art. 93 CDC): Para evitar que juízes de primeira instância em locais remotos decidam sobre temas nacionais complexos de forma aleatória, a competência para danos nacionais concentra-se nas Capitais dos Estados ou no Distrito Federal.
Perguntas e Respostas
1. O que decidiu o STF no Tema 1075 sobre a Ação Civil Pública?
O STF declarou inconstitucional o artigo 16 da Lei da Ação Civil Pública. A Corte definiu que a sentença na ação civil pública faz coisa julgada erga omnes (para todos) nos limites da abrangência do dano ou do direito tutelado, e não se restringe à competência territorial do órgão que proferiu a decisão.
2. Qual a diferença entre competência e eficácia da decisão neste contexto?
A competência é a regra que diz onde o processo deve correr (foro). A eficácia diz até onde os efeitos da sentença chegam. O STF esclareceu que, embora a competência siga regras estritas, a eficácia da decisão deve cobrir todo o grupo afetado, mesmo que eles residam fora da comarca do juiz.
3. Onde devo ajuizar uma Ação Civil Pública de dano nacional?
Conforme o artigo 93 do Código de Defesa do Consumidor, reafirmado pelo STF, se o dano for de âmbito nacional ou regional, a competência é do foro da capital do Estado ou do Distrito Federal.
4. A decisão de um juiz estadual pode ter validade no Brasil todo?
Sim. Se o juiz for competente (estiver na Capital ou DF, conforme o caso, e for competente para a matéria), sua decisão em Ação Civil Pública terá validade em todo o território nacional, caso o dano seja nacional. A limitação geográfica da comarca não impede a eficácia nacional da ordem judicial.
5. Por que a antiga regra era considerada inconstitucional?
Porque ela violava a isonomia e a eficiência processual. Se um dano afeta consumidores no Brasil inteiro, não faz sentido que a justiça proteja apenas os moradores de uma cidade e deixe os outros desprotegidos, ou que obrigue o ajuizamento de milhares de ações idênticas em cada comarca do país.
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Acesse a lei relacionada em Lei nº 7.347, de 24 de Julho de 1985
Este artigo teve a curadoria da equipe da Legale Educacional e foi escrito utilizando inteligência artificial a partir do seu conteúdo original disponível em https://www.conjur.com.br/2025-dez-06/stf-restabelece-decisao-do-trt-23-que-limita-alcance-de-acao-civil-publica/.