Propriedade Industrial: O Mito da Necessidade de Fabricação e a Realidade da Indenização Material
A propriedade intelectual, pilar fundamental da economia moderna, transcende a mera proteção burocrática. No âmbito da Propriedade Industrial, o registro de desenhos industriais, marcas e patentes confere ao titular o ius excludendi — o direito absoluto de impedir terceiros de explorar sua criação. Contudo, a prática forense é frequentemente contaminada por uma falácia perigosa: a ideia de que a ausência de industrialização ou comercialização do ativo pelo titular isentaria o infrator do dever de indenizar materialmente.
Este artigo visa desconstruir, sob uma ótica dogmática e jurisprudencial atualizada, a relação entre a efetiva exploração do ativo e a reparação civil, demonstrando que a vedação ao enriquecimento sem causa prevalece sobre a inércia produtiva.
O Desenho Industrial e o Teste do Observador Informado
O desenho industrial, tutelado pela Lei nº 9.279/96 (LPI), protege a forma plástica ornamental. Diferente das patentes de invenção, cujo escopo é técnico, a violação do desenho industrial é aferida pelo impacto visual. O registro válido no INPI é a condição sine qua non para a proteção, concedendo um monopólio temporário que independe, para sua manutenção, do uso imediato (ao contrário das marcas, sujeitas à caducidade).
Para o advogado especialista, é crucial compreender que a análise da contrafação não se limita à cópia servil (idêntica). A jurisprudência aplica o conceito do “observador informado”. Se a “impressão geral” causada pelo produto infrator no observador for a mesma do produto registrado, a violação está configurada.
Portanto, pequenas alterações funcionais ou estéticas, frequentemente utilizadas como estratégia de defesa para alegar “mera inspiração”, não são suficientes para afastar a ilicitude se a identidade visual distintiva foi apropriada. O domínio sobre a Propriedade Industrial e a Moda é essencial para distinguir o que é tendência de mercado do que é usurpação de patrimônio alheio.
A Responsabilidade Civil e o Enriquecimento Sem Causa
Um dos pontos mais sensíveis e mal interpretados na doutrina refere-se à materialização do dano quando o titular não fabrica o produto (as chamadas Non-Practicing Entities ou inventores individuais). A tese defensiva comum alega que, se não há produto no mercado, não há desvio de clientela e, portanto, não haveria lucros cessantes.
Essa visão, contudo, é reducionista. A responsabilidade civil na propriedade industrial opera sob a lógica de que a violação do direito gera um dano material presumido pela simples usurpação do ativo. O fundamento jurídico não é apenas a perda de uma venda (lucro cessante stricto sensu), mas a vedação ao enriquecimento sem causa do infrator.
Ao utilizar um desenho industrial ou patente alheia sem autorização, o contrafator economizou o custo do licenciamento e do desenvolvimento. Ele se apropriou de um valor econômico. Dessa forma, a indenização material é devida como forma de restituir ao titular o valor pelo uso não autorizado do bem intangível, independentemente de o titular estar ou não operando comercialmente naquele momento.
A Liquidação do Dano e o Critério dos Royalties (Art. 210, III da LPI)
Quando a prova do prejuízo direto (vendas perdidas) é inviável — justamente porque o titular não está fabricando —, a Lei da Propriedade Industrial oferece mecanismos objetivos de liquidação em seu artigo 210. O erro estratégico de muitos profissionais é tentar provar lucros cessantes pela via do inciso I (o que o prejudicado deixou de lucrar), quando o caminho técnico correto é o inciso III.
O inciso III do artigo 210 estabelece que a indenização pode ser calculada com base na remuneração que o autor da violação teria pago ao titular da patente ou do registro se tivesse uma licença.
- Natureza Objetiva: Não é necessário provar que o titular “pretendia” licenciar o produto ou que havia uma estratégia de royalties. O critério é legal e objetivo.
- Licença Compulsória Retroativa: O judiciário, ao aplicar este dispositivo, converte a infração em uma espécie de contrato de licença forçado, onde o infrator deve pagar o “aluguel” (royalties) pelo tempo que usou o ativo indevidamente.
- Caráter Punitivo-Pedagógico: A aplicação rigorosa deste dispositivo visa evitar que o ilícito compense. Se a indenização dependesse apenas da prova de venda perdida, copiar produtos de startups em fase pré-operacional seria uma conduta de baixo risco.
O estudo aprofundado destes mecanismos em uma Pós-Graduação em Direito Empresarial capacita o advogado a manejar corretamente os critérios de liquidação, evitando a improcedência dos pedidos indenizatórios por erro na escolha da base de cálculo.
A Importância da Perícia Técnica (O An Debeatur)
Antes de discutir o quantum indenizatório, o litígio de propriedade industrial é vencido ou perdido na fase de conhecimento, especificamente na prova pericial. Enquanto a perícia contábil define valores, é a perícia técnica de engenharia ou design que define a existência da infração (o an debeatur).
O advogado não pode negligenciar a assistência técnica. Um laudo pericial que ateste que as diferenças entre os produtos são irrelevantes para o conjunto ornamental é a chave para destravar o dever de indenizar. Sem a comprovação robusta da apropriação da forma plástica, toda a discussão sobre royalties ou lucros cessantes torna-se inócua.
Função Social e Estratégia de Reserva
Embora a função social da propriedade seja um princípio constitucional, ela não deve ser utilizada como salvo-conduto para a pirataria. O sistema de patentes e registros permite ao titular a estratégia de reserva de mercado — o direito de patentear ou registrar para impedir que concorrentes atuem em determinado nicho, mesmo que o titular opte por não explorá-lo imediatamente.
A defesa baseada na “falta de uso” é frágil no campo do Desenho Industrial (salvo raras exceções de abuso de direito). A estratégia processual do infrator deve focar, preferencialmente, na nulidade do registro (por falta de novidade ou originalidade) ou na demonstração técnica de distinção entre os produtos, e não na inércia comercial do titular.
Conclusão
A proteção da propriedade industrial exige do operador do Direito um refinamento técnico superior. A ausência de fabricação do produto pelo titular do registro não afasta o dever de indenização material. A legislação brasileira, alinhada aos tratados internacionais, repele o enriquecimento sem causa decorrente do uso não autorizado de propriedade alheia.
Para o advogado de alto nível, a vitória reside na correta tipificação do pedido indenizatório: migrar da tentativa frustrada de provar “vendas perdidas” para a aplicação sólida do critério dos royalties indenizatórios (Art. 210, III, LPI). Compreender que o dano reside na violação do direito de exclusividade, e não apenas no prejuízo contábil imediato, é o diferencial que separa a advocacia artesanal da advocacia estratégica de resultados.
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Insights sobre o Tema
- Dano In Re Ipsa: Na violação de propriedade industrial, o dano material pode ser considerado presumido sob a ótica dos royalties não pagos. Quem usa bem alheio deve pagar, independentemente de o dono estar usando ou não.
- Estratégia Processual: Em casos onde o titular não fabrica, o pedido de indenização deve ser formulado, desde a inicial, com base no critério dos royalties (Art. 210, III da LPI), evitando o ônus de provar desvio de clientela inexistente.
- Assistência Técnica: O investimento em um assistente técnico especializado em design é tão ou mais importante que a argumentação jurídica, pois a infração de DI é eminentemente visual e comparativa.
Perguntas e Respostas
1. Se eu não fabrico o produto do meu desenho industrial, perco o direito à indenização?
Não. Você mantém o direito de impedir terceiros de usar sua criação e o direito de ser indenizado. A diferença será no método de cálculo: em vez de cobrar pelas vendas que você “deixou de fazer”, você cobrará os royalties que o infrator “deveria ter pago” para usar seu desenho (Art. 210, III da LPI).
2. O que é o critério dos royalties hipotéticos?
É um método legal de cálculo de indenização onde o juiz determina que o infrator pague ao titular o valor correspondente a uma licença de uso. É como se o juiz validasse um contrato de licenciamento retroativo, obrigando o infrator a pagar pelo uso que fez do ativo intelectual.
3. Pequenas mudanças no design evitam a condenação?
Geralmente não. A análise de violação de desenho industrial é feita com base no “observador informado”. Se a impressão visual geral for a mesma e as características essenciais forem copiadas, pequenas alterações não isentam o infrator da responsabilidade civil.
4. O registro de desenho industrial caduca se não for usado?
Diferente das marcas, o registro de desenho industrial não caduca automaticamente por falta de uso no Brasil. O registro é válido pelo prazo legal (até 25 anos, se prorrogado), garantindo a exclusividade mesmo sem fabricação imediata.
5. Por que a perícia é tão importante nesses casos?
Porque o juiz não é especialista em design ou engenharia. A perícia técnica é o momento em que se prova, objetivamente, que o produto do concorrente é uma cópia não autorizada do seu registro. Sem essa prova técnica da infração, não há que se falar em indenização.
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Acesse a lei relacionada em Lei nº 9.279, de 14 de maio de 1996
Este artigo teve a curadoria da equipe da Legale Educacional e foi escrito utilizando inteligência artificial a partir do seu conteúdo original disponível em https://www.conjur.com.br/2025-dez-05/copiar-produto-so-gera-indenizacao-se-ele-for-fabricado-ou-vendido/.