Inquérito Policial e Relatório de Investigação Fiscal: Garantias Fundamentais e Controle Judicial
O processo penal brasileiro está fundamentado em pilares sólidos, voltados para a proteção das garantias individuais e o devido processo legal. Um aspecto sensível e de extrema relevância nessa temática refere-se aos procedimentos investigativos, especialmente o inquérito policial e o Relatório de Investigação Fiscal (RIF), bem como o papel do Judiciário no controle das atividades diligenciais.
Este artigo se aprofunda nos limites, formalidades e consequências da atuação do juiz no controle da legalidade das investigações, em especial da produção e validação dos elementos probatórios que antecedem a ação penal, com ênfase nas peculiaridades do RIF e sua relação com os direitos fundamentais.
O Inquérito Policial e o RIF no Contexto das Investigações Criminais
O inquérito policial é, tradicionalmente, o procedimento administrativo inquisitorial destinado à apuração da materialidade e autoria das infrações penais, previsto nos artigos 4º a 23 do Código de Processo Penal (CPP). Já o Relatório de Investigação Fiscal, usualmente elaborado pela Receita Federal ou por órgãos fazendários, visa documentar indícios de crimes contra a ordem tributária e pode desencadear ou instruir a persecução penal.
A articulação entre ambos ocorre frequentemente em crimes tributários ou financeiros, pois o conteúdo do RIF serve como subsídio importante para o inquérito e eventual denúncia. Ocorre que a coleta e uso dessas provas pelo Estado impõem a observância de garantias constitucionais, notadamente o direito ao contraditório, à ampla defesa e à legalidade estrita de procedimentos.
Natureza Jurídica e Valor Probatório do RIF
O RIF, enquanto documentação administrativa, não possui natureza de prova judicializada, sendo, por princípio, um relatório técnico de indícios elaborado no âmbito extrajudicial. Não obstante, seu conteúdo pode adquirir significativa relevância como fundamentação para a instauração de inquérito e para subsidiar a denúncia pelo órgão ministerial.
O valor probatório do RIF, e mesmo dos demais elementos colhidos na fase inquisitorial, é limitado. O entendimento majoritário da jurisprudência é que servem como elementos informativos, a serem corroborados, validados e contraditados durante a instrução criminal. A súmula 14 do Supremo Tribunal Federal reforça a necessidade de acesso amplo às informações para a defesa.
Limites à Atuação Judicial na Fase Investigatória
À luz do princípio acusatório e da separação de funções processuais (Lei nº 13.964/2019, o denominado ‘Pacote Anticrime’), amplia-se a vedação quanto à atuação judicial de ofício, seja na determinação de diligências, seja na produção de provas para formação da opinio delicti.
O artigo 3º-A do CPP (introduzido pela referida lei) consagra o sistema acusatório: “O processo penal reger-se-á, […], pelos princípios do contraditório, da ampla defesa e da imparcialidade do juiz, vedadas a iniciativa do juiz na fase investigatória e a substituição da atuação probatória do órgão de acusação.” Isso delimita de forma clara a atuação do magistrado, restringindo sua atuação à provocação das partes.
A Encomenda de Relatórios e Diligências pelo Juízo: Riscos e Consequências Jurídicas
A eventual solicitação, pelo juiz, de elaboração de relatórios investigativos, como o RIF, não é admitida pelo ordenamento jurídico. A jurisprudência atual majoritária entende que, se o magistrado determina de ofício diligências investigativas ou a confecção de documentos de natureza técnica, compromete sua imparcialidade e afronta o sistema acusatório. Tal prática pode ensejar a nulidade dos atos subsequentes, por violação dos artigos 564, IV e 386, III do CPP.
Em especial, vale destacar que a chamada “encomenda judicial” de elementos probatórios na fase pré-processual pode configurar um vício insanável, gerando inclusive a contaminação da ação penal, por ferir o devido processo legal (Constituição Federal, art. 5º, LIV e LV).
A Nulidade das Provas e Dos Atos Subsequentes: Aspectos Processuais
Nos termos do art. 157 do CPP, as provas obtidas por meios ilícitos são inadmissíveis, e, nos termos do art. 564, a nulidade pode ser reconhecida a qualquer momento quando houver ofensa ao contraditório e à estrutura do processo. Quando o magistrado extrapola suas funções ao requisitar relatórios investigativos, a doutrina e a jurisprudência têm reconhecido não só a nulidade do próprio RIF produzido, mas também dos atos instrutórios que dele decorrem.
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) e o Supremo Tribunal Federal têm reafirmado continuamente a necessidade de preservação do devido processo legal e impelem a atuação judicial à estrita observância de seus limites constitucionais, sob pena de nulidade absoluta.
O Controle da Legalidade das Provas e o Papel do Magistrado
Ao juiz compete o controle da legalidade dos elementos juntados aos autos, mas não a sua produção ativa durante o inquérito. Ou seja, se há suspeita de irregularidade ou vício nos elementos coletados, cabe ao Judiciário declarar a ilicitude ou determinar a reiteração de atos caso provocado pelas partes.
A atuação proativa do magistrado, sem observância do contraditório, macula a higidez das provas, especialmente nas hipóteses de delitos tributários e financeiros, nas quais o conhecimento técnico-fiscal é imprescindível e a imparcialidade do julgador deve ser máxima.
Essas preocupações são recorrentes na literatura jurídica e são tema central dos principais cursos de especialização na área, como o Pós-Graduação em Direito Penal e Processo Penal, que aprofunda não apenas os fundamentos teóricos, mas também o manejo estratégico da nulidade e do controle da prova na prática forense.
O Devido Processo Legal e as Garantias do Investigado
O devido processo legal, assegurado pelo art. 5º, LIV da Constituição, exige que todo e qualquer procedimento investigatório respeite os direitos das partes, em especial o contraditório, a ampla defesa e o juiz natural. A ingerência judicial indevida nas investigações, inclusive na solicitação de relatórios técnicos, transgride tais garantias e compromete a higidez do processo penal.
O respeito rigoroso aos contornos do sistema acusatório não é uma formalidade vazia, mas um baluarte de proteção contra o arbítrio, assegurando que o Estado não manipule as fases procedimentais para obtenção de provas ou condenações a qualquer custo.
Entendimentos Doutrinários e Jurisprudenciais
A doutrina é uníssona no rechaço à atuação investigatória do magistrado. Alexandre Moraes, Guilherme de Souza Nucci, e outros expoentes do Direito Processual Penal sustentam que a estrutura acusatória visa proteger a imparcialidade do juiz e a paridade de armas entre acusação e defesa. A jurisprudência dos tribunais superiores, em diversas oportunidades, consagrou o entendimento de que é nulo o processo em que o juiz exerce funções inquisitivas ou assume iniciativa probatória além de seu mister.
Há, evidentemente, debates quanto a situações excepcionais de garantias processuais, como na cláusula de cooperação judicial ou nos casos de reconstituição ou esclarecimento de fatos após provocação. Todavia, essas hipóteses não se confundem com a iniciativa unilateral e oficiosa, repudiada pelo sistema.
A evolução legislativa recente, especialmente com a reforma do CPP promovida pela Lei 13.964/2019, consolida normativamente essas restrições, resultando em previsões explícitas nos arts. 3º-A e 156, ambos do Código de Processo Penal.
Implicações Práticas e Estratégias de Atuação na Defesa e Acusação
Dominar os limites da atuação judicial e o controle das provas extrajudiciais é fundamental para o êxito de advogados e membros do Ministério Público. A identificação de vícios na produção do RIF ou de outros elementos do inquérito pode ser decisiva para a obtenção de decisões favoráveis, seja pelo reconhecimento de nulidades absolutas ou para a exclusão de provas contaminadas.
Por isso, o estudo aprofundado desses aspectos, oferecido por cursos especializados como o Pós-Graduação em Direito Penal e Processo Penal, é imprescindível para aqueles que querem atuar com excelência em demandas penais complexas, sobretudo diante dos crescentes desafios que envolvem a intersecção entre direito tributário, financeiro e criminal.
Conclusão
O respeito ao devido processo legal, à imparcialidade judicial e ao sistema acusatório são indispensáveis no tratamento do inquérito policial e do Relatório de Investigação Fiscal. A jurisprudência tem afirmado, com cada vez mais veemência, a necessidade de observância rigorosa desses limites, reconhecendo a nulidade de atos praticados fora das balizas constitucionais e legais.
A correta compreensão e a atuação estratégica diante dessas situações não são meros luxos acadêmicos, mas, sim, requisitos práticos fundamentais para o exercício pleno da advocacia e de funções essenciais à justiça.
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Insights
O sistema acusatório exige separação rigorosa dos papéis processuais e limitações objetivas à atividade jurisdicional.
A produção e o uso do Relatório de Investigação Fiscal demandam análise criteriosa sob a perspectiva das garantias do investigado.
A nulidade absoluta de atos produzidos a partir de diligências encomendadas pelo juiz é um tema consolidado na jurisprudência, mas desafia a prática advocatícia em sua identificação e arguição tempestiva.
O domínio técnico do controle de legalidade probatória impacta diretamente o êxito processual, inclusive em estratégicas de defesa e acusação.
Investir em qualificação avançada, como uma pós-graduação em Direito Penal e Processo Penal, faz toda diferença para quem atua em processos criminais complexos.
Perguntas e Respostas
1. O Relatório de Investigação Fiscal pode ser considerado prova definitiva em ação penal?
Não. Ele é elemento informativo, devendo ser corroborado na instrução, pois, por si só, não possui valor probatório judicializado.
2. O juiz pode determinar de ofício diligências investigativas na fase do inquérito?
Não. O sistema acusatório e o art. 3º-A do CPP vedam expressamente essa possibilidade.
3. Quais são as consequências jurídicas da produção de RIF por determinação do juiz?
Podem ser declaradas nulas tanto a confecção do relatório quanto as provas e atos processuais dele decorrentes.
4. É possível aproveitar os elementos do RIF se ele foi encomendado pelo juízo?
Em regra, não, pois há nulidade absoluta devido à violação da imparcialidade. No entanto, cada situação demanda análise específica de eventual teoria do aproveitamento da prova.
5. Como a defesa deve atuar diante de provas produzidas por requisição judicial indevida?
Deve arguir a nulidade, preferencialmente na primeira oportunidade, fundamentando com base nos artigos do CPP, princípios constitucionais e precedentes dos tribunais superiores.
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Acesse a lei relacionada em https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2019/lei/l13964.htm
Este artigo teve a curadoria da equipe da Legale Educacional e foi escrito utilizando inteligência artificial a partir do seu conteúdo original disponível em https://www.conjur.com.br/2025-ago-27/stj-anula-rif-por-encomenda-e-manda-juiz-reavaliar-diligencias/.