Tradição no direito civil é o instituto jurídico que representa a entrega efetiva de um bem, geralmente móvel, com o objetivo de transferir a posse e, em determinados contextos, também a propriedade do objeto entre as partes envolvidas em um negócio jurídico. A tradição é uma das formas pelas quais ocorre a transferência da propriedade dos bens móveis, distinguindo-se da mera celebração do contrato, pois, diferentemente dos bens imóveis, cuja propriedade é transferida mediante registro no Cartório de Registro de Imóveis, no caso dos bens móveis a tradição cumpre esse papel central.
No âmbito do direito civil brasileiro, conforme dispõe o Código Civil, a propriedade dos bens móveis se transmite com a tradição, ou seja, com a entrega do bem. Isso significa que, mesmo havendo contrato válido entre comprador e vendedor, por exemplo, a efetiva transferência da propriedade somente ocorrerá mediante a entrega real do objeto. Essa entrega pode assumir diferentes formas, pois a tradição não se limita à transferência física direta do bem.
Existem modalidades variadas de tradição reconhecidas pela doutrina e jurisprudência, incluindo a tradição real, a simbólica, a ficta ou presumida, entre outras. A tradição real ocorre quando há entrega material do bem, como por exemplo, a entrega de um carro ao comprador no momento da venda. Já a tradição simbólica se verifica quando se transfere ao adquirente um meio simbólico de posse do bem, como a entrega de chaves ou documentos que permitam controlá-lo ou acessá-lo. A tradição ficta ou presumida ocorre em casos nos quais, embora não se verifique a entrega física do bem, considera-se que houve a transmissão da posse, como ocorre na tradição longa manu, em que se mostra o bem ao adquirente, que já tem meios para tomar posse dele, ou na tradição brevi manu, quando aquele que já detinha a posse do bem como detentor passa a possuí-lo como proprietário.
É importante compreender que, no âmbito das obrigações, a tradição também desempenha papel relevante ao sinalizar o cumprimento da obrigação assumida por uma das partes, como no caso do vendedor que entrega o bem ao comprador, efetivando a prestação a que estava vinculado. A ausência da tradição pode, em determinadas situações, invalidar a pretensão do comprador de exercer direitos sobre o bem, como o direito de reivindicação em face de terceiros, pois, juridicamente, a mera assinatura de um contrato sem a entrega não consolida a mudança de titularidade.
O conceito de tradição remonta ao direito romano, onde já se reconhecia a importância da entrega como forma de efetivar a transferência de propriedade. Essa influência é visível até os dias atuais, pois o sistema jurídico civilista adota o princípio segundo o qual a tradição opera a transferência da propriedade por ato translativo, distinguindo-se da mera intenção contratual.
Além disso, a tradição está relacionada ao princípio da publicidade da propriedade, pois, através da entrega do bem, comunica-se ao mundo externo quem é seu novo detentor ou possuidor. Isso é particularmente relevante em contextos onde terceiros podem ser afetados pela mudança de titularidade, como na alienação de bens móveis sujeitos à penhora ou em disputas possessórias.
É necessário ainda destacar que, para que a tradição produza seus efeitos jurídicos plenos, é requisito que exista justa causa para a entrega, ou seja, um negócio jurídico subjacente válido que legitime a transferência do bem. Tradição sem causa ou decorrente de ato ilícito não transfere a propriedade, conforme reiteradamente afirma a jurisprudência e a doutrina especializada.
Portanto, tradição no direito civil é mais do que o mero ato físico de entregar algo. Trata-se de um instituto essencial que representa a exteriorização da vontade das partes em transferir a posse de um bem, servindo como elemento fundamental na consolidação da propriedade de bens móveis. Seu papel na eficácia das obrigações e na proteção da confiança entre as partes torna a tradição uma peça-chave na estrutura e no funcionamento das relações patrimoniais dentro do ordenamento jurídico civil.