O procedimento do júri é uma modalidade de processo penal prevista na legislação brasileira, que se aplica aos crimes dolosos contra a vida e conexos, conforme estabelecido no artigo 5º, inciso XXXVIII, da Constituição Federal e regulamentado pelo Código de Processo Penal. Esses crimes incluem o homicídio simples ou qualificado, o infanticídio, o aborto e o induzimento ou instigação ao suicídio. O procedimento do júri é caracterizado por sua estrutura bifásica e pela participação direta de cidadãos leigos na decisão final sobre a culpa ou a inocência do acusado, com base nos princípios do devido processo legal, da plenitude de defesa e da soberania dos veredictos.
A primeira fase do procedimento do júri é denominada fase de formação da culpa ou fase judicium accusationis. Nessa etapa, o juiz togado, ou seja, o magistrado de carreira, atua como responsável por verificar a presença da justa causa para o prosseguimento do processo. Após a denúncia do Ministério Público ou a queixa, o acusado é citado e pode apresentar defesa prévia. Subsequentemente, são realizadas audiências de instrução e julgamento, em que se colhem provas e se ouvem testemunhas, o ofendido e o próprio acusado. Após este momento, o juiz decide se pronuncia o réu, tornando-o apto a ser julgado pelo Tribunal do Júri, ou se o impronuncia, absolve sumariamente ou desclassifica o crime para outro que não seja da competência do júri.
A decisão de pronúncia não condena o acusado, mas reconhece a existência de indícios suficientes de autoria e materialidade do crime para seu julgamento pelo Tribunal do Júri. A partir de então, o réu pode responder ao processo preso ou em liberdade, à espera do julgamento na segunda fase. É importante destacar que a decisão de pronúncia admite recurso, chamado de recurso em sentido estrito, que pode ser interposto pela defesa ou pelo Ministério Público.
A segunda fase é chamada de fase de julgamento ou judicium causae. Nesse estágio, o réu é julgado pelo Tribunal do Júri, composto por um juiz presidente e por um corpo de sete jurados, escolhidos entre cidadãos comuns que preencherem certos requisitos legais como idoneidade e escolaridade mínima. A sessão de julgamento segue um rito próprio, com a presença obrigatória do Ministério Público, da defesa, dos jurados, do juiz presidente e eventualmente do assistente de acusação.
No início da sessão, o juiz sorteia os jurados que comporão o conselho de sentença. Em seguida, são ouvidas as testemunhas, o réu e ocorridas as sustentações orais da acusação e da defesa, com possibilidade de réplica e tréplica. Encerrado esse momento, os jurados recolhem-se à sala secreta, onde decidem através de votação secreta e individual as questões formuladas pelo juiz, conhecidas como quesitos. Eles precisam responder se o crime efetivamente ocorreu, se o acusado foi o autor e se há existência de circunstâncias qualificadoras ou causas de exclusão de ilicitude, entre outras. A maioria simples dos votos define cada questão.
A decisão dos jurados é soberana, ou seja, o juiz presidente não pode modificá-la, devendo apenas adequar a pena conforme a conclusão dos jurados. Essa soberania é uma das garantias constitucionais do Tribunal do Júri. Ainda que em casos excepcionais, a sentença pode ser anulada por recurso de apelação, caso haja vícios processuais ou manifesta contrariedade à prova dos autos.
O procedimento do júri desempenha papel fundamental na estrutura democrática do processo penal, ao permitir a participação popular na administração da justiça criminal. Ele reflete o compromisso do ordenamento jurídico brasileiro com o princípio da cidadania e o controle social das decisões judiciais em matérias de extrema gravidade, como os crimes contra a vida. Contudo, o modelo também é objeto de críticas, que incluem alegações de subjetividade nas decisões dos jurados, longo tempo de tramitação e influência da mídia no julgamento. Apesar disso, permanece como um dos pilares do sistema penal brasileiro e expressão da legitimidade popular na aplicação da justiça.
1 comentário em “Procedimento do júri”
Parabéns, bom artigo.