O cenário jurídico brasileiro sofreu alterações tectônicas recentes que exigem do operador do Direito uma atualização imediata e rigorosa. A intersecção entre a liberdade de crença, o direito de manifestação e o porte de artefatos com potencial intimidatório não pode mais ser analisada sob a ótica simplista da “brincadeira de mau gosto” ou da mera contravenção penal.
Com a promulgação da Lei nº 14.532/2023 e a edição do Decreto nº 11.615/2023, a qualificação jurídica de condutas que envolvem ameaças a templos religiosos e o uso de simulacros ou armas de pressão ganhou novos contornos de gravidade. Estamos diante de um campo minado onde a defesa técnica e a acusação devem manejar conceitos de Direito Penal, Administrativo e Constitucional com precisão cirúrgica.
Este artigo propõe uma análise dogmática atualizada, afastando o senso comum para focar na tecnicidade exigida nos tribunais superiores.
A Nova Sistemática da Injúria Racial e o Racismo Religioso
Até pouco tempo, a defesa poderia buscar refúgio na tese de injúria simples ou qualificada, com penas brandas e possibilidade de fiança. No entanto, a entrada em vigor da Lei nº 14.532/2023 alterou substancialmente a Lei de Racismo (Lei nº 7.716/89).
É imperativo compreender que a injúria racial agora é tipificada como crime de racismo. No contexto religioso, isso significa que ofensas ou ameaças dirigidas a indivíduos ou grupos em razão de sua fé não são apenas ataques à honra subjetiva, mas crimes imprescritíveis e inafiançáveis.
- Tipicidade Reforçada: A conduta de obstar, impedir ou dificultar o acesso a locais de culto, ou vilipendiar liturgias, ganha peso quando associada a elementos de discriminação.
- Dolo Específico: A acusação deve demonstrar o dolo de discriminar, enquanto a defesa deve trabalhar a ausência desse elemento subjetivo especial do tipo, buscando desclassificações para tipos penais comuns, fugindo do rigor da Lei de Racismo.
Para o advogado criminalista, dominar essas distinções é vital. O Curso de Lei de Preconceito Racial aprofunda a análise da Lei 14.532/2023, preparando o profissional para as nuances da imprescritibilidade e da inafiançabilidade em sede policial.
Armas de Pressão e Simulacros: O Abismo entre o Ilícito Penal e Administrativo
A utilização de armas de pressão (airsoft, paintball) ou simulacros em adjacências de templos exige uma análise bifurcada: a penal e a administrativa. O erro comum é tratar tudo apenas como “ameaça”.
Sob a ótica penal (Art. 147 do CP), o crime é formal. Não se exige que a arma tenha potencialidade lesiva real (capacidade de disparo letal), mas sim idoneidade para incutir temor. Se a vítima se sentiu ameaçada, o crime pode estar consumado.
Contudo, a defesa e a acusação devem estar atentas ao Decreto nº 11.615/2023, que regulamentou de forma rígida o transporte e uso desses equipamentos:
- Exigência de Ponta Laranja: A ausência de caracterização visual que distinga o artefato de uma arma de fogo real não apenas facilita a configuração da grave ameaça, como constitui infração administrativa.
- Documentação e Transporte: O porte ostensivo ou o transporte sem a devida guia e nota fiscal em locais públicos (como a frente de um templo) pode gerar apreensão imediata e multa.
Em uma audiência de custódia, o descumprimento das normas administrativas do Decreto 11.615/2023 serve como argumento robusto para o Ministério Público pleitear a periculosidade do agente e a necessidade de medidas cautelares mais severas, ou até a prisão preventiva. O conhecimento técnico dessas normas, abordado no Curso sobre o Estatuto do Desarmamento, é a ferramenta para desmontar ou sustentar a legalidade da prisão.
A Prova do Dolo e o Princípio da Lesividade
A materialidade é clara quando há vídeos ou testemunhas, mas a batalha jurídica real ocorre no campo da subjetividade (dolo) e da lesividade. O Supremo Tribunal Federal (STF) tem entendimento consolidado de que a liberdade de expressão não ampara o discurso de ódio (hate speech).
No entanto, postagens antigas em redes sociais provam o dolo no momento do fato (tempus regit actum)? A defesa técnica deve argumentar com base no Princípio da Lesividade: a conduta teve capacidade concreta de lesionar o bem jurídico tutelado (paz pública ou liberdade religiosa) ou foi um ato inidôneo, um “crime impossível” ou mero exaurimento de opinião sem potencial de dano?
A acusação, por sua vez, deve vincular a conduta ao contexto de intolerância sistêmica, utilizando a jurisprudência do STF (como na ADO 26 e no RHC 79.057) para demonstrar que a ameaça a um grupo religioso fere a dignidade da pessoa humana em sua dimensão coletiva.
Extraterritorialidade: Quando a Ameaça Cruza Fronteiras
A inclusão da extraterritorialidade na discussão não é aleatória. Com o aumento de crimes cibernéticos de ódio e incidentes envolvendo brasileiros no exterior atacando grupos religiosos, a aplicação do Art. 7º do Código Penal torna-se uma realidade palpável.
A extraterritorialidade condicionada permite a punição de brasileiros por crimes cometidos fora do país, desde que entrem em território nacional e que o fato seja punível em ambos os países (dupla tipicidade).
- Relevância Prática: Um brasileiro que promova stalking ou ameaças graves a líderes religiosos no exterior e retorne ao Brasil pode ser processado aqui.
- Defesa e Soberania: A defesa deve atentar para o princípio do ne bis in idem (não ser punido duas vezes pelo mesmo fato) caso o agente já tenha sido julgado no estrangeiro.
O Papel Estratégico da Advocacia
Diante da nova legislação (Lei 14.532/23) e das regulações de armas (Decreto 11.615/23), a advocacia criminal não admite mais generalismos. O advogado que não souber diferenciar uma injúria simples de um racismo religioso, ou uma infração administrativa de transporte de arma de um crime de ameaça qualificada, colocará a liberdade de seu cliente em risco severo.
Seja na assistência de acusação, defendendo a integridade dos templos, ou na defesa técnica, garantindo o devido processo legal contra excessos punitivistas, o domínio da dogmática penal atualizada é o único caminho seguro.
Para dominar essas teses e a nova realidade legislativa, aprofunde-se com o Curso Lei de Preconceito Racial e mantenha-se à frente no mercado jurídico.
Insights Jurídicos
A recente Lei 14.532/2023 elevou a injúria religiosa ao patamar de racismo, tornando o delito inafiançável e imprescritível, o que altera drasticamente a estratégia de defesa e a atuação em flagrantes. Paralelamente, o Decreto 11.615/2023 impôs rigor administrativo ao transporte de simulacros e armas de pressão; o descumprimento dessas normas, somado a atos de ameaça (Art. 147 CP) em frente a templos, cria um cenário ideal para a decretação de prisões preventivas fundamentadas na garantia da ordem pública. A defesa deve focar na ausência de dolo específico e na taxatividade penal, enquanto a acusação possui agora um arsenal legislativo mais robusto para combater a intolerância.
Perguntas e Respostas
1. A nova lei de injúria racial (14.532/23) afeta casos de ofensas religiosas?
Sim. A nova legislação equiparou a injúria racial ao crime de racismo. Portanto, ofensas proferidas em razão da religião da vítima agora são consideradas crimes de racismo, sujeitos à inafiançabilidade e imprescritibilidade, com penas mais severas de 2 a 5 anos de reclusão.
2. O porte de arma de airsoft sem ponta laranja é crime?
Por si só, a ausência da ponta laranja e da documentação é uma irregularidade administrativa grave conforme o Decreto 11.615/2023, sujeita a multa e apreensão. No entanto, se esse artefato for usado para ameaçar alguém (simulando ser arma de fogo), configura-se o crime de ameaça (Art. 147 CP), e a irregularidade administrativa reforça a periculosidade da conduta na análise judicial.
3. O que é o Princípio da Lesividade neste contexto?
É o princípio que limita o poder punitivo do Estado, exigindo que a conduta do agente lesione ou exponha a perigo concreto um bem jurídico tutelado. A defesa pode usá-lo para argumentar que um protesto, mesmo que rude, não teve capacidade real de ferir a liberdade religiosa ou a paz pública, sendo, portanto, um fato atípico penalmente.
4. Brasileiros que cometem crimes de ódio religioso no exterior podem ser presos ao voltar ao Brasil?
Sim, com base no princípio da extraterritorialidade condicionada (Art. 7º, II, do CP). Se o fato for crime no país de origem e no Brasil, e preenchidos os demais requisitos legais (como a entrada do agente no território nacional e a não absolvição no estrangeiro), a lei brasileira pode ser aplicada.
5. Qual a diferença prática entre racismo religioso e injúria religiosa hoje?
Com a Lei 14.532/2023, a distinção prática quase desapareceu em termos de severidade. Ambos são tratados sob a sistemática da Lei de Racismo. A diferença técnica reside na direção da ofensa: a injúria ataca a honra subjetiva de pessoa determinada (ou grupo determinado) valendo-se da religião, enquanto o racismo clássico visa a segregação da coletividade. Ambos agora são inafiançáveis.
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Acesse a lei relacionada em Lei nº 7.716, de 5 de janeiro de 1989
Este artigo teve a curadoria da equipe da Legale Educacional e foi escrito utilizando inteligência artificial a partir do seu conteúdo original disponível em https://www.conjur.com.br/2025-dez-05/professor-da-usp-que-usou-arma-de-chumbinho-perto-de-sinagoga-nos-eua-e-detido/.