A impenhorabilidade do bem de família é um instituto jurídico previsto no ordenamento brasileiro que tem como objetivo proteger o imóvel residencial da entidade familiar, impedindo que este seja alvo de penhora judicial para pagamento de dívidas contraídas por um ou mais de seus integrantes. Trata-se de uma garantia legal que visa assegurar o direito fundamental à moradia, prioridade reconhecida pela Constituição Federal, conferindo proteção ao patrimônio mínimo essencial à dignidade das pessoas.
A impenhorabilidade está disciplinada principalmente na Lei número 8009 de 1990, que dispõe sobre a impenhorabilidade do bem de família e confere parâmetros legais para a sua aplicação. De acordo com esta lei, o imóvel residencial próprio do casal, ou da entidade familiar, é impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos pais ou filhos que sejam seus proprietários e nele residam, salvo nas exceções expressamente previstas.
A proteção conferida pelo instituto se aplica independentemente da existência de filhos, do regime de bens do casamento ou da união estável, abrangendo também as pessoas solteiras, viúvas ou divorciadas que utilizam o imóvel como sua residência permanente. Além disso, essa proteção legal pode se estender a imóveis urbanos e rurais, desde que destinados à residência da entidade familiar e não ultrapassem os limites definidos para caracterização do bem de família.
Ressalte-se que a impenhorabilidade do bem de família possui uma natureza legal e pode ser classificada em duas espécies distintas. A primeira é o bem de família legal, aquele previsto automaticamente pela Lei número 8009 de 1990, que protege o imóvel residencial sem necessidade de declaração formal ou registro específico. A segunda é o bem de família voluntário ou convencional, instituído de forma expressa por meio de escritura pública e registro em cartório de imóveis, conforme previsto nos artigos 1711 a 1722 do Código Civil brasileiro, no qual os proprietários destinam voluntariamente determinado imóvel à residência da família, registrando-o como bem de família.
Apesar da proteção ampla, existem exceções importantes nas quais o bem de família pode ser objeto de penhora. A própria Lei número 8009 de 1990 elenca algumas dessas hipóteses. Dentre as mais relevantes estão as dívidas decorrentes de financiamento do próprio imóvel, como por exemplo, a hipoteca vinculada à compra da casa, ou seja, quando o imóvel foi dado como garantia real ao financiamento que tornou possível sua aquisição. Outra exceção envolve as dívidas de pensão alimentícia, onde a jurisprudência entende que o direito alimentar prevalece sobre o direito à impenhorabilidade, considerando a natureza urgente e essencial da obrigação alimentar. Além disso, a impenhorabilidade também não se aplica aos casos em que o imóvel tenha sido adquirido com produto de crime ou em situações de fiança em contrato de locação, quando o fiador oferece o imóvel como garantia e há inadimplência por parte do locatário.
Importante destacar que a proteção do bem de família não está condicionada ao valor do imóvel, ou seja, mesmo imóveis de alto padrão podem ser protegidos pela impenhorabilidade, desde que preencham os requisitos legais, especialmente o uso habitual como residência da entidade familiar. Por outro lado, caso o imóvel esteja desocupado ou seja utilizado com finalidade comercial, não sendo possível comprovar sua destinação como residência, a impenhorabilidade poderá ser contestada judicialmente.
A jurisprudência brasileira tem consolidado o entendimento de que o bem de família constitui um importante instrumento de preservação da dignidade humana e da função social da propriedade, especialmente para famílias em situação de vulnerabilidade econômica. Em casos concretos, os tribunais têm interpretado a lei de maneira a ampliar a proteção residencial, levando em consideração o princípio constitucional da moradia como direito social.
Assim, a impenhorabilidade do bem de família exerce uma função essencial no sistema jurídico brasileiro, pois impede que indivíduos e famílias sejam privados de sua moradia por conta do acúmulo de dívidas, existindo apenas diante de situações estritamente legalmente previstas. Trata-se de um mecanismo de justiça social que busca equilibrar o interesse dos credores com a garantia de subsistência dos devedores, assegurando que o mínimo existencial, representado pela residência familiar, seja preservado mesmo em contextos de endividamento.