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Estrito cumprimento do dever legal

O estrito cumprimento do dever legal é uma excludente de ilicitude prevista no ordenamento jurídico brasileiro e tem como função afastar a responsabilização penal de uma pessoa que, ao praticar determinada conduta típica, agiu dentro dos limites impostos por uma obrigação legal decorrente de sua função, cargo ou dever. Trata-se de uma situação em que o agente realiza uma ação que, à primeira vista, seria considerada criminosa de acordo com o tipo penal, mas que, em razão de estar cumprindo uma obrigação legal, torna-se juridicamente permitida.

Previsto no artigo 23 do Código Penal brasileiro, ao lado da legítima defesa e do estado de necessidade, o estrito cumprimento do dever legal reconhece que determinadas funções exercidas no Estado exigem o uso da força ou a prática de atos que ordinariamente seriam considerados ilícitos. No entanto, sendo realizados em cumprimento a uma determinação legal ou no exercício regular de direito, tais atos não constituem infração penal, desde que dentro dos limites impostos pela legalidade.

Um dos exemplos mais clássicos dessa excludente é o do policial que, no exercício de sua função e com observância da legalidade, efetua a prisão de uma pessoa com uso de força moderada, quando necessário. Em condições normais, a privação da liberdade ou a constrição à integridade física seriam tipificadas penalmente como sequestro ou lesão corporal. No entanto, como essa conduta está amparada por dever legal e se dá dentro dos parâmetros do ordenamento jurídico, ela não é considerada criminosa.

Outro exemplo pode ser o do oficial de justiça que cumpre mandado judicial de busca e apreensão. Embora a entrada em domicílio sem consentimento do morador possa configurar crime de violação de domicílio, o cumprimento da ordem judicial exime o agente da ilicitude, desde que seja obedecida a legalidade estrita.

É importante ressaltar que o fundamento dessa excludente repousa na legalidade estrita da conduta. Isso significa que o agente deve agir dentro dos limites estabelecidos pela norma legal que fundamenta a sua atuação. Havendo excesso, ou seja, se o agente ultrapassa os limites do que é razoável e necessário à observância do dever, ele poderá ser responsabilizado penalmente, conforme prevê o artigo 23 parágrafo único do Código Penal. Caso, por exemplo, um policial haja com abuso de autoridade, praticando tortura ou violência desnecessária, não poderá invocar o estrito cumprimento do dever legal para se isentar da responsabilidade, visto que extrapolou a permissão legal.

Não se pode confundir o estrito cumprimento do dever legal com o exercício regular de direito, pois, embora ambos excluam a ilicitude, diferem quanto ao fundamento jurídico. No primeiro, a ação do agente é uma imposição da lei, ou seja, não há opção senão cumpri-la, ao passo que no segundo, há autorização do ordenamento para o exercício de determinado direito, como no caso de um professor que aplica medidas disciplinares proporcionais a um aluno ou um pai que corrige o filho com moderação.

Por fim, o estudo do estrito cumprimento do dever legal tem importância fundamental para o direito penal, pois reafirma o princípio da legalidade e assegura que o agente público ou particular cumpra seus deveres funcionais ou legais sem temor de sanção penal, desde que atue com respeito às balizas legais e em conformidade com os princípios do Estado Democrático de Direito. Isso garante a segurança jurídica nas ações daqueles que exercem função pública ou a quem foi atribuída determinada obrigação legal, promovendo o equilíbrio entre o poder legalmente exercido e os direitos fundamentais do cidadão.

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