Embargos de divergência são um tipo específico de recurso previsto no ordenamento jurídico brasileiro que tem como principal finalidade uniformizar o entendimento jurisprudencial dentro dos tribunais superiores, em especial no Superior Tribunal de Justiça (STJ) e no Supremo Tribunal Federal (STF). Esse recurso é utilizado quando se verifica que decisões tomadas por diferentes órgãos fracionários do mesmo tribunal, como turmas ou seções, apresentam interpretações conflitantes sobre a mesma questão de direito. Ou seja, são cabíveis quando há divergência entre julgamentos de recursos similares no âmbito de um mesmo tribunal, o que pode causar insegurança jurídica e comprometer a coerência dos precedentes.
O fundamento legal dos embargos de divergência está previsto nos regimentos internos dos tribunais superiores e no Código de Processo Civil. Entretanto, mais do que a mera existência de decisões distintas, é necessário que a parte interessada comprove a efetiva divergência entre os julgados. Para isso, é exigida a apresentação de acórdãos válidos e contemporâneos nos quais se demonstre claramente que há posições diferentes adotadas sobre a mesma matéria, sendo indispensável que a similitude fática e jurídica das causas esteja presente.
A tramitação dos embargos de divergência é especialmente técnica. Primeiro, o relator verifica se estão preenchidos os requisitos de admissibilidade, entre eles a comprovação da divergência e a pertinência do recurso. Caso sejam admitidos, os embargos poderão ser julgados por um órgão colegiado ampliado do tribunal, como por exemplo a sessão ou o plenário, a depender da organização interna da corte. O objetivo dessa estrutura é garantir que a decisão que venha a prevalecer seja suficientemente representativa da orientação majoritária do tribunal, promovendo a segurança jurídica e a isonomia no julgamento de causas semelhantes.
Cabe destacar que os embargos de divergência não têm efeito suspensivo automático. Isso significa que, em regra, a decisão anteriormente proferida continua eficaz enquanto não houver nova deliberação sobre o tema. Além disso, a sua interposição está limitada a certas hipóteses específicas. No STJ, por exemplo, é possível interpor embargos de divergência contra o acórdão de uma das turmas que divergir da jurisprudência consolidada em outra turma ou na seção. No STF, costumam ser cabíveis quando uma das turmas do tribunal profere decisão que colida com outra decisão de turma ou do plenário acerca de questão constitucional.
Outro ponto importante é que os embargos de divergência não são dirigidos ao julgamento do mérito da causa propriamente dito, mas sim à correção da interpretação jurídica adotada. Por isso, não se trata de reexame de provas ou de uma nova avaliação da situação fática do caso concreto. O que está em jogo é a consolidação de uma compreensão uniforme sobre uma determinada norma jurídica, a fim de evitar que situações idênticas recebam tratamentos diferentes.
A interposição dos embargos de divergência também está sujeita a prazos e formalidades rigorosas, como a demonstração analítica da divergência, a transcrição dos trechos conflitantes e a indicação precisa dos fundamentos jurídicos em que cada decisão baseou-se. A ausência desses requisitos pode acarretar a sua rejeição liminar.
Por fim, é relevante observar que os embargos de divergência têm papel estratégico na conformação da jurisprudência dos tribunais superiores. Em um sistema jurídico baseado em precedentes, como é o caso brasileiro desde a introdução de institutos como o julgamento por repercussão geral e o recurso repetitivo, manter a coesão interna das decisões judiciais é fundamental. Por meio desse recurso, busca-se assegurar a previsibilidade das decisões judiciais, o tratamento isonômico das partes e a confiança dos jurisdicionados no sistema de justiça. Dessa forma, os embargos de divergência constituem um instrumento técnico refinado à disposição dos operadores do direito para o aprimoramento da jurisprudência e a estabilidade do ordenamento jurídico.