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Direito ao Esquecimento: Desafios e Impactos no Brasil

Artigo de Direito

O Direito ao Esquecimento no Ordenamento Jurídico Brasileiro

Introdução

O direito ao esquecimento vem ganhando relevância no debate jurídico global, particularmente em virtude de seu impacto nas liberdades individuais e no direito à privacidade. No Brasil, esse tema tornou-se ainda mais visível após o julgamento do Tema 786 pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Essa discussão abrange complexidades que vão além de proteger informações privadas; envolve ponderações entre liberdades de expressão e informação. Esta análise busca oferecer uma visão aprofundada sobre o direito ao esquecimento, suas implicações legais, e seu tratamento no Brasil.

Conceito e Origem do Direito ao Esquecimento

O direito ao esquecimento pode ser entendido como o direito de um indivíduo de impedir que fatos, que não são mais de interesse público e que podem prejudicar sua reputação, sejam permanentemente lembrados ou acessíveis por meio de uma simples busca na internet. Embora o conceito tenha raízes históricas na busca pela proteção da honra e imagem das pessoas, seu reconhecimento formal é recente e está relacionado à era digital.

Na União Europeia, o direito ao esquecimento ganhou notoriedade com a sentença proferida pelo Tribunal de Justiça da União Europeia no caso Google Spain vs. AEPD e Mario Costeja González, que estabeleceu que motores de busca como o Google são responsáveis pelo processamento de dados pessoais que aparecem nas páginas da web.

O Direito ao Esquecimento no Brasil

No Brasil, o direito ao esquecimento não está consagrado de forma explícita na legislação existente. No entanto, princípios relacionados ao direito à privacidade e proteção dos dados pessoais podem servir de base para seu reconhecimento. A Constituição Federal de 1988, em seus artigos 5º, inciso X e XII, protege a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, estabelecendo uma diretriz para o tratamento desse direito no ordenamento jurídico nacional.

Jurisprudência e Legalidade

A jurisprudência brasileira tem, em diversas ocasiões, tratado do direito ao esquecimento, especialmente em casos que envolvem a transmissão de notícias antigas que possam prejudicar a pessoa em questão. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) discutiu amplamente o tema em casos como o de Aída Curi, onde se buscava vedar a exposição midiática de crimes ocorridos há décadas, que teve resultado desfavorável ao pedido de esquecimento.

Com a chegada do julgamento do Tema 786 pelo STF, a discussão tomou novos rumos, pois foi considerada uma questão de repercussão geral. O STF decidiu que o direito ao esquecimento é incompatível com a Constituição Federal, especialmente no que tange à liberdade de expressão e acesso à informação. Essa decisão trouxe importantes clarificações sobre a aplicação desse direito no Brasil.

Liberdade de Expressão versus Direito à Privacidade

Um dos maiores desafios associados ao direito ao esquecimento é o equilíbrio entre o direito à privacidade e a liberdade de expressão. A liberdade de expressão, consagrada pela Constituição, permite a divulgação de informações verídicas e de interesse público. Contudo, esta liberdade não é absoluta e deve ser exercida de maneira a não violar outros direitos fundamentais.

Ponderação de Interesses

A ponderação de interesses entre liberdade de expressão e o direito à privacidade deve ser feita caso a caso, considerando fatores como o interesse público na manutenção da memória histórica e o potencial dano à honra ou reputação do indivíduo. Assim, juízes e tribunais buscam um meio-termo que respeite ambos os direitos, sem sobrepor um ao outro.

A decisão do STF sobre o Tema 786 sublinhou a importância de não se criar um poder de controle absoluto sobre informações no espaço público, destacando que a memória e o histórico público têm um papel importante na sociedade democrática.

A Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) e o Direito ao Esquecimento

Com a promulgação da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), o debate acerca do direito ao esquecimento ganhou novos contornos. A LGPD estabelece diretrizes sobre o tratamento de dados pessoais, oferecendo instrumentos que, indiretamente, podem se relacionar ao direito ao esquecimento.

Princípios da LGPD

A LGPD enfatiza princípios que garantem que o tratamento de dados pessoais seja feito de forma a respeitar a privacidade dos titulares dos dados. Os princípios de finalidade, adequação, necessidade, e livre acesso estão entre os que oferecem uma base para a reivindicação do direito ao esquecimento, especialmente quando os dados em questão não atendem mais aos requisitos para serem mantidos ou compartilhados.

A lei também prevê o direito à eliminação de dados desnecessários ou excessivos, que pode ser invocado nos pedidos de esquecimento, sobretudo quando os dados armazenados não possuem mais relevância para serem mantidos.

Considerações Finais

O direito ao esquecimento representa um dos dilemas jurídicos contemporâneos mais complexos, cercado de debates sobre direitos fundamentais em conflito. No Brasil, apesar da decisão do STF não reconhecer de forma absoluta este direito, as fundamentações jurídicas do direito à privacidade e proteção de dados continuam a oferecer proteção aos indivíduos em situações específicas.

É provável que o debate sobre o direito ao esquecimento continue a evoluir, acompanhado pelo progresso tecnológico e mudanças sociais. Profissionais de Direito devem estar preparados para equilibrar e interpretar as normativas existentes, diante das demandas por mais privacidade, sem ignorar o imperativo de uma sociedade informada e composta por indivíduos que respeitam e protegem os direitos dos outros.

A compreensão e interpretação dos limites do direito ao esquecimento são cruciais para a prática jurídica moderna, uma vez que novas questões e desafios continuarão a surgir, exigindo um conhecimento atualizado e bem fundamentado sobre o tema.

Aprofunde seu conhecimento sobre o assunto na Wikipedia.

Acesse a lei relacionada em Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD)

Este artigo teve a curadoria de Marcelo Tadeu Cometti, CEO da Legale Educacional S.A. Marcelo é advogado com ampla experiência em direito societário, especializado em operações de fusões e aquisições, planejamento sucessório e patrimonial, mediação de conflitos societários e recuperação de empresas. É cofundador da EBRADI – Escola Brasileira de Direito (2016) e foi Diretor Executivo da Ânima Educação (2016-2021), onde idealizou e liderou a área de conteúdo digital para cursos livres e de pós-graduação em Direito.

Graduado em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP, 2001), também é especialista em Direito Empresarial (2004) e mestre em Direito das Relações Sociais (2007) pela mesma instituição. Atualmente, é doutorando em Direito Comercial pela Universidade de São Paulo (USP).Exerceu a função de vogal julgador da IV Turma da Junta Comercial do Estado de São Paulo (2011-2013), representando o Governo do Estado. É sócio fundador do escritório Cometti, Figueiredo, Cepera, Prazak Advogados Associados, e iniciou sua trajetória como associado no renomado escritório Machado Meyer Sendacz e Opice Advogados (1999-2003).

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