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Desistência voluntária

Desistência voluntária é um instituto jurídico previsto no âmbito do Direito Penal, especificamente relacionado à teoria do crime, mais precisamente à fase da execução do delito. Trata-se de uma causa de exclusão da consumação de um crime quando o agente, de forma espontânea e voluntária, interrompe a execução do delito que havia iniciado, impedindo sua consumação. A doutrina e a legislação penal brasileira tratam da desistência voluntária com o intuito de valorizar o arrependimento eficaz por parte do agente, evitando a punição por crime consumado mesmo após a tentativa ter sido iniciada.

De acordo com o artigo 15 do Código Penal Brasileiro, o agente que, voluntariamente, desiste de prosseguir na execução ou impede que o resultado se produza, responde apenas pelos atos já praticados. Isso significa que se uma pessoa começa a executar um crime, mas decide, de sua livre vontade, não levá-lo adiante, ela não será responsabilizada pelo crime que pretendia cometer inicialmente, mas apenas pelos atos que já ocorreram no decorrer da execução, desde que esses atos constituam infrações penais autônomas.

É importante destacar que, para que haja a caracterização da desistência voluntária, é essencial que a interrupção do ato criminoso ocorra de maneira espontânea e voluntária. A espontaneidade diz respeito à ausência de fatores externos que motivem a desistência, como, por exemplo, a chegada de autoridades policiais ou a impossibilidade de consumação do crime. Já a voluntariedade refere-se à intenção consciente e livre do agente de não prosseguir na prática do delito, devendo a motivação partir exclusivamente de sua vontade interna.

A diferença entre desistência voluntária e tentativa frustrada é fundamental para a aplicação do direito penal de forma justa e proporcional. Na tentativa, o agente realiza todos os atos executórios necessários para a consumação do crime, mas esta não se concretiza por circunstâncias alheias à sua vontade, como por exemplo um erro no uso dos meios empregados ou intervenção de terceiros. Nessa hipótese, o agente responde pelo crime tentado. Já na desistência voluntária, a interrupção é resultado da própria iniciativa do autor, e por isso ele não será responsabilizado pelo crime tentado, mas somente pelos atos praticados que, eventualmente, configurem outro ilícito penal.

Além disso, a desistência voluntária distingue-se do arrependimento eficaz. No primeiro caso, como já mencionado, o agente desiste de continuar a execução do crime antes que ele se consume. Já no arrependimento eficaz, o agente se empenha ativamente, após concluir os atos executórios, para evitar a produção do resultado final, sendo bem-sucedido em sua ação. Assim como na desistência voluntária, no arrependimento eficaz o agente também responderá apenas pelos atos praticados.

Outro ponto relevante é que a desistência voluntária é um benefício concedido ao autor do fato como forma de estimular a retratação de sua conduta criminosa, promovendo uma política criminal voltada à prevenção e à reparação dos danos sociais que um crime consumado pode causar. Dessa forma, o ordenamento jurídico valoriza a conduta do agente que demonstra uma mudança de atitude ao evitar que o resultado lesivo se concretize.

Cumpre ressaltar ainda que nem todo crime comporta desistência voluntária. No caso de crimes unissubsistentes, ou seja, aqueles que se realizam com um único ato, não há que se falar em desistência voluntária, uma vez que não há um intervalo de tempo entre o início e o fim da execução em que o agente possa mudar de ideia e interrompê-la. Exemplo disso seria o crime de injúria proferida verbalmente de forma instantânea.

Por fim, a configuração da desistência voluntária deve ser devidamente analisada caso a caso, à luz dos elementos objetivos da conduta do agente e das circunstâncias fáticas que envolvem o fato. Juízes, promotores e defensores públicos devem considerar não apenas a interrupção da execução, mas principalmente a motivação dessa interrupção. Se restar demonstrado que a desistência decorreu de fatores externos ou de dificuldades imprevistas, não se estará diante da figura jurídica ora descrita, mas sim de uma tentativa de crime punível.

Portanto, a desistência voluntária é um importante instrumento do Direito Penal que possibilita ao agente do crime uma forma de se afastar da consumação do delito, sendo responsabilizado apenas pelos atos já praticados. É uma expressão de política criminal que busca premiar atitudes de autocontenção e prevenção de danos, dentro de uma perspectiva de justiça e humanidade na aplicação da norma penal.

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