Denunciação caluniosa é um crime previsto no Código Penal Brasileiro, tipificado no artigo 339, que consiste em acusar falsamente alguém da prática de um crime perante autoridade competente, sabendo que a pessoa é inocente, com a intenção de prejudicá-la. Trata-se de uma conduta dolosa, isto é, exige-se que o agente tenha plena consciência da falsidade da imputação e atue com o propósito deliberado de causar dano ao denunciado. O bem jurídico protegido por esse tipo penal é a administração da justiça, tendo como objetivo assegurar a correta persecução penal e impedir que o sistema de justiça criminal seja manipulado por interesses pessoais, caprichos ou vinganças.
Para que se configure a denunciação caluniosa é necessário que a falsa imputação seja levada a conhecimento de autoridade pública, ou seja, de um órgão estatal que tenha poder de investigação ou de propositura de ação penal, como polícia, Ministério Público ou juiz. A simples comunicação mentirosa a particulares ou a autoridades sem atribuição para apurar não caracteriza o crime. Além disso, é imprescindível que a falsa imputação seja de um fato definido como crime. Se a falsa denúncia versa sobre fato que não é considerado crime, mas sim infração administrativa ou disciplinar, a conduta poderá ser enquadrada em outros tipos penais, como comunicação falsa de crime ou contravenção, mas não será considerada denunciação caluniosa em sentido estrito.
A consumação desse delito ocorre no momento em que a falsa imputação é recebida pela autoridade competente, independentemente da instauração de inquérito policial ou do oferecimento da denúncia pelo Ministério Público. Assim, não é necessário que o denunciado venha a responder a processo, tampouco que sofra qualquer punição; basta que o autor tenha dado início, com dolo, a um procedimento oficial baseado em informações falsas. Por outro lado, caso o denunciado já tenha cometido o crime e o autor da comunicação apenas deseje incriminá-lo por outro fato incorreto ou agravar sua situação, não se configura a denunciação caluniosa, mas eventualmente poderá haver outro tipo penal envolvido.
A pena prevista para o crime de denunciação caluniosa é de reclusão de dois a oito anos, além de multa, podendo ser aumentada, por exemplo, se o autor da denúncia utilizar anonimato ou nome falso, ou ainda se resultar em privação de liberdade do inocente. Pode haver aumento de pena também se a imputação resultar na instauração de processo judicial. Por se tratar de crime de forma livre, a denunciação caluniosa pode ser praticada por qualquer meio, inclusive por meio de documentos falsos, declarações orais, mensagens eletrônicas ou utilização das redes sociais. Devido a essa amplitude, exige-se do julgador extremo cuidado na apuração dos elementos subjetivos, em especial no tocante à intenção do agente, distinguindo-se a calúnia dolosa da mera comunicação equivocada ou do erro de fato, que não são puníveis penalmente.
Importante destacar que a denunciação caluniosa difere da calúnia comum, prevista no artigo 138 do Código Penal. Enquanto na calúnia o ofendido é diretamente lesado pela imputação falsa de crime perante terceiros, sem necessariamente envolver a autoridade pública, na denunciação caluniosa o foco está na instrumentalização do aparato estatal com acusações falsas, interferindo no serviço judiciário e colocando em risco a liberdade e a honra de pessoas inocentes. Também difere de crimes como comunicação falsa de crime ou contravenção, infração de menor gravidade prevista no artigo 340 do Código Penal, em que o agente comunica falsamente a existência de infração penal, mas sem apontar alguém específico como autor.
A jurisprudência dos tribunais superiores brasileiros tem se mostrado atenta à gravidade do crime de denunciação caluniosa diante das consequências que pode acarretar para a vítima e para a credibilidade do sistema judicial. Diversas decisões enfatizam a necessidade de comprovação do dolo específico em prejudicar outrem com a falsa denúncia e a absoluta inocência do acusado. Quando a denúncia tem algum fundamento ou base em fatos que indicam plausivelmente a autoria, ainda que venha a ser arquivada posteriormente por insuficiência de provas, não se admite a responsabilização criminal do denunciante por denunciação caluniosa.
Em síntese, o crime de denunciação caluniosa representa uma grave violação ao funcionamento regular da justiça e aos direitos individuais, especialmente considerando que pode expor pessoas inocentes ao constrangimento, à perda de liberdade e ao descrédito social. A sua punição busca, portanto, prevenir o uso indevido do sistema penal como instrumento de perseguição ou vingança, reforçando o compromisso do ordenamento jurídico com a ética e a verdade no trato das questões criminais.