A declaração de utilidade pública é um instrumento jurídico amplamente utilizado no direito administrativo brasileiro que confere ao poder público a possibilidade de intervir em propriedades privadas, considerando a sua destinação para finalidades de interesse coletivo. Essa declaração é prevista pela Constituição Federal e regulamentada por leis ordinárias e por normas administrativas, sendo vinculada diretamente ao princípio da supremacia do interesse público sobre o privado, um dos pilares do regime jurídico administrativo.
O principal objetivo da declaração de utilidade pública é identificar bens ou propriedades que possam ser expropriados ou afetados por políticas públicas que visem o bem-estar da sociedade, como a construção de obras de infraestrutura, prestação de serviços essenciais, preservação ambiental, ou mesmo projetos culturais, educacionais e de saúde. Ao identificar uma necessidade coletiva que só pode ser atendida por meio da utilização de determinada propriedade privada, o Estado pode lançar mão da declaração de utilidade pública como requisito fundamental para o processo de desapropriação.
A declaração de utilidade pública, no entanto, não significa, de forma automática, a transferência obrigatória do bem ou sua posse para o poder público. Ela serve, inicialmente, para caracterizar que determinado bem é indispensável para a execução de uma política ou de um projeto de interesse geral. Uma vez declarada a utilidade pública, inicia-se o processo de desapropriação, que deve respeitar o devido processo legal, garantindo ao proprietário o direito à compensação financeira justa e prévia, conforme estabelece o artigo 5°, inciso XXIV, da Constituição Federal. O valor da indenização, em regra, é definido a partir de critérios técnicos e legais, buscando refletir o preço de mercado do objeto desapropriado.
Essa declaração abrange tanto bens móveis quanto imóveis, e pode se dar nos âmbitos federal, estadual ou municipal, dependendo da competência da entidade administrativa interessada. Além disso, pode ser promovida não apenas pela Administração Pública Direta, mas também por concessionárias e permissionárias de serviço público, desde que haja autorização legal para tanto, uma vez que a finalidade é atender interesses coletivos ou direitos difusos.
Embora o fundamento da declaração de utilidade pública seja legítimo, sua aplicação exige cautela e responsabilidade por parte dos agentes públicos envolvidos. Para que a declaração seja válida, é imprescindível que obedeça aos princípios constitucionais que regem a atuação da Administração Pública, como a legalidade, a impessoalidade, a moralidade, a publicidade e a eficiência. Em caso de abuso de poder ou desvio de finalidade, a declaração pode ser contestada judicialmente, com possibilidade de reversão ou até mesmo nulidade do processo de desapropriação.
Além disso, é importante ressaltar que a declaração de utilidade pública não deve ser confundida com a declaração de interesse social, embora ambas sirvam como fundamentos para desapropriações. Enquanto a utilidade pública refere-se mais amplamente a situações em que o Estado precisa de um bem para realizar projetos de interesse direto da coletividade, a declaração de interesse social está geralmente vinculada a questões relacionadas à reforma agrária, habitação, regularização fundiária urbana e outros fins específicos voltados à promoção da justiça social.
Portanto, a declaração de utilidade pública é um mecanismo relevante para viabilizar ações governamentais em prol da sociedade, mas requer um equilíbrio entre os direitos individuais e os interesses coletivos. Seu uso demanda transparência, planejamento e respeito às garantias fundamentais, a fim de que sua aplicação efetivamente contribua para o desenvolvimento social, econômico e sustentável do país. Esse dispositivo é um reflexo direto da função social da propriedade, consolidando a ideia de que a propriedade privada deve atender não apenas a interesses individuais, mas também ao bem-estar coletivo quando devidamente justificado e regulamentado.