Ação negatória de paternidade é uma medida judicial utilizada para desconstituir o vínculo legal de paternidade entre um suposto pai e uma criança ou adolescente, quando houver provas suficientes de que o indivíduo apontado como pai biológico não possui, de fato, tal condição. Essa ação é regulada pelo direito de família no âmbito do ordenamento jurídico brasileiro e tem como principal objetivo não só a busca da verdade biológica, mas também a proteção de interesses jurídicos e sociais, como os direitos da personalidade e as implicações decorrentes do status de parentesco.
Esse tipo de ação é tipicamente ajuizado pelo pai registral, ou seja, pelo homem que consta no registro civil como pai da criança. A iniciativa pode ocorrer em diversas circunstâncias, como erro, omissão ou má-fé na declaração inicial da paternidade. Por exemplo, situações em que o reconhecimento tenha ocorrido com base em informações equivocadas, sem convicção ou sob pressão pessoal ou social.
Importante destacar que a ação negatória de paternidade está diretamente relacionada à necessidade de descaracterização do vínculo jurídico estabelecido no âmbito do registro civil. Esse vínculo, em regra, possui presunção de veracidade, razão pela qual cabe à parte interessada apresentar elementos probatórios consistentes para fundamentar sua pretensão. Um dos principais meios probatórios utilizados para essa finalidade é o exame de DNA, cuja confiabilidade científica é amplamente reconhecida. Tal exame pode confirmar ou afastar a existência de vínculo biológico entre as partes envolvidas.
No entanto, a questão não se limita ao aspecto biológico. É também essencial analisar as implicações socioafetivas que podem advir do vínculo estabelecido. Em muitos casos, o vínculo afetivo formado entre pai e filho transcende a questão biológica, tendo natureza jurídica e relevância para a manutenção da relação familiar. Esse entendimento fundamenta o princípio da paternidade socioafetiva, amplamente reconhecido no direito brasileiro, que se baseia na convivência e no afeto consolidado ao longo do tempo, independentemente da ausência de vínculo biológico. Assim, o reconhecimento de um vínculo afetivo pode impactar a viabilidade da ação negatória de paternidade, pois a relação socioafetiva pode ser considerada inquebrantável, dependendo do caso concreto.
O prazo para ajuizamento da ação merece atenção especial, especialmente em casos em que o pai registral realizou o reconhecimento de forma espontânea. De acordo com o artigo 1.601 do Código Civil Brasileiro, o prazo para contestar a paternidade é de dois anos contados do momento em que o suposto pai teve ciência da falsidade ou da ausência de vínculo biológico. Contudo, nos casos em que houver alegação de vício de consentimento, como fraude ou coação, esse prazo pode ter interpretação diferenciada conforme a análise do contexto em questão. Além disso, o Superior Tribunal de Justiça tem reconhecido que o direito de defesa da verdade biológica está relacionado à dignidade da pessoa humana, o que pode flexibilizar ou relativizar a aplicação do prazo decadencial dependendo das circunstâncias do caso.
Outra questão que pode surgir no bojo de uma ação negatória de paternidade diz respeito aos direitos da criança ou do adolescente envolvido. Estes possuem proteção integral diante do ordenamento jurídico e têm sua dignidade e interesse superior como elementos prioritários na resolução do conflito. O juiz do caso deve observar se a eventual sentença de procedência – ou seja, que desconstitui o vínculo de paternidade – não violará direitos fundamentais da criança ou do adolescente, como o direito ao nome, à filiação e aos alimentos. Além disso, em alguns casos, pode ser necessário ouvir a criança, sempre com o devido respeito a sua idade e maturidade.
A desconstituição do vínculo de paternidade, se acolhida, gera também efeitos jurídicos relevantes. Entre os mais recorrentes estão a alteração do registro civil, retirando o nome do suposto pai e, em alguns casos, dos avós paternos, bem como o afastamento de direitos e deveres decorrentes do vínculo de parentalidade, como herança e pensão alimentícia. Contudo, cabe ponderar que, caso seja comprovado um vínculo socioafetivo significativo, esses efeitos podem ser mitigados.
Em suma, a ação negatória de paternidade é um importante instrumento jurídico que visa garantir a verdade biológica e, também, respeitar os diversos vínculos que compõem a relação familiar contemporânea. Seu julgamento exige uma análise criteriosa de todos os elementos envolvidos, incluindo aspectos biológicos, afetivos e legais, a fim de alcançar uma solução justa e compatível com os princípios basilares da dignidade humana e do interesse superior da criança.