Vício do consentimento é um termo jurídico utilizado no Direito Civil para descrever situações em que o consentimento dado por uma das partes em um negócio jurídico não é plenamente válido em razão de algum defeito que afetou a sua formação. Em outras palavras, mesmo que a manifestação de vontade tenha ocorrido, ela não foi livre ou plenamente consciente, sendo influenciada por circunstâncias que comprometem sua integridade e legitimidade. Os vícios do consentimento têm como consequência a possibilidade de anulação do negócio jurídico afetado, pois atentam contra a autonomia da vontade, princípio fundamental do direito contratual e dos atos civis em geral.
No ordenamento jurídico brasileiro, os vícios do consentimento estão previstos no Código Civil, principalmente nos artigos que tratam dos defeitos do negócio jurídico. De acordo com a legislação, são considerados vícios do consentimento o erro, o dolo, a coação, o estado de perigo e a lesão. Cada um desses vícios compromete de forma distinta a formação do consentimento, podendo gerar consequências específicas no âmbito do direito obrigacional e contratual.
O erro ocorre quando uma das partes tem uma falsa percepção da realidade ao manifestar seu consentimento. Para que o erro seja relevante juridicamente, ele deve ser essencial, ou seja, deve recair sobre ponto principal do negócio e influenciar substancialmente a vontade do declarante. Por exemplo, se uma pessoa compra um imóvel acreditando que ele está localizado em determinada região e essa informação estiver errada, configurando um equívoco essencial, é possível alegar a existência de um vício do consentimento por erro.
O dolo consiste na utilização de artifícios ou manobras dolosas por uma das partes com o intuito de induzir ou manter a outra em erro, levando-a a celebrar um negócio jurídico que, de outra forma, não realizaria. Nesse caso, a vontade é contaminada pela má-fé de um dos envolvidos. O dolo pode ser principal ou acidental, dependendo da intensidade da sua influência na decisão da parte enganada. O dolo principal é aquele que, sem sua presença, o negócio não teria sido realizado, enquanto o dolo acidental não interfere diretamente na celebração, apenas influencia em termos acessórios.
A coação é caracterizada pela imposição de uma ameaça grave e injusta à parte, restringindo-lhe a liberdade de decisão. A pessoa coagida pratica um ato sob o domínio do medo, e sua declaração de vontade é viciada por essa pressão. Para que a coação seja considerada vício do consentimento, é necessário que a ameaça tenha sido suficientemente grave a ponto de influenciar uma pessoa de sensibilidade razoável. Caso contrário, não se configura a coação jurídica relevante.
O estado de perigo se configura quando alguém, premido pela necessidade de salvar a si mesmo ou a pessoa de sua família de grave dano conhecido pela outra parte, assume obrigação excessivamente onerosa. Trata-se de uma situação de vulnerabilidade extrema, onde o consentimento é obtido em condições injustas, explorando a aflição do contratante. Assim, a vontade não é verdadeiramente livre, justificando a possibilidade de revisão ou anulação do negócio.
A lesão ocorre quando uma parte, em razão de sua inexperiência ou da premente necessidade, se obriga a uma prestação manifestamente desproporcional à contraprestação recebida. Nessas situações, o vício não está na ausência total de vontade, mas na exploração de uma desvantagem evidente decorrente da situação de debilidade do contratante prejudicado. A lesão permite ao prejudicado pedir a revisão do contrato ou sua anulação, conforme o grau de desproporção identificado.
É importante destacar que o reconhecimento do vício do consentimento não determina automaticamente a nulidade do negócio jurídico, mas sim sua anulabilidade. A parte prejudicada tem o direito de pleitear em juízo a anulação, respeitando os prazos prescricionais estabelecidos pela legislação vigente. Caso não haja manifestação nesse sentido dentro do prazo legal, o negócio jurídico permanece válido.
Em síntese, o vício do consentimento é uma figura jurídica relevante para assegurar a justiça nas relações contratuais e prevenir abusos. Ele protege a livre manifestação de vontade, valorizando a consciência, a informação e a autonomia dos indivíduos nas relações jurídicas. O instituto visa garantir que os negócios celebrados reflitam de fato a real intenção das partes, sendo instrumento fundamental para a estabilidade e legitimidade das relações civis e comerciais.