Poliamor é um conceito que descreve a possibilidade de uma pessoa manter relacionamentos afetivos e/ou sexuais consensuais com mais de um parceiro ao mesmo tempo, com o conhecimento e consentimento de todos os envolvidos. Ao contrário do adultério ou infidelidade, o poliamor é baseado na honestidade, na comunicação aberta e na negociação entre as partes, sendo uma prática que se distingue das relações convencionais monogâmicas por sua ênfase na transparência e no respeito mútuo.
Do ponto de vista jurídico, o poliamor apresenta desafios significativos nos ordenamentos jurídicos que estabelecem a monogamia como requisito para o casamento civil e outras formas legais de união. No Brasil, por exemplo, embora não exista uma lei que proíba expressamente o poliamor, a Constituição Federal e o Código Civil adotam a monogamia como base do casamento e da união estável. É comum que apenas duas pessoas possam formalizar uma união legal com efeitos jurídicos plenos, tais como direitos de herança, pensão alimentícia, guarda compartilhada, entre outros.
Apesar dessas limitações legais, algumas situações de união poliafetiva têm chegado aos tribunais, especialmente quando envolvem disputas por herança, partilha de bens ou direitos de família. Em alguns poucos casos, cartórios brasileiros chegaram a registrar uniões poliafetivas em escrituras públicas de união estável, embora tais registros não assegurem efeitos legais plenos e tenham suscitado grande controvérsia jurídica e social. Tais escrituras são mais simbólicas do que efetivamente reconhecidas pelo Estado como produtoras de direito.
A jurisprudência ainda é incipiente e dividida sobre o reconhecimento jurídico do poliamor. Muitos juristas argumentam que a monogamia ainda é uma cláusula estrutural do direito de família e qualquer relação que contrarie esse princípio não pode gozar da proteção jurídica prevista para casamentos ou uniões estáveis. Por outro lado, há quem defenda que o Estado não deve interferir nas escolhas afetivas dos indivíduos, desde que as relações sejam pautadas pela dignidade da pessoa humana, igualdade e livre manifestação da vontade.
O debate sobre poliamor no campo do direito também se conecta com discussões amplas sobre as novas configurações familiares e a pluralidade das relações afetivas na contemporaneidade. Conceitos jurídicos clássicos como entidade familiar, convivência, responsabilidade parental e afeto estão sendo constantemente revisitados à luz das transformações sociais, e o poliamor entra nesse contexto como uma provocação à forma como o direito regula a vida privada dos indivíduos.
Além disso, o poliamor levanta questões sobre o exercício de direitos sexuais e reprodutivos, liberdade de associação e o reconhecimento de novos arranjos de cuidado e solidariedade. No campo dos direitos humanos, é possível sustentar que o respeito à autodeterminação pessoal e à diversidade afetiva exige do Estado uma atitude de neutralidade em relação aos modelos de relacionamento que os cidadãos escolhem livremente adotar.
Em suma, o poliamor é uma prática relacional múltipla e consensual que desafia os marcos tradicionais do direito de família. Sua existência e visibilidade crescente levantam questões éticas, sociais e jurídicas importantes sobre o reconhecimento de novas formas de afeto e convivência. Embora o ordenamento jurídico brasileiro ainda não contemple mecanismos de proteção claros e específicos para essas relações, o debate está em expansão no âmbito doutrinário, legislativo e jurisprudencial, refletindo as mudanças culturais e comportamentais da sociedade contemporânea.