Bem de família é um instituto jurídico previsto no ordenamento brasileiro que tem como principal finalidade garantir proteção ao patrimônio mínimo de uma pessoa ou família, evitando que determinados bens sejam atingidos por eventual execução judicial decorrente de dívidas. Esse mecanismo visa preservar a moradia e as condições de vida digna do núcleo familiar, garantindo que situações de crise ou inadimplência não resultem na completa desestruturação patrimonial e social do devedor.
No Brasil, o bem de família pode ser classificado como legal ou voluntário. O bem de família legal é regulamentado pela Lei n° 8009 de 1990, que estabelece que o imóvel utilizado como residência da entidade familiar é, por natureza, impenhorável, salvo em algumas hipóteses excepcionais previstas na própria lei. Dessa forma, esse imóvel não pode ser alvo de penhora para pagamento de dívidas contraídas pelo núcleo familiar ou por um de seus membros, salvo nos casos de obrigações relacionadas a pagamento de tributos incidentes sobre o próprio bem, despesas condominiais, financiamento para sua aquisição ou hipoteca dada em garantia. Isso significa que o bem de família legal é instituído automaticamente e independe de qualquer manifestação expressa do proprietário.
Por outro lado, o bem de família voluntário ocorre quando o próprio titular do bem, por meio de um ato formal, como escritura pública registrada no cartório de registro de imóveis, destina determinado patrimônio para essa finalidade de proteção. Esse tipo de bem de família está disciplinado nos artigos 1711 a 1722 do Código Civil e requer uma manifestação de vontade expressa do constituinte. Os limites para o valor do bem e para os efeitos dessa instituição estão delineados na legislação, que visa coibir eventuais fraudes ou abusos.
A impenhorabilidade do bem de família, exceto nas hipóteses autorizadas por lei, é um reflexo do princípio da dignidade da pessoa humana, consagrado pela Constituição Federal de 1988. Está associada à ideia de que o Estado deve garantir condições mínimas para a manutenção da vida digna, especialmente no que se refere ao direito fundamental à moradia. No entanto, é importante ressaltar que o instituto não deve ser utilizado como um mecanismo para frustrar credores de boa-fé. Por isso, a lei e a jurisprudência apresentam limites claros para a aplicação do instituto, de modo a buscar um equilíbrio entre a proteção da moradia e o direito dos credores.
O conceito de entidade familiar assumido para a aplicação do bem de família é amplo, abarcando não apenas o modelo tradicional de família baseado no matrimônio entre homem e mulher, mas também outras formas contemporâneas de convivência familiar, como uniões estáveis, famílias monoparentais e outras configurações reconhecidas pela legislação brasileira. Essa abrangência reflete a evolução do direito de família e a adaptação do ordenamento jurídico às mudanças sociais.
Ademais, a proteção conferida pelo bem de família está diretamente atrelada ao imóvel principal utilizado como residência habitual. No entanto, a jurisprudência brasileira tem admitido interpretações mais flexíveis em casos excepcionais, como quando o imóvel protegido é alugado, e o valor recebido é utilizado exclusivamente como fonte de subsistência. De toda forma, cada situação é analisada com base nos aspectos específicos que a envolvem.
Portanto, o bem de família é um instrumento jurídico de relevante importância social, que equilibra os interesses dos devedores e dos credores, ao mesmo tempo em que fortalece os direitos fundamentais do indivíduo e da família. Ele atua como um verdadeiro mecanismo de justiça social ao assegurar proteção patrimonial essencial em situações de adversidade econômica, conferindo mais estabilidade e previsibilidade na preservação do mínimo existencial. Dessa forma, desempenha um papel significativo na consolidação de uma sociedade mais justa e igualitária.