A legitimidade do Poder Judiciário não repousa apenas na autoridade da lei ou na força coercitiva do Estado. Ela se fundamenta, primordialmente, na confiança pública e na reserva moral que seus membros inspiram na sociedade. Contudo, para o advogado militante e o estudioso do Direito, há um abismo evidente entre a teoria deontológica e a prática forense. A discussão sobre a ética nas cortes de vértice transcende a mera formalidade administrativa; trata-se de um debate urgente sobre a integridade institucional, a crise de enforcement das normas e a preservação do Estado Democrático de Direito.
Quando abordamos o comportamento de ministros e juízes de tribunais superiores, estamos lidando com a cúpula do sistema de justiça, cujas decisões possuem eficácia erga omnes e efeitos vinculantes. O Direito Constitucional e o Direito Administrativo convergem para estabelecer balizas que deveriam ir além da legalidade estrita, adentrando o campo da moralidade administrativa qualificada. Mas a pergunta que persiste nos corredores dos tribunais é: quem vigia os guardiões?
O Princípio da Moralidade e a Tensão com a Realidade
A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 37, caput, eleva a moralidade à categoria de princípio fundamental. Este mandamento aplica-se a todos os agentes políticos, incluindo a magistratura. A moralidade jurídica difere da comum; ela exige probidade, decoro e, acima de tudo, a aparência de imparcialidade (justice must not only be done, but must also be seen to be done).
No entanto, o cenário atual revela uma anomia seletiva. Não sofremos de ausência de normas, mas de uma aplicação inconsistente das mesmas. A independência funcional, garantia vital para a cidadania, muitas vezes é confundida com ausência de accountability (responsabilização). Para o operador do Direito, compreender essa tensão é vital: como exigir a aplicação do código de ética quando o próprio sistema parece blindado ao controle externo?
Para compreender a extensão desses deveres e como manejá-los processualmente, é essencial revisitar os fundamentos do Direito Constitucional. As prerrogativas de vitaliciedade e inamovibilidade protegem a jurisdição, não o arbítrio ou a indiscrição.
A LOMAN e o Desafio da Derrotabilidade das Normas
A Lei Orgânica da Magistratura Nacional (LOMAN – LC nº 35/1979) é um estatuto anterior à revolução digital e à atual Constituição. Embora estabeleça o dever de “conduta irrepreensível”, este é um conceito jurídico indeterminado que, na prática, sofre de uma flexibilização excessiva.
A ausência de detalhamento gera zonas cinzentas que são frequentemente exploradas. O que vemos hoje é a figura do “Juiz Influencer” ou do magistrado “popstar”, fenômenos que a LOMAN de 1979 não previu, mas que a ética clássica condena. A criação de códigos de ética específicos para tribunais superiores tenta preencher essas lacunas, mas enfrenta o desafio da efetividade. Sem sanção real, a norma corre o risco de tornar-se mero conselho.
A Interação com a Imprensa e o Dever de Self-Restraint
Um dos pontos mais críticos é a manifestação pública sobre processos em andamento. A LOMAN veda tal conduta (art. 36, III), mas a interpretação desse dispositivo tem sido relaxada, com magistrados antecipando votos em entrevistas ou comentando casos pendentes em palestras patrocinadas.
Aqui reside um desafio prático para a advocacia:
- O excesso de exposição midiática compromete a imparcialidade.
- A liberdade de expressão do juiz não é absoluta; ela sofre limitações funcionais decorrentes do cargo (dever de reserva).
- A falta de autocontenção (self-restraint) institucional gera nulidades que, pelo espírito de corpo, raramente são reconhecidas.
Os Princípios de Bangalore: Retórica ou Compliance Judicial?
Em âmbito internacional, os Princípios de Bangalore de Conduta Judicial (2002) estabelecem valores como Independência, Imparcialidade e Integridade. Eles servem de norte, mas o Brasil precisa transitar da adoção retórica para um verdadeiro Compliance Judicial.
A integridade exige que a conduta do juiz esteja acima de qualquer reprovação aos olhos de um observador razoável. Já a idoneidade (propriety) impõe evitar situações que gerem suspeitas. O advogado moderno deve utilizar esses princípios como “Soft Law” para fundamentar peças e constranger o sistema a observar standards globais, especialmente em casos que envolvem segurança jurídica e investimento estrangeiro.
O Nó Górdio: Impedimento e Suspeição
O Código de Processo Civil (CPC) estabelece causas de impedimento e suspeição, mas a prática forense impõe barreiras quase intransponíveis para sua arguição. Enquanto a ética recomenda a abstenção preventiva diante da dúvida, a jurisprudência defensiva dos tribunais exige provas diabólicas de “inimizade capital” para afastar um julgador.
O dilema do advogado: Argüir a suspeição de um ministro de corte superior é, muitas vezes, visto como um risco de “suicídio profissional”. Contudo, relações sociais estreitas com partes ou advogados, palestras remuneradas e conflitos de interesse são temas que um Código de Ética sério deve tratar objetivamente, para proteger o magistrado de acusações e o jurisdicionado de julgamentos viciados.
Para os estudiosos que desejam aprofundar-se nas nuances das normas fundamentais e sua aplicação nas cortes superiores, o domínio do Direito e Processo Constitucional é indispensável para interpretar corretamente a tensão entre os poderes e os deveres dos magistrados, saindo do senso comum.
A Colegialidade e o Controle Institucional
Nos tribunais superiores, a ética também abrange a urbanidade entre pares. Ataques públicos a votos de colegas enfraquecem a instituição. Além disso, a transparência das agendas é o antídoto contra o tráfico de influência. O princípio da publicidade exige que encontros com lobistas ou partes sejam registrados, garantindo a paridade de armas.
O Papel do CNJ e os Limites do Controle
O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) tem papel crucial, mas possui limitações constitucionais em relação ao Supremo Tribunal Federal. Isso cria uma assimetria no controle disciplinar. A existência de códigos próprios nos Tribunais Superiores é uma tentativa de autorregulação, mas para que funcione, deve haver compromisso com o accountability. A independência judicial é um direito do cidadão a um julgamento justo, não um privilégio do juiz para agir sem freios.
Conclusão: A Advocacia de Alto Nível na Era da Ética
A positivação de normas éticas é uma tendência global, mas sua aplicação no Brasil exige vigilância constante. O Direito não pode estar dissociado da Moral, e a confiança no Judiciário é um ativo volátil.
Para o profissional do Direito, não basta conhecer a lei processual; é preciso entender a Deontologia como ferramenta estratégica. Saber identificar violações éticas, fundamentar nulidades com base em princípios internacionais e navegar o ambiente político das cortes superiores são habilidades essenciais na advocacia contemporânea. O advogado, ao dominar esses temas, deixa de ser um mero espectador e passa a ser um fiscal efetivo do devido processo legal.
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Acesse a lei relacionada em Lei Complementar nº 35/1979 (LOMAN)
Este artigo teve a curadoria da equipe da Legale Educacional e foi escrito utilizando inteligência artificial a partir do seu conteúdo original disponível em https://www.conjur.com.br/2025-dez-08/celso-de-mello-apoia-criacao-de-codigo-de-conduta-para-stf-e-tribunais-superiores/.